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Orquestra Societária

AS TENDÊNCIAS DA GOVERNANÇA CORPORATIVA III

O presente artigo constitui-se no fechamento da trilogia composta pelas edições 206 a 208 desta Revista RI e vai além da discussão sobre a evolução da governança corporativa e abrange a sustentabilidade no mundo e em nosso País, a ética e sua importância em relação aos dois temas citados, além de tendências para 2021, à luz da Orquestra Societária, representada na figura 1 abaixo e amplamente discutida nesta prestimosa publicação há 27 edições, incluindo esta:

A Orquestra Societária, a Governança Corporativa, a Sustentabilidade e a Ética



Note-se que a sustentabilidade foi inserida neste fechamento em função da não factibilidade em abordar o movimento pela governança corporativa sem considerar a evolução da demanda pela adoção de práticas sustentáveis pelas organizações. Adicionalmente, apresenta-se, ao final, uma breve reflexão sobre a governança mais ampla do Brasil, considerando os Poderes Constituídos, face às incertezas do ambiente político-institucional.

A figura 2 a seguir representa alguns marcos não exaustivos da governança e sustentabilidade no mundo e no Brasil:

Com respeito à figura 2, cada marco mereceria, a rigor, comentários substanciosos, mas destacamos aqui os seguintes citados:

1. No movimento pela governança corporativa:

  • Em âmbito mundial, o ativismo de investidores institucionais e de Robert Monks (EUA, a partir dos anos 80), a publicação do Relatório Cadbury (Reino Unido, 1992), a criação dos Princípios da OECD (1999), a promulgação da Lei Sarbanes-Oxley (EUA, 2002), além da criação de Códigos de Governança por diversos países e dos Relatórios de Sustentabilidade e Integrados.
  • No Brasil, a promulgação da Lei das Sociedades Anônimas no Brasil (15/12/1976), modificada pelas Leis 11.638 e 11.941, e da Lei Anti-Corrupção (1º/08/2013), a publicação do Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC (1995), atualmente na 5ª versão (2015) e a criação dos níveis diferenciados de governança corporativa da BM&FBOVESPA (Novo Mercado e Níveis 1 e 2 (2000) e demais (2004).

    2. No movimento pela sustentabilidade:

    • Em âmbito mundial, a publicação do livro precursor Silent Spring, de Rachel Carson (EUA, 1962), do Relatório do Clube de Roma (1972), o qual embasou discussões na Conferência realizada pela ONU no mesmo ano, a criação do PNUD, Programa ainda atual de sucesso da ONU (1972), a publicação do primeiro balanço social no mundo (França, 1972), do Relatório Our Common Future (1987), que introduz, em âmbito global, o conceito de desenvolvimento sustentável, a criação das certificações ISO 14000 (1996) e 14001 (2004) para meio ambiente, bem como do conceito de triple buttom line (TBL) por John Elkington (Reino Unido, 1992), a publicação da encíclica Laudato Si pelo Papa Francisco (2015), a instituição da Agenda para o Desenvolvimento Sustentável 2030 pela ONU e do Acordo de Paris sobre a emissão de gases de efeito estufa (GEE's), firmado por 197 países (2015, com ratificação em 2016), além da criação de Relatórios de Sustentabilidade e Integrados, de índices de responsabilidade social e de fundos de investimento em empresas socialmente responsáveis.

    • No Brasil, ressalta-se a realização de dois importantes eventos sobre sustentabilidade e meio ambiente, a Eco 92 (1992) e a Rio+20 (2012), ambos ocorridos na cidade do Rio de Janeiro. E destacam-se a criação carta de princípios da ADCE (1962), do primeiro balanço social por uma empresa no País (1984), da primeira proposta de padronização de balanços sociais de empresas para o País (Ibase, 1997) e do ISE pela BM&FBovespa (2005).

    Tanto o movimento pela governança corporativa quanto o movimento pela sustentabilidade se inserem na evolução do capitalismo. Eles são movimentos – duas grandes ondas - paralelas e, concomitantemente, entrelaçadas, especialmente a partir dos anos 90, por meio da criação do Relatório Brundtland e, mais especificamente, do triple buttom line (TBL), o qual procurou trazer para as empresas e demais organizações do capitalismo, as recomendações da primeira publicação citada. Assim, as dimensões econômica, social e ambiental (TBL) foram enriquecidas e culminaram na criação do chamado Relato Integrado, divulgado por diversas empresas e instrumento de aprendizado do público e dos próprios administradores.

