Sustentabilidade

AMAZÔNIA DO VERDE À AMAZÔNIA AZUL: BERÇO DE BIODIVERSIDADE E IMPORTÂNCIA ECONÔMICA

Há 200 milhões de anos, talvez 500, o que aconteceu? Bem, o planeta Terra se formou há 4,5 bilhões de anos e nesse período é o tempo possível em que a Pangeia, uma grande massa de terra, tenha se formado. Nela estavam contidos todos os continentes que hoje conhecemos. Posteriormente, quem sabe entre 70 e 130 milhões de anos, essa grande massa se dividiu a partir de amplos movimentos de placas no subsolo oceânico.

Bem, essa foi a Teoria concebida originalmente por alguns cientistas do século XVII, entre eles o holandês Abraham Ortelius e o filósofo inglês Francis Bacon, que perceberam que havia coincidências geológicas de formação da América do Sul, da África e América do Norte, e da Europa, em que as respectivas regiões estavam conectadas. Já no início do século XX, 1915, o meteorologista Alfred Wegener criou a Teoria da Deriva Continental, em que a Pangeia começou a se rachar “lentamente”.

A partir dessa introdução, percebemos o papel dos oceanos no desenvolvimento da estrutura da Terra e a preocupação do meteorologista Wegener. Nesta mesma época, o economista Artur Cecil Pigou já defendia a instituição do imposto às atividades que gerassem externalidades negativas, preocupado com as questões das externalidades dentro de um espectro muito mais avançado dentro do enfoque econômico, mas com uma visão muito mais limitada do ponto de vista ambiental.

Dos milhões para os milhares, entramos na visão reducionista da compreensão do significado do meio ambiente para a perenidade e equilíbrio da vida na Terra. O que fazer, se o Homo Sapiens tem menos de 100 mil anos de vida? Não resta saída a não ser imaginar (e de vez em quando acertar) sobre como a vida, em seus aspectos, evoluiu.

Os impactos durante a evolução antropológica
Considerando-se, portanto, essas dimensões temporais da evolução ecológica e a lentidão das mudanças ecológicas, o que aconteceu desde o século XVII, em termos de exploração ambiental, se não é assustador, é preocupante.

Comprovado em dados, os reflexos das emissões desde a Era Pré-Industrial se arrastam e convertem em aumento médio na temperatura global – em torno de 15°C – para um aumento de 1,1°C já registrado no último ano. O grande desafio das organizações e proposto pelo Acordo de Paris, firmado em 2015, é a limitação em até 1,5°C de aumento médio até o final do século, mas o cenário realista das emissões e projetado no último estudo da World Meteorological Organization (Organização Meteorológica Mundial) mostra que as chances de chegarmos a esta marca estão muito mais próximas.

E como fica essa conta? O resultado de tudo é o aumento na frequência dos eventos extremos, como estiagens mais prolongadas, chuvas torrenciais, perdas humanas, empobrecimento da biodiversidade. Sociedades e países em desenvolvimento são os menos preparados para tal cenário.

As preocupações trouxeram mobilização
O marco da Semana do Meio Ambiente tem como missão trazer esse alerta desde 1972, na 1ª Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo. A ONU declarou, ainda, os anos de 2021 a 2030 como a Década dos Oceanos. E neste mês, no dia 27 de junho, Portugal receberá a Conferência dos Oceanos. E é sobre os Oceanos que vamos nos aprofundar neste artigo, chamando a atenção para a importância do monitoramento dos riscos e não apenas das oportunidades de uso dos recursos marinhos. Aceleramos, um salto e tanto, de milhões para dezenas de anos.

Uma meta ambiciosa da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) planeja mapear cerca de 80% dos oceanos até 2030 – atualmente, apenas 20% das profundezas oceânicas são conhecidas.

No Brasil, temos estudado sobre as oportunidades de exploração dos oceanos. Em 1974, foi criado o Centro Integrado de Recursos do Mar – composto, na época, por representantes da Marinha, da Petrobras e da Academia. Sua composição foi bastante ampliada e, hoje, contém os Ministérios do Meio Ambiente, Minas e Energia, Ciência e Tecnologia, Relações Exteriores e outros que tiveram suas estruturas alteradas.

