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Bolsa de Valores

BOVESPA MAIS: O QUE FALTA PARA DESLANCHAR?

O Bovespa Mais, idealizado para pequenas e médias empresas que desejam acessar o mercado de forma gradual, foi criado em 2005 e até agora apenas oito companhias fazem parte do segmento.

De acordo com Rodolfo Zabisky, CEO do Grupo Attitude e idealizador do programa PAC-PME, trata-se de um desempenho extremamente acanhado, principalmente se observarmos que apenas duas empresas realizaram IPOs nesse segmento (Nutriplant e Senior Solution), enquanto as demais apenas listaram suas ações sem a realização de oferta. “O Brasil é o terceiro no ranking de empreendedorismo (atrás apenas de EUA e China), entretanto, as pequenas e médias empresas brasileiras não têm a oferta de ações como uma estratégia de acesso a capital de crescimento e perpetuidade dos negócios”, avalia.

Fernando Spadari, sócio-diretor da Guapo Capital Group, acredita que por ser um processo novo, ainda precisa de tempo de maturação. “Se avaliarmos o Novo Mercado, já maduro em termos de tempo e confiança do investidor/empresário, ainda assim temos um volume de empresas muito aquém do nosso potencial”, destaca. Spadari salienta que é preciso olhar o Brasil, em todos os âmbitos, no longo prazo. “Nosso planejamento como país, como política econômica e das empresas e pessoas como investimento, deverá sair do curto para o longo prazo. Quando atingirmos essa maturidade, não resta dúvida de que teremos um mercado de capitais tão dinâmico quanto o dos países desenvolvidos. É preciso apostar em educação financeira e planejamento de longo prazo, em todas as esferas”, diz.

Apesar do desempenho tímido, o segmento de acesso à Bolsa pode ganhar novo fôlego com as medidas de incentivo à entrada de pequenas e médias empresas no mercado de capitais brasileiro anunciadas no fim do ano passado. Ainda que a meta da BM&FBovespa de trazer mais de 80 empresas para o mercado de acesso possa parecer bastante ambiciosa, na opinião de especialistas, a expectativa é que as novas iniciativas elevem o interesse de companhias pelo financiamento via mercado de capitais.

O BNDESPar, braço de participações de empresas do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), prevê realizar ao menos a listagem de uma companhia de seu portfólio no Bovespa Mais este ano. Segundo Márcio Spata, chefe do departamento de gestão de participações da área de capital empreendedor do banco, todas as iniciativas já realizadas pelo governo e pela BM&FBovespa para o crescimento do mercado de acesso, com redução de custos, são de grande importância, mas “é necessário ter em mente que o seu ritmo estará fortemente atrelado à conjuntura macroeconômica nacional e ao próprio desempenho do Novo Mercado, principal segmento da Bovespa", afirma. Com cerca de 35 empresas de médio porte em sua carteira, o BNDESPar tem participação em seis das oito companhias listadas hoje no Bovespa Mais: Altus, BIOMM, CAB Ambiental, Nortec Química, Quality Software e Senior Solution.

Medidas de incentivo

A Medida Provisória (MP) 651, publicada em 10 de julho de 2014, entre outras coisas, isentou a pessoa física de pagar imposto de renda sobre o ganho de capital obtido com ações de PMEs. Para entrar na mira do incentivo, a companhia deve ter faturamento de até R$ 500 milhões e valor de mercado máximo de R$ 700 milhões. Além disso, precisa estar no Novo Mercado ou no Bovespa Mais e realizar uma oferta inicial com pelo menos 67% de distribuição primária. O sentido da MP 651 reside, principalmente, na sua combinação com a Instrução 549 da CVM, que, no fim de junho, criou um novo tipo de fundo de investimento: o fundo de ações - mercado de acesso (FMA). Para ser enquadrado como FMA, o fundo precisa ter dois terços de seu patrimônio investido em papéis de companhias listadas em segmento do mercado de acesso com padrões elevados de governança corporativa. Segundo a MP, pessoas físicas que investirem nesse produto poderão usufruir a isenção fiscal.

Para o CEO do Grupo Atittude, apesar de bons avanços na questão regulatória de ofertas menores (simplificação) e de permissão quanto à emissão de ações preferenciais no Bovespa Mais, o destravamento do segmento ficou extremamente tímido e limitado com apenas pessoas físicas sendo isentadas de imposto de renda sobre ganhos de capital. “Ou seja, as medidas são positivas, mas claramente insuficientes para fazer deslanchar o Bovespa Mais”, resume.

Além das medidas já anunciadas, Zabisky acredita que outras duas estratégias são fundamentais para se destravar o mercado de acesso no Brasil: isentar todos os investidores de imposto de renda sobre ganhos de capital de empresas listadas no Bovespa Mais; e permitir um crédito tributário no valor de 33% das despesas realmente incorridas no processo de IPO, na forma de desconto de imposto de renda a pagar pela empresa que captar recursos para crescimento.

Dessa forma, a expectativa é que os incentivos façam com que o segmento de acesso da Bolsa saia na monotonia e comece a trilhar o mesmo caminho de outras experiências internacionais que lhe serviram de inspiração, como a Alternative Investment Market (AIM), da Inglaterra. Criada em 1995, a AIM já serviu como ponte para mais de três mil companhias se financiarem no mercado de capitais.

