Enfoque

BRASIL, O PAÍS DO PASSADO: PARTE 2

Em nosso artigo anterior, através de uma análise detalhada da evolução do PIB/Capita desde 1960, mostramos porque nos últimos dez anos os netos e bisnetos da geração de imigrantes do início e da metade do século XX, bem como outros brasileiros, decidiram fazer o caminho de volta ou buscar outro país. Estes brasileiros deixaram ou estão deixando o país, pois este se tornou o país da falta de oportunidades e de esperança. Como resultado, o Brasil está perdendo uma geração inteira de talentos nas mais diversas áreas.

A análise de indicadores sociais críticos reforça a forte motivação destes descendentes de imigrantes em buscarem o “caminho de volta ao percorrido pelos seus avós e bisavós”. Além disto, explica por que cerca de dois mil brasileiros considerados como possuidores de grande patrimônio (patrimônio líquido acima de um milhão de dólares americanos), bem como suas respectivas famílias, deixam o Brasil anualmente segundo dados da Global Wealth Migration Review.

Neste segundo artigo concluímos de forma analítica e factual porque o “país do futuro”, decantado na década de 70, tornou-se atualmente “o país do passado”.

As fontes dos dados das análises relativas à violência e criminalidade que se seguem são do IPEA (Atlas da Violência) e também do UNODC (Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime). As fontes dos dados das análises relativas à educação são do PISA (OECD Programme for International Student Assessment).

Da mesma forma que fizemos na análise da evolução do PIB/Capita realizada no artigo anterior, vamos analisar a evolução da taxa de homicídios no Brasil comparando com eventos políticos e também com os três países que utilizamos como “benchmarks” de sucesso – Singapura, Coréia do Sul e China -- que fizeram o caminho do terceiro para o primeiro mundo.

Nota: A UNODC só possui dados de 2006 a 2012 para estes quatro países simultaneamente.

Enquanto o Brasil crescia sua já enorme taxa de homicídios, em média mais de vinte vezes maior que os países que utilizamos como “benchmarks”, estes reduziam significativamente estas taxas!!!

País Taxa Anual de Crescimento 2006-2012 CAGR (%)
Brasil 2,77%
China -17,58%
Coréia do Sul -7,74%
Singapura -8,99%

Se analisarmos na tabela abaixo a evolução das taxas de homicídios no Brasil, verificamos que no final do período militar esta tem seu crescimento acelerado para 5,11% ao ano e, no início do período democrático, esta se acelera ainda mais para 8,18% ao ano. Quando o regime democrático se estabiliza a partir da década de 90, esta taxa, já no absurdo patamar de 15 homicídios para cada 100 mil habitantes, continua a subir atingindo inacreditáveis 30 homicídios para cada 100 mil habitantes – um dos mais altos do mundo só sendo ultrapassado por países como a Venezuela e superior à maioria dos países africanos !!!

  Evolução Política   Período Taxa de Homicídios por 100 mil Habitantes
Brasil
  Crescimento Anual – CAGR (%)
Fim do Regime Militar 1980 - 1985 11,69 – 15,00 5,11%
Início Período Democrático 1985 - 1990 15,00 – 22,22 8,18%
Período Democrático Após 1990 22,22 – 30,33 2,10%

É inegável que o Brasil é um dos países mais violentos do mundo.

Os indicadores relativos à educação no Brasil estão em linha com os indicadores relativos à violência. O PISA avalia o quanto estudantes ao final do ensino básico adquiriram conhecimentos e habilidades essenciais para efetiva participação na sociedade. Baseia-se em três pilares: leitura, matemática e ciências.

País**** 2009 2015
Pontuação Classificação* Pontuação Classificação*
Brasil 412 53 395 63
China (Shanghai)** 556 1 514 10
China (Hong Kong)** 533 4 533 2
Coréia do Sul 539 2 519 9
Singapura 526 5 552 1
Total - Países Avaliados***   65   70

Notas: * - Dentro do total de países avaliados pelo PISA - vide ***
** - A China como um todo não possui avaliação, mas as áreas metropolitanas de Shanghai e Hong Kong foram avaliadas separadamente
**** - Apesar da primeira avaliação do PISA ter sido em 2003, apenas em 2009 todos estes quatro países foram avaliados

Concluímos que enquanto os países que utilizamos como “benchmarks” se situam entre os mais bem avaliados do mundo, o Brasil está na rabeira de países avaliados!!!

Relatório da McKinsey baseado em dados de 2015 mostra no Brasil que:

  • 93% dos jovens ao final do ensino médio não tem aprendizado adequado em matemática – são, por exemplo, incapazes de resolver problemas de porcentagem ou uma equação do segundo grau!!!
  • 55% das crianças com até 8 anos são incapazes de entender o conteúdo de uma frase simples ou completar uma frase dando continuidade a uma narrativa simples!!!

Se correlacionarmos as conclusões das análises do primeiro artigo com as deste, verificamos as seguintes tendências de longo prazo:

País PIB/Capita Violência Educação
Brasil Baixo e Decrescente ou Estagnado Muito Alta e Crescente Péssima e Piorando
China Baixo, mas Crescente Acentuadamente Baixa e Decrescente Acentuadamente Muito Boa
Coréia do Sul Médio Alto e Crescente Baixa e Decrescente Muito Boa
Singapura Extremamente Alto e Crescente Muito Baixa, Decrescente e Quase Inexistente Excepcional e Melhorando

A tabela acima explica por que o Brasil se tornou o “país do passado”, que inclusive começa a ser ultrapassado por países africanos; enquanto Singapura, Coréia do Sul e China fizeram a transição entre o terceiro e o primeiro mundo.

Como já dissemos no artigo anterior agora completamos -- construiu-se aceleradamente um país da “rabeira” do mundo, sem esperanças e sem oportunidades, violento e sem educação. E este já foi chamado de “país do futuro” ... 

Será que existem perspectivas de que o país volte a encontrar algum futuro? A questão é extremamente complexa e a solução não é simples nem de curto prazo. Existem soluções, mas isto vai exigir mudanças radicais. Este é um tema relevante que irei abordar nos próximos artigos.

Nota: Este material, e outros que o antecedem ou sucedem, não tem o propósito de defender ou criticar quaisquer posições ou partidos políticos, ideologias ou governos. Tratam-se de fatos concluídos através de análises de dados de fontes confiáveis.

Domingos A. Laudisio
é Conselheiro de empresas. Foi diretor da Booz Allen & Hamilton e executivo de topo em três grandes multinacionais. Experiência internacional em seis países. Mestre em Engenharia e Administração pela Universidade de Stanford e Engenheiro pela Escola Politécnica da USP.
dalaudisio@bmcounseling.com


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