Um território desejado
O termo Amazônia Azul foi criado considerando, por alusão à Amazônia Verde, a rica biodiversidade da área marítima brasileira. Ela é composta pela Zona Econômica Exclusiva (ZEE) acrescida do prolongamento da plataforma continental. A ZEE é composta pela extensão territorial de 3,6 milhões de km², somados com a extensão da Plataforma Continental de 2,1 milhões de km², pelo pleito brasileiro reivindicado junto à ONU (ainda em aprovação), se aproximando a um total de 5,7 milhões de km².

No vasto território de concessão nacional, encontram-se as maiores reservas de pré-sal, de onde é extraída grande parte das atividades petrolíferas, de gás natural e quase todo o comércio exterior brasileiro. Esta é a Economia Azul do presente. Para o futuro, podemos prever a ampla utilização do mar para produção de energia. A tecnologia existe. O problema é domar a força das correntes, das marés, das ondas, além das usinas eólicas e solares offshore. Conseguiremos? Igualmente à Amazônia Verde, o potencial da pesquisa da bioeconomia marítima é enorme para fins farmacêuticos e cosméticos, sem falar na exploração de minérios, ferro, cobre, níquel, cobalto, vanádio, diamante etc.

As oportunidades estão colocadas, mas precisam ser mapeadas para compreensão pelo mercado quanto a seus riscos. Até o momento, as externalidades da exploração marítima não estão trazendo boas notícias: sobrepesca, plástico, derramamento de óleo, poluição das costas. Quanto mais perto da costa, mais férteis são os mares, porém mais sensíveis aos resíduos despejados.

Devemos ressaltar, ainda, a enorme oportunidade para investimentos de impacto na indústria da pesca, no artesanato, nas atividades agrícolas de apoio à gastronomia costeira, na gestão de resíduos e outros serviços ambientais.

Podemos pensar em Amazônia Azul 4.0?
Criada com objetivo transformador de potência ambiental e liderança em economia circular pelo pesquisador Carlos Nobre, a Terceira Via da Amazônia ou Amazônia 4.0 surgiu do pensamento de alinhar desenvolvimento econômico e conservação da floresta Amazônica. As florestas da região Amazônica possuem uma vasta biodiversidade milenar e uma riqueza de produtos naturais que vem sendo cada vem mais valorizada pela Indústria 4.0, pelo potencial de lucro e elaboração de cosméticos, alimentos, farmacêuticos, soluções energéticas, por exemplo, sem a necessidade de desmatar, poluir ou comprometer a biodiversidade. A terceira via surgiu da junção de duas vias que entraram em debate nacional há pelo menos três décadas. A primeira via consistia em manter as florestas conservadas e longe de qualquer tipo de extração de matéria, com objetivo de conservação; a segunda via apresentava um modelo de desenvolvimento sustentável, o qual incluía agricultura, pecuária e mineração.

Se, atualmente, o “mar não está para peixe” é porque não estamos respeitando a cadeia alimentar da fauna marítima; se não estamos dando importância à gestão de resíduos no mar, é porque não estamos dando a adequada importância à Gestão de Riscos ESG, à instituição de uma Governança Marítima que proteja as atividades econômicas e de preservação ambiental. Quanto aos recursos minerais, não é possível imaginar o que seja a exploração do leito oceânico, muito menos uma exploração consciente baseada em alta tecnologia e baixa degradação, como é o cenário da Amazônia 4.0, trazida por Nobre.

Uma coisa é certa: ambas as Amazônias, Azul e Verde, estão fortemente conectadas e somam uma área de quase 10 milhões de km². Combinar desmatamento com exploração oceânica sem preservação de áreas estratégicas será delicado, pois existe um estoque de carbono bastante sensível no fundo do mar.

O clima depende muito do comportamento dos oceanos, cujo aquecimento já é uma realidade. E pensar que a área de todo o Oceano Atlântico é de 106 milhões de km² reforça, nesse contexto, que a intervenção humana tem de levar em conta a imprevisibilidade do desconhecido.


Eduardo Werneck
é Senior Advisor da Resultante ESG e Presidente do Conselho Diretor da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (APIMEC Brasil).
eduardo.werneck@resultante.com.br

Daniela Freitas
é Analista ESG & Climate Change na Resultante ESG, é meteorologista graduada pela Universidade Federal de Itajubá/UNIFEI, Especialista em Data Science pela UAM e Mestranda em Energia pela UFABC.
daniela.freitas@resultante.com.br


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