Álvaro Gonçalves, sócio da Stratus Investimentos, lembra que tanto a AIM, na Inglaterra, quando a NASDAQ, nos EUA, não decolaram imediatamente quando lançados, e aposta que o Bovespa Mais é uma realidade para o longo prazo da economia e para o mercado de capitais. “O empresário brasileiro logo perceberá que existe ali uma fonte de recursos e de apoio ao desenvolvimento empresarial com condições muito positivas, como opção real aos altos custos do financiamento por crédito no nosso país, e que vale a pena ter essa alternativa no radar, preparar e construir desde o início na empresa uma estrutura de processos compatíveis com o estádio de capital aberto mais adiante”, afirma.

Para Thiago Rocha, diretor de Relações com Investidores da Senior Solution, – que teve sua estreia no Bovespa Mais em maio de 2012 – as medidas foram positivas porque a isenção de imposto de renda para pessoas físicas nas empresas de pequeno porte ampliará o interesse de investidores, fomentando a liquidez, e a simplificação na mecânica de publicações legais reduzirá o custo de manutenção do registro de companhia aberta. Com relação à isenção do imposto de renda, desde que à medida foi anunciada a companhia observou um crescimento substancial na base de acionistas pessoas físicas. Em junho de 2014, mês anterior à publicação da MP651, eram 489 pessoas físicas na base acionária. Já em fevereiro de 2015, esse número saltou para 1.595, um aumento de 226% em menos de um ano. “O avanço foi possível graças aos bons resultados divulgados pela empresa e à ampliação da cobertura das ações, mas certamente foi facilitado pelas medidas de incentivo”, destaca Rocha.

Momento econômico não favorece novas listagens

Segundo os especialistas, marcado por dificuldades políticas e econômicas, o atual momento não é indicado para a abertura ao mercado de ações. No entanto, é adequado para que as empresas iniciem a preparação, que requer tempo e cumprimento de exigências legais, como ter três balanços anuais auditados.

"As empresas precisam estar prontas para aproveitar as janelas, que abrem e fecham muito rapidamente. Neste momento, nosso trabalho é de sensibilização das empresas para que se preparem. Mas como isto ocorrerá depende de cada organização”, afirma Edna Sousa de Holanda, gerente de Prospecção de Empresas da BM&FBovespa.

Para Edna, as empresas devem se mostrar ao mercado por meio da Bolsa de Valores. Inclusive, a estratégia é válida para pequenas e médias empresas. "Elas cumprem as exigências legais e depois decidem pela captação. Temos grande interesse neste trabalho porque a abertura de capital de grandes empresas será rara no futuro”, diz.

O caminho da Bolsa

Em 2007 e 2010, a empresa do setor de softwares Senior Solution iniciou duas vezes o projeto de realizar um IPO. Com as crises nos EUA e Europa, respectivamente, percebeu que as janelas de mercado passaram a ser cada vez mais curtas e que seria preciso encontrar uma forma de tornar o processo de oferta de ações mais rápido. A solução foi realizar, no primeiro momento, a abertura de capital e a listagem no Bovespa Mais, aguardar condições favoráveis e, no segundo momento, realizar apenas a oferta de ações. “A experiência foi bem sucedida e mostrou que a separação do projeto em duas etapas é um modelo vencedor”, afirma Thiago Rocha, diretor de Relações com Investidores. Contudo, não existem assessores especializados neste tipo de projeto: quando as duas etapas coincidem, o banco de investimentos realiza boa parte do papel. Porém, quando elas são separadas, há uma lacuna no mercado. Com isso, a companhia, que já tinha um braço de consultoria – a Controlbanc – focada em gestão de negócios, principalmente para instituições financeiras – aproveitou o interesse das empresas e desenvolveu uma nova área de consultoria para listagem que já apoiou 3 das 8 empresas listadas no Bovespa Mais.

Rocha conta que atualmente a demanda por esse serviço está morna, mas com sinais de reaquecimento. Por um lado, as condições de mercado criam um desafio para as empresas que desejam realizar um IPO no curto prazo. Por outro, os empresários atualmente perceberam o valor da preparação prévia, da exposição ao mercado antes da oferta e de otimizar o projeto que envolve uma oferta de ações. “Por isso, observamos a demanda por empresas que realmente têm um objetivo claro de acessar o Bovespa Mais futuramente, e serão pacientes em aguardar o melhor momento”, ressalta. Os projetos conduzidos pela Controlbanc na linha Bovespa Mais representaram aproximadamente 11% da receita da consultoria em 2013. “Nosso interesse vai além de uma simples questão comercial: queremos ter novos colegas no Bovespa Mais e fomentar o desenvolvimento desse mercado, o que beneficiará a Senior Solution indiretamente”, explica.

O que falta para termos um mercado de acesso pujante?

Um diagnóstico realizado pelo Brasil+Competitivo, que foi instituído pelo projeto de lei 6558/2013, de autoria do Deputado Otavio Leite, indicou as principais cinco travas que impactam negativamente o mercado de acesso no Brasil:

1. Cultura de renda fixa (elevada taxa juros) e percepção de complexidade da Bolsa.
2. Exigências regulatórias excessivas para mercado de acesso (CVM e Bolsa).
3. Fundos / Investidores Qualificados não interessados em investir em empresas de menor liquidez.
4. Informalidade, sonegação, desinformação, cultura e custos elevados pré e pós IPO.
5. Intermediários de relevância desinteressados em IPOs inferiores a R$400 milhões.


Continua...