Gestão

DECISÕES COLEGIADAS: CONSTRUINDO PONTES NA EVOLUÇÃO DA MATURIDADE DA TOMADA DE DECISÃO

Como os líderes podem tomar melhores decisões considerando que muitas, podem determinar sucesso ou fracasso nas organizações? Essa foi uma questão que desdobrou após a publicação do meu artigo na edição de Maio.2023 da Revista RI e a partir dela, refleti sobre outros aspectos que melhorariam e trariam mais equilíbrio ao processo decisório.

Defendo que estamos em constante evolução e a maturidade da tomada de decisão também consegue ser melhorada. O flow da evolução ocorrerá pela habilidade nos relacionamentos, pela diversidade, pela destreza em conviver com os diferentes perfis de comportamentos e mais ainda, pela oportunidade de nos permitir olhar através de diferentes prismas. No âmbito das estruturas de gestão e governança, faz-se necessário pautar a importância dos relacionamentos e das decisões colegiadas na tomada de decisão.

Um bom líder tem a mente aberta e leva em consideração outras ideias e pontos de vista”, diz Jennifer Lee Magas, vice-presidente da Magas Media Consultants.

No mundo empresarial complexo e acelerado em que vivemos, os líderes são instigados a refinarem suas práticas de tomada de decisão a fim de permanecerem no caminho certo. O relacionamento interpessoal é um dos fatores que mais interferem nos resultados e no clima organizacional das empresas sendo possível afirmar que, a cultura que reforça a importância das interações humanas certamente estará à frente na construção de ambientes mais bem equilibrados e de resultados sustentáveis. Inegavelmente, os relacionamentos são alicerce para times de alta criação de valor.

Hoje, com as indústrias 4.0 na era da inovação, da metodologia ágil e das responsabilidades ESG, os times evoluíram para times de alta criação de valor, onde cada integrante pensa em produzir resultados sustentáveis, e atuam como agentes transformadores, capazes de juntos, alavancarem valor para um maior leque de stakeholders. A cocriação dos relacionamentos hoje, precisa se embasar em ética, no estabelecimento e manutenção de acordos, de parcerias relevantes que persigam um ambiente de fato, seguro, de respeito e confiança mútuos. Resumidamente, a comunicação eficaz está sedimentada em colaboração e escuta ativa. Esse é um dos principais parâmetros que se destacam nos órgãos colegiados.

Para tomar decisões mais eficazes, desenvolva a discordância em vez do consenso.O desacordo fornece alternativas e lhe faz pensar mais profundamente sobre o assunto. Na verdade, se você não tem discordância, você não está pronto para decisão.” - Peter Drucker

Quem nunca ficou desconfortável ao perceber que uma questão difícil se resolve rapidamente, em alguns minutos, simplesmente pela concordância geral sobre uma decisão? Manter o consenso geralmente é uma má ideia. A situação parece desconfortável por entender que o conflito incomoda e por vezes, todos preferem concordar seja por fuga ou por restrições que impeçam o posicionamento aberto, contributivo e genuíno. Esse posicionamento de concordância irrestrita destrói qualquer possibilidade de uma decisão ser a melhor. Antes da decisão consensual, é preciso entender que opiniões divergentes são importantes e desde que tenham suas linhas de pensamento sustentadas com respeito, poderão iluminar aspectos ainda não observados. Nem sempre o consenso é rápido e melhor que não seja. O dissenso, se realizado de forma colaborativa, permitirá aprofundamento nos temas em debate e será capaz de melhorar a tomada de decisão. Portanto, a divergência de opiniões é benéfica para a tomada de decisão. Mesmo que a decisão final não esteja de acordo com a sua posição particular, uma vez que se chegue a um consenso decisório, o ponto de vista do órgão colegiado deverá prevalecer.

Decisão Monocrática

O termo “decisões colegiadas” é muito adotado no âmbito jurídico e segundo o TJDFT - Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, ocorre quando a decisão é proferida por pelo menos 3 magistrados, chamada de acórdão. Em regra, ocorre nos tribunais, seja em decisão de recursos ou ações originárias. Dessa forma, decisões colegiadas remetem a tomada de decisões consensuais e na ótica dos conselhos, como prática de governança corporativa.