    Em que pese o avanço tanto sob o ponto de vista da governança quanto da sustentabilidade pelo Planeta, há que considerar ao mesmo tempo as condições específicas do país, as diversas realidades estarão situadas entre duas grandes categorias ou visões limítrofes, conforme quadro 1, as quais necessariamente modificam a Orquestra Societária de cada organização:

    QUADRO 1
    Visões limítrofes da governança corporativa ao redor do mundo

     

    As duas visões representadas no Quadro 1 constituem-se em um esforço de síntese simplificadora, haja vista que a realidade prática dos países é pautada pela existência de distintas condições (a realidade dos EUA é substancialmente distinta daquela do Reino Unido e a realidade da Alemanha é, também, substancialmente distinta da do Japão!). Além disso, alguns países têm uma história corporativa mais longa e empresas com várias gerações de governo. Adicionalmente, cada organização tem seus modelos de negócios e especificidades. Ainda assim, a evolução das regras do jogo formais (leis, outros regulamentos formais e contratos) e informais (culturais) têm permitido melhorias concretas em inúmeras organizações, seja de forma coercitiva, seja por iniciativa de dirigentes.
     
    A partir das considerações até aqui apresentadas, indagamos: 1. o conceito de governança corporativa estaria em declínio? 2. o conceito de sustentabilidade estaria, também, em rota de declínio? 3. a ética nas organizações seria, afinal, mero discurso para públicos stakeholders e a sociedade?

    O quadro 2 apresenta argumentos que buscam respaldar a resposta "não" aos três questionamentos acima:

    QUADRO 2
    Governança, sustentabilidade e ética - argumentos à robustez desses conceitos

     

    Tendo em mente a Orquestra Societária representada na figura 1, como se pode vislumbrar a evolução da governança e da sustentabilidade nos próximos anos, especialmente até 2021? Como a figura 2 deste artigo será enriquecida pelo futuro? A nosso ver, nos próximos cinco anos, as melhorias nas regras do jogo formais e informais prosseguirão e as organizações familiares, estatais e demais melhorarão suas práticas, em sintonia com o histórico de evolução positivo demonstrado na figura. Há possibilidade de um choque a favor de mudanças positivas? Tudo é possível, mas com a visibilidade do momento, melhorias menos espetaculares e, ainda assim, importantes são esperadas. Quanto ao Brasil, este não está isolado do ambiente global e espera-se que siga as tendências mundiais.

    Pontuando o cenário de continuidade, sem ruptura esperada, citamos alguns conceitos que poderão evoluir muito até 2021, contextualizados durante o 17º Congresso do IBGC:

    (i) conscientização das empresas familiares, com impacto relevante na adoção de práticas de governança corporativa;

    (ii) profissionalização da gestão de várias dessas empresas, mantendo-se nas mesmas os membros familiares realmente capazes de agregar valor aos negócios, com plano adequado de sucessão;

    (iii) melhorias no governo de empresas estatais e também de organizações do terceiro setor;

    (iv) empoderamento da gestão de riscos; e

    (v) maior aderência e utilização do Relato Integrado.

    Concluímos este artigo destacando os desafios da governança maior que abrange os nossos Poderes Constituídos, utilizando o vocábulo governança com um sentido expandido. O elevado nível de abstenções na recente eleição para prefeituras não deixa dúvida quanto à insatisfação de milhões de brasileiros com o nosso sistema político. Nesse contexto, mesmo com avanços institucionais, ainda temos um longo caminho a percorrer, em prol de mudanças sistêmicas. Este é um assunto tão vasto e importante que merece um artigo específico. Agradecemos novamente as contribuições do Sócio da KPMG Sidney Ito e da Profª Drª Neusa Maria Bastos F. Santos por seu tempo e dedicação às entrevistas dos artigos anteriores e convidamos nossos leitores a contribuírem com suas preciosas opiniões e casos de sucesso nos próximos artigos relacionados ao contexto da Orquestra Societária.

     

    CIDA HESS
    é sócia diretora da KPMG, economista e contadora, especialista em finanças e estratégia e membro da Comissão de Comunicação do IBGC.
    cidahess@kpmg.com.br

    Mônica BrandÃo
    é engenheira eletricista, foi gerente de análise e acompanhamento de projetos e planejamento corporativo da Cemig e tem atuado como conselheira de organizações e professora em cursos de pós-graduação.
    mbran@terra.com.br

     

     


Continua...