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Normas Contábeis

CONVERGÊNCIA CONTÁBIL

Recentemente, esteve de passagem por São Paulo, a delegação do IASB (International Accounting Standards Board) presidida pelo holandês, Hans Hoogervorst. Participei de um evento patrocinado pelo Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (IBRACON), quando tive oportunidade de ouvir um relato atualizado da situação do IASB e do padrão contábil que lançou o International Financial Reporting Standards (IFRS), hoje adotado por mais de 144 países.

Foi uma excelente ocasião para atualizar-me e constatar os progressos alcançados desde seu lançamento no ano 2000. Fiz parte de seu primeiro grupo de curadores (trustees) liderados pelo ex-presidente do Federal Reserve Bank, Paul Volcker. Tendo então como presidente, o escocês David Tweedie, tivemos o grande desafio de estruturar o órgão, lançando as bases de seu funcionamento e a obtenção de recursos que o viabilizasse.

Foi um dos períodos de grande complexidade, pois o mundo financeiro ainda estava sofrendo as consequências do debacle do grupo ENRON. Essa talvez tenha sido uma das razões principais que inspiram a causa do IASB, um órgão apolítico e que sem participação direta do Estado, pudesse propor um conjunto de normas contábeis de aceitação mundial.

O ideal que nos movia era o de ter uma convergência com o padrão de normas contábeis conhecidas com o USGAAP, que é adotado pelas companhias listadas na Bolsa norte-americana. As empresas teriam assim um conjunto único de padrões contábeis que, obviamente, seria muito positivo para todos os usuários de qualquer parte do mundo.

Muito embora tenham sido feito alguns progressos, ainda estamos longe de alcançar esse sistema único que todos desejavam. De qualquer forma, sensíveis progressos foram alcançados baseando-me no relatório apresentado por Hoogervorst no referido evento, que a seguir relatarei.

A importância do IASB
Padrões internacionais trazem transparência, aumentando a comparabilidade e a qualidade da informação financeira, permitindo que os investidores e outros participantes do mercado tomem decisões econômicas conscientes reforçam a prestação de contas, reduzindo o hiato da informação entre os provedores de capital e as pessoas a quem confiaram o seu dinheiro, ajudando assim a responsabilizar a administração.

Contribuem também para a eficiência econômica, colaborando para que investidores possam identificar oportunidades e riscos em todo o mundo, melhorando a alocação de capital. Para as empresas, o uso de uma linguagem de contabilidade única e confiável diminui o custo do capital, reduzindo os custos de relatórios internacionais.

Em 2005, uma primeira onda de países que adotaram o IFRS foi liderada pela Austrália, União Europeia, Hong Kong e África do Sul. Uma segunda leva de adoção começou pouco depois, liderada pelo Brasil e outros países da América do Sul, em toda a Ásia e no Oriente Médio.

Hoje, 126 jurisdições exigem o uso de Normas IFRS pela maioria das empresas nacionais listadas em Bolsa, enquanto outras 12 jurisdições permitem seu uso.

Na América do Sul, o IFRS é adotado pela maioria dos países. Os países que o adotaram continuam crescendo. Recentemente foi noticiado que 17, predominantemente países africanos francófonos, o adotarão a partir de 2019. Isso elevará o número de países que o apoiam para 144, o que equivalerá a 87% de todas as jurisdições. Assim, essas estatísticas indicam que o IFRS é um dos padrões mais completos nas finanças globais e o impulso por sua adoção continua em todo o mundo,

Melhorias na qualidade das IFRS
O IASB também continua investindo no aprimoramento dos padrões herdados fazendo correções, quando e se necessárias.

As reformas de crise financeira incluíram o IFRS 9 - um novo padrão de instrumentos financeiros que introduz uma abordagem prospectiva de perda voltada para o futuro, para provisionar o que não havia sido provisionado.

Foi introduzido um novo padrão para a contabilidade para o leasing, fornecendo aos investidores uma perspectiva mais clara das obrigações empresa nessa modalidade. Leasing é a maior fonte de recursos de financiamento fora do balanço para empresas não financeiras. Os investidores reconhecem ser um grande passo na direção certa.

Recentemente, foi realizada substancial revisão da contabilização dos contratos de seguro. O Padrão apresentará o nível de transparência ao setor de seguros que beneficiou por muitos anos outros setores.

Este período de mudanças quase contínuas pode ter causado um custo considerável para as empresas para preparar suas demonstrações financeiras. Estão agora no chamado ponto de "mudança de pico", à medida que esses padrões entrarão em vigor.

Prioridades futuras
Isso não significa que o IASB possa fazer uma parada prolongada. Ainda há muito trabalho a ser feito. Mas, ao invés de criar mais uma vez um grande conjunto de novos padrões, agora se concentram em melhorar o existente. Nos próximos cinco anos, o tema principal do programa de trabalho é dar um passo para melhorar a efetividade da comunicação das demonstrações financeiras. Chamam esse novo fluxo de trabalho "Melhor Comunicação".

Tem trabalhado muito para tornar as divulgações mais efetivas. Deixaram claro que, em seus padrões as informações imateriais não deveriam ser incluídas nas demonstrações financeiras. Recentemente, emitiram orientações sobre a tomada de julgamentos de materialidade e estão desenvolvendo princípios gerais de divulgação. Todo esse trabalho deve ajudar as empresas a aprimorar e tornar suas divulgações mais significativas.

Uma parte central do tema "Melhor Comunicação" será observar com novos olhos as Demonstrações Financeiras Primárias - o que chamamos de relatório de performance. Os investidores querem maior desagregação, itens de linha adicionais e eventuais subtotais que relatem mais sobre o desempenho de uma empresa. Teremos que fornecer uma mais e melhor estrutura para a declaração de receita e o fluxo de caixa. O resultado devem ser relatórios primários melhor formatados e que forneçam melhores resultados, sem que os investidores tenham que pesquisar em páginas intermináveis de notas explicativas.

O universo dos relatórios corporativos teve um grande avanço desde 2010. Há um interesse crescente em relatórios integrados com foco na criação de valor de longo prazo. Também é claro que existe crescente conscientização de que as restrições ambientais e sociais têm um impacto na criação de valor a longo prazo. O estabelecimento pelo Financial Stability Board do Task Force on Climate-related Financial Disclosures (Conselho de Estabilidade Financeira da Força de Trabalho sobre Divulgações Financeiras relacionadas ao Clima) é um exemplo notável dessa tendência.

Ao final, o chairman do Conselho, Hans Hoogervorst, mais uma vez defendeu que o uso do IFRS vem contribuindo para o desenvolvimento econômico e a estabilidade financeira a longo prazo, ao permitir que sejam ampliados os padrões de accountability e de eficiência dos mercados de capitais em todo mundo.

Certamente, essas melhorias nos padrões contábeis em anos recentes colaboraram para a melhoria da qualidade da informação financeira disponível. 

ROBERTO TEIXEIRA DA COSTA
economista, foi o primeiro presidente da CVM,
e um dos responsáveis pela organização e instalação
da Comissão de Valores Mobiliários no Brasil.
roberto.costa@sulamerica.com.br


Continua...