No âmago, a governança corporativa não tem a ver com poder; trata-se de descobrir meios de assegurar a eficácia das decisões”, cita Herbert Steinberg no livro Governança Corporativa - Conselhos que perpetuam empresas.

Portanto, faz sentido que C-Level, executivos e até lideranças aprimorem seus processos decisórios evitando um viés distorcido da realidade. A mitigação do risco de uma tomada de decisão reflete um sistema de pesos e contrapesos que conduzam as decisões mais relevantes, aquelas de maior importância, para uma avaliação em colegiado independente, qualificado e diverso.

Decisões unilaterais podem trazer um risco excessivo e dessa forma, as deliberações exigidas na maioria das empresas são exercitadas em conselhos, comitês, diretorias ou até em grupos de trabalho. Essa prática traz boas referências, mas faz-se necessário considerar um grupo consistentemente diverso, capaz de elevar a maturidade das discussões de forma que saiam da superficialidade. Muitas vezes, as reflexões trabalhadas tornam-se ineficazes, improdutivas em razão da baixa qualidade das análises. Para evitar esse cenário, devemos aprimorar sempre a composição das estruturas de conselho e o funcionamento de órgãos de governança.

Considerando a composição das estruturas, é fundamental contar com a diversidade que possibilitará a abordagem de diferentes ideias e pontos de vistas diferentes capazes de proporcionar pluralidade, seja pela variedade de experiências ou formação com vivências heterogêneas. Esse cenário ilumina com mais cores e enriquece o contexto positivo para decisões coletivas. Entretanto, nem tudo são flores e cores. Hoje ainda estamos longe de ter empresas com um ambiente realmente plural e capaz de trazer essa diversidade apoiando-se em iniciativas concretas, principalmente quando falamos de posições de alta direção, CEOs, e diversidade nos conselhos.

A revista HSM Management e a Amrop Brasil mostrou a pesquisa do Perfil do CEO do Brasil em 2022 e concluiu que “há pouca diversidade no posto máximo das companhias estabelecidas no Brasil.” Dos 110 CEOs estudados, 106 são homens brancos; 4 são mulheres; 3 são orientais e nenhum negro. Esses números evidenciam que, no caminho para o topo, existe um gargalo. Alguns afirmam que há pipeline insuficiente. Entretanto, Tatiana Iwai, professora de Liderança do Insper, garante: “Por uma pesquisa recente que fizemos, as mulheres não têm mais dúvidas quanto à sua competência, não são menos comprometidas com o trabalho que os homens, nem menos dispostas a investir na carreira.”

De toda forma, a questão continua ativa na mente como naqueles holofotes que piscam sem cessar. Por que então é desejável maior diversidade? Para que a empresa possua um repertório plural que a prepara para responder melhor as questões complexas e somente sabemos tratar questões realmente complexas, se soubermos abraçar e dormir com os desafios. Quando a carreira está ligada ao risco do negócio , é essencial que a atuação esteja direcionada à diplomacia, a busca de consenso, alinhamento de interesses tantas vezes opostos. Por isso, surge a necessidade de gerenciar conflitos e buscar as alianças, construindo pontes ao invés de muros.

Ao final, melhor pensar que a tomada de decisão é uma forma de arte e não um processo. Ou seja, a melhor decisão a ser tomada envolve saber usar na medida certa, cada ingrediente chave, mas não existe uma receita. Os líderes precisam desenvolver insights para guiar as suas melhores decisões que envolvem uma mistura de conhecimento, dados, decisões colegiadas, e uma pitada de intuição além da vontade de correr certo risco.

Alguns desses ingredientes precisam ser desenvolvidos ao longo do tempo e evoluem a maturidade através da experiência.


Luciana Tannure 
é engenheira formada pela PUC-RJ com MBA em Gestão Empresarial pela FGV e pós-graduação em Finanças Corporativas e Projetos e Gerência de Sistemas. Conselheira Consultiva certificada pela Board Academy BR, é advisor em startup. Executiva de Projetos Estratégicos na Vivo.
luciana.tannure@gmail.com


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