Normas Contábeis

ENTREVISTA: EDISON ARISA

Presidente, FACPC - Fundação de Apoio ao Comitê de Pronunciamentos Contábeis

O CPC - Comitê de Pronunciamentos Contábeis, tem como objetivo o estudo, o preparo e a emissão de Pronunciamentos Técnicos sobre procedimentos de Contabilidade e a divulgação de informações dessa natureza, para permitir a emissão de normas pelas entidades reguladoras brasileiras, visando à centralização e uniformização do seu processo de produção, levando sempre em conta a convergência da Contabilidade Brasileira aos padrões internacionais.

A seguir, entrevistamos Edison Arisa, presidente da FACPC - Fundação de Apoio ao CPC, uma entidade criada em 2011, que tem o objetivo de assistir, promover, apoiar, incentivar e desenvolver ações científicas, tecnológicas, educacionais, culturais e sociais, que visem o desenvolvimento das ciências contábeis, por meio do apoio ao Comitê de Pronunciamentos Contábeis - CPC. Acompanhe a entrevista.

RI: Quais foram os principais desafios do CPC durante esses 10 anos de existência?

Edison Arisa: O principal desafio do CPC teve início mesmo antes de sua constituição, tivemos que ganhar credibilidade e confiança das principais partes interessadas com a matéria contábil e consolidar a ideia de que a formação de um ente que pudesse centralizar a produção de normas contábeis no Brasil traria benefício para todos, incluindo participantes do mercado de capitais, órgãos reguladores, dentre outros. Esse processo demandou anos e contou com a colaboração e engajamento de muitos. Finalmente em 2005 conseguiu-se obter os apoios necessários para a formação do CPC da forma como está hoje, com o apoio explicito dos principais órgãos reguladores que tem poder legal para regulamentar matéria contábil e entidades representativas do mercado. Outro desafio intenso se deu quando da edição da Lei 11.638/07, ao final de 2007, para ser aplicada já a partir de 01 de janeiro de 2008, na qual por meio de dispositivos específicos permitiu que o processo de convergência das normas contábeis brasileiras às normas contábeis internacionais. Considerando o cenário à época foi necessário um intenso trabalho para produzir uma grande quantidade de normativos, discutir com a sociedade e reguladores, por meio de audiências públicas. Na época foram emitidos 14 pronunciamentos contábeis para viabilizar a convergência com as normas internacionais que a nova Legislação requeria/permitia. A fase seguinte, não menos intensa (foram cerca de 30 pronunciamentos), foi a produção dos demais normativos contábeis que viessem a completar a plena convergência das normas contábeis brasílias às internacionais. E precisava ser rápido, para não perder o objetivo de se completar esse processo de convergência já nas publicações de balanços do exercício de 2010. Agrega-se a isso o fato de que alguns normativos trouxeram profundas alterações nas práticas contábeis até então utilizadas no Brasil, como por exemplo, Instrumentos Financeiros, Concessões, ativos biológicos, e outros. E os desafios continuam, dado o elevado volume de modificações que vem se processando nas normas contábeis internacionais, devido às necessidades de melhoria da qualidade das prestações de contas por meio de demonstrações contábeis e financeiras.

RI: E os principais êxitos?

Edison Arisa: Ao final de uma década de atividades o principal êxito foi constatar que o objetivo inicial que motivou a criação do CPC foi alcançado. O Brasil conta agora com um organismo único que centraliza a produção das normas contábeis brasileiras em absoluto alinhamento com as normas contábeis internacionais emitidas de IASB (*) e os órgãos reguladores brasileiros tem a possiblidade requerer das entidades reguladas a sua adoção. A CVM e o Conselho Federal de Contabilidade aprovaram todos os pronunciamentos contábeis emitidos pelo CPC. Outros reguladores também aprovaram no todo ou em parte a adoção dos pronunciamentos do CPC, como a SUSEP, BACEN, ANEEL. (*) Atualmente mais de 100 países requerem ou permitem a aplicação das normas internacionais de contabilidade emitidas pelo IASB ((International Accounting Standards Board).
 
RI: Quais são os benefícios que o país obteve ao convergir suas normas contábeis ao padrão IFRS?

Edison Arisa: Com a globalização dos mercados a adoção de práticas contábeis uniformes que possam ser reconhecidas como de elevada qualidade são extremamente relevantes para reduzir a percepção de risco nas diversas jurisdições. Apesar de as praticas contábeis adotadas no Brasil antes do processo de convergências com as normas internacionais – antes de 2010 – serem consideradas de boa qualidade, as mesmas não eram necessariamente conhecidas, na profundidade necessária, pela comunidade internacional. Assim ao avaliar um negócio no Brasil, ou mesmo conceder um crédito a uma empresa brasileira, o investidor internacional, por exemplo, poderia ter duvidas sobre qual seria a real situação patrimonial e financeira da empresa alvo. A incerteza gera riscos e os riscos são precificados no mundo dos negócios, agregando custos. Atualmente as demonstrações contábeis/financeiras de todas as companhias abertas e de praticamente todas as demais empresas brasileiras ao serem divulgadas e auditadas por auditores independentes apresentam um “selo” de que estão cumprindo as normas contábeis internacionais emitidas pelo IASB, o que dá um senso de segurança muito maior aos usuários dessas demonstrações, pois eles tem condições de saber exatamente qual é a pratica contábil que orientou a elaboração dessas demonstrações.
 
RI: O Brasil exerce influência na elaboração das normas?

Edison Arisa: Após se ter completado o processo de convergência em 2009, culminando com demonstrações contábeis/financeiras do exercício de 2010 plenamente convergentes, o CPC passou a se dedicar mais fortemente em acompanhar a produção dos novos normativos internacionais e também em influenciar na agenda futura do IASB. Isto tem sido feito com um intenso acompanhamento do que se está discutindo nos fóruns internacionais e também por meio da participação de brasileiros nos diversos Comitês e órgãos da estrutura de Governança do IASB e da Fundação IFRS. Neste momento, a Fundação IFRS conta com brasileiros no próprio IASB, no Conselho de Curadores da Fundação, no Accounting Standards Advisory Forum – ASAF, no Interpretations Committee (antigo IFRIC), no IFRS Advisory Council, no Capital Markets Advisory Committee e no Global Preparers Forum. O Brasil é membro, ainda, do Monitoring Board, órgão composto por reguladores responsável por supervisionar a IFRS Foundation, por meio do Presidente da CVM. Estas representações visam assegurar que o Brasil possa estar influenciando e colaborando de maneira legítima com a produção de normativos contábeis de alta qualidade e que estejam alinhados e sejam compatíveis com a realidade dos negócios em nossa jurisdição.

RI: De que forma IASB e CPC garantem a imparcialidade no processo de elaboração das normas?

Edison Arisa: Uma parte relevante do rito de produção de normas contábeis reside em um processo que seja transparente, participativo e garanta a sua neutralidade, ou seja que não possa favorecer um ou outro segmento ou interesse em particular, mas sim o bem coletivo. Para viabilizar isso tanto o IASB quanto o CPC tem regulamentos próprios para assegurar que nenhum novo normativo ou alteração deste deixem de passar por um rigoroso processo de elaboração, revisão e aprovação, incluindo consultas publicas e prestação de contas sobre o resultado desse processo.
 
RI: De onde vem os recursos para suportar o CPC e o IASB?

Edison Arisa: Os recursos para a manutenção das atividades do IASB, que é um Board autônomo que tem objetivos estritamente técnicos, sem finalidades de lucros, proveem da Fundação IFRS, igualmente sem finalidade lucrativa, encarregada da manutenção e da supervisão do IASB, órgão responsável pela produção e emissão das Normas Internacionais de Contabilidade (IFRS) e assim dar a segurança necessária aos reguladores e demais usuários dos normativos contábeis que a sustentabilidade a médio e longo prazo de suas atividades está assegurada garantindo a continuidade desse importante processo. No caso da Fundação IFRS os recursos provem substancialmente dos países que adotam ou estão em fase de adoção das IFRS, das grandes firmas de auditoria e de governos de algumas jurisdições. Apesar de voluntária, é esperada uma contribuição dos países que adotam as normas internacionais de contabilidade de ordem proporcional à sua relevância econômica (medida pelo PIB) no conjunto de países que utilizam as IFRS. A IFRS Foundation divulga em seus relatórios anuais as contribuições recebidas de cada país, incluindo a do Brasil. No caso do CPC o suporte as suas atividades básicas, por meio da Coordenadoria de Operações do CPC, é feito pelo Conselho Federal de Contabilidade. Não obstante, considerando a necessidade de recursos adicionais para o pleno suporte das atividades desse órgão técnico, a Fundação de Apoio ao Comitê de Pronunciamentos Contábeis – FACPC cumpre o papel de arrecadar recursos para esse suporte. A FACPC utiliza os recursos arrecadados substancialmente na tradução e revisão de materiais técnicos necessários à elaboração de documentos técnicos, na realização e participação em Fóruns Nacionais e Internacionais vinculados à área contábil e de interesse para a atuação do CPC, além das contribuições anuais para a IFRS Foundation. De fato, a contribuição, em nome do mercado de capitais brasileiro, à IFRS Foundation é, na verdade, a principal despesa incorrida pela FACPC, pois como mencionamos é esperada uma contribuição dos países que adotam as normas internacionais de contabilidade de ordem proporcional à sua relevância econômica. Em nosso entendimento, ao Brasil, representado nesse esforço pelo CPC, certamente interessa ser capaz de manter uma contribuição que corresponda à influência que deseja e merece exercer na governança e nas discussões técnicas relacionadas às normas internacionais. Os recursos ordinários da FACPC avém atualmente de contribuições voluntárias de empresas que compreendem que assegurar a sustentabilidade do processo de emissão das normas contábeis brasileiras em pleno alinhamento as normas internacionais é muito relevante para o País. Considerando a escassez de recursos a FACPC vem implementando ações para obtenção de novos contribuintes para garantir a sustentabilidade das atividades do CPC.

RI: Existe uma melhoria sensível na qualidade da informação contábil e financeira?

Edison Arisa: É notório que após a plena adoção das normas internacionais houve uma melhoria importante na qualidade das informações financeiras divulgadas. As demonstrações financeiras passaram a ter muito mais informações propiciando aos usuários um nível muito maior de compreensão, bem como propiciaram uma maior uniformidade nas divulgações permitindo um melhor nível de análise.

RI: Qual é papel dos profissionais de RI dentro desse contexto?

Edison Arisa: A melhoria na qualidade das informações contábeis e financeiras dependem em muito dos profissionais de RI, tanto dos profissionais das empresas que divulgam seus relatórios quanto os profissionais que fazem suas análises a partir dos relatórios divulgados. No CPC, que tem como uma das entidades fundadoras a APIMEC Nacional, reiteramos permanentemente a importância da contribuição dos profissionais de RI para a manutenção e melhoria das informações contábeis e financeiras.
 
RI: O que os profissionais de RI devem buscar saber sobre o CPC?

Edison Arisa: ncentivamos fortemente aos profissionais de RI que possam acompanhar de perto as atividades do CPC e possam contribuir para o aprimoramento dos novos normativos. No plano de trabalho do CPC deste ano de 2016 estão previstas as discussões sobre dois importantes normativos que terão influência relevante na apuração dos resultados das empresas em geral nos próximos anos. A norma sobre Instrumentos Financeiros e a normas que trata do Reconhecimento de Receitas. Ambas são planejadas para estar em vigência em 2018 e as análises e discussões precisam ser feitas desde agora. Dada a relevância dos temas esperamos uma ativa participação dos profissionais de RI, assim como dos demais participantes do mercado. Sugestões ou criticas construtivas são muito bem vindas.

RI: A alta gestão das companhias tem consciência da importância desse processo?

Edison Arisa: De maneira geral entendemos que a alta administração das empresas tem consciência da importância desse processo, não obstante por vezes o engajamento na análise e avaliação das mudanças, ou mesmo as sugestões de mudanças, ocorrem nos estágios finais dos processos. Entendemos que quanto mais cedo os tomadores de decisão se envolverem no processo de alterações de normas contábeis maiores são as chances de se poder influenciar no resultado da norma final.

RI: De que forma as companhias e demais agentes do mercado podem contribuir?

Edison Arisa: Do ponto de vista técnico, esperamos que as companhias, profissionais de contabilidade, finanças e RI, dentre outros, possam contribuir ativamente nas discussões sobre questões de matéria contábil, tanto na forma de apresentação dos relatórios financeiros, cada vez mais importante, quanto nos aspectos de mensuração. O CPC e a FACPC mantem um site que pode ser utilizado para acompanhar as atividades e também enviar sugestões, novas propostas, etc. Também pode ser feito acompanhamento pelo próprio site do IASB. Visite o site do CPC, www.cpc.org.br. Este ano, como vem ocorrente em anos anteriores, o CPC promoverá audiências públicas sobre os novos normativos que estão sendo considerados, os dois principais serão o de Instrumentos Financeiros e o sobre Reconhecimento de Receitas. Esperamos uma grande interação com o mercado dada a relevância dos temas. Prevemos realizar audiência públicas presenciais, além das audiências por meio eletrônico, de modo dar oportunidade de discussões mais profundas. Do ponto de vista financeiro, estamos procurando empresas e entidades que possam estar contribuindo de maneira sustentável com a FACPC para assegurar a sustentabilidade desse processo de elaboração de normas contábeis convergentes com as normas internacionais. Visite o site da FACPC: www.facpc.org.br.


Continua...