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Espaço Apimec

A PRÁTICA DA SUSTENTABILIDADE

Evolução das questões ESG no debate de empresas e setor financeiro
As questões ambientais, sociais e de governança corporativa, também conhecidas pela sigla em inglês ESG, estão presentes na pauta corporativa há alguns anos, até décadas. O tema, no entanto, vem ganhando relevância em função da aparição crescente na agenda de eventos, discursos, debates entre chefes de estado e lideranças, com temas relacionados aos grandes riscos globais - como se apresentam no relatório de riscos globais do World Economic Forum - e a necessidade de acordos internacionais e compromissos, como os ratificados no Acordo de Paris.

A atuação de associações setoriais, reguladores, formuladores de políticas públicas, além da forte presença da sociedade civil organizada, alçou a sustentabilidade ao topo das preocupações de dirigentes e Conselheiros das corporações. Mais que “fazer o certo” e deixar um legado para as futuras gerações, hoje as conversas abordam especialmente o impacto que essas questões podem ter sobre a inovação nos modelos de negócio e a própria perenidade das companhias.

Com o envolvimento de lideranças do setor público e privado, a sustentabilidade ganhou espaço nas preocupações de executivos e Conselheiros de empresas. A agenda se move de um discurso institucional e vai além de um posicionamento moral em prol das futuras gerações, introduzindo ações e métricas que abordam o impacto que temas ESG podem ter sobre a capacidade de inovação, a efetividade de estratégias, modelos de negócio e da própria perenidade das companhias. Cada vez mais, o tema é percebido como um diferencial competitivo, com potencial de mitigar riscos, reter talentos, gerar inovação e oportunidades de negócio, além de preparar e adaptar as organizações para regulações e leis que se aplicam tanto às empresas como a seus stakeholders. Em todos os casos, o que se percebe é que o potencial impacto dessas questões sobre o resultado econômico-financeiro das empresas traz à mesa de discussão de executivos de empresas e do setor financeiro.

Entre financiadores e investidores, os riscos e oportunidades das empresas se traduzem diretamente no aumento ou redução de riscos de suas carteiras. Bancos, fundos de pensão, seguradoras e demais investidores institucionais vêm aumentando o uso de critérios ESG na análise, precificação de produtos e tomada de decisão financeira. Adicionalmente, à medida que o setor financeiro inclui critérios ESG na análise e tomada de decisão financeira, ele atua como um driver para a adoção de boas práticas pelas empresas. Os impactos sobre a redução do custo de captação e na decisão de investimentos tem sido debatida por diferentes atores deste setor em âmbito global. Os aspectos ESG passam a ser considerados uma proxy de gestão e integrar esses aspectos as análises tradicionais, mandatos e outras estratégias de investimentos responsáveis destinam recursos reservados para ativos verdes.

No mercado de capitais, os índices de sustentabilidade se tornaram uma referência importante, por destacarem as empresas com boas práticas ambientais, sociais e de governança corporativa. No Brasil, o Índice de Sustentabilidade Empresarial da B3, ISE, é a principal referência em índices desta categoria. Outros índices da bolsa brasileira são o ICO2, que tem um olhar sobre as emissões de gases de efeito estufa das empresas, e os índices da família de governança corporativa, como o IGC e o ITAG. Para as empresas brasileiras listadas nos EUA, o Dow Jones Sustainability Index World é um indicador global de performance financeira, intrinsecamente associado ao cumprimento de requisitos de sustentabilidade. Provedores de informações, como agências de rating são cada vez mais demandadas sobre essas questões. Com isso, a competitividade aumenta e o nível das análises evolui.

Para as empresas, cresce a demanda por informações de qualidade e a capacidade de serem transparentes. Analistas de crédito e investimentos muitas vezes vão além do cumprimento legal, e buscam um entendimento aprofundado do comprometimento das lideranças e da capacidade da empresa de antecipar tendências, mitigar riscos e promover a inovação com base em temas ESG relevantes para o seu setor e mercado de atuação, bem como tendências regulatórias. As informações podem, mas não precisam, estar disponíveis em um relatório anual e/ou de sustentabilidade. Outras ferramentas como o site de RI, o Formulário de Referência, apresentações corporativas e as próprias notas explicativas das demonstrações financeiras são pesquisadas por especialistas na avaliação ESG das empresas.

Na agenda internacional, a questão climática é que ganha maior peso para governos, empresas e o setor financeiro. Especificamente sobre os riscos climáticos, o Financial Stability Board (FSB), lançou em 2016 uma força-tarefa para aumentar a divulgação de informações pelas empresas e sua consideração pelo credores, investidores e seguradoras. Em inglês, a Task Force for Climate-related Financial Disclosure(TCFD) aborda os potenciais impactos climáticos não somente sob o aspecto físico, mas também considerando suas interações com o risco de mercado – a partir de mudanças nas tendências de consumo, tecnologia, política e reputação. Há recomendações gerais e para alguns setores específicos, como energia, transportes, agronegócio, entre outros. O objetivo da iniciativa é mapear os impactos das mudanças climáticas sobre o Balanço Patrimonial e a Demonstração de Resultado das companhias. Estudos recentes apontam a TCFD como uma das diretrizes para regulações relacionadas a mudanças climáticas.

Com base em dados analisados pela RESULTANTE, identificamos que 60% das 130 empresas listadas analisadas já tiveram o tema mudanças climáticas em pautas de reunião de Conselho de Administração e 25% conhecem em algum nível sua exposição a riscos e oportunidades ligadas a essas questões.

Quando analisamos práticas de gestão e a integração do tema na decisão de investimentos das empresas, entretanto, apenas 10% realizaram estudos sobre impactos de potencial precificação de carbono. Precificar o carbono significa atribuir um custo aos impactos socioambientais adversos causados pelas emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE) na atmosfera, como a mudança nos padrões das chuvas, o agravamento das secas e o aumento no nível do mar. A precificação internaliza nas companhias o chamado custo social do carbono, uma externalidade negativa. Nos Estados Unidos, por exemplo, um Interagency Working Group (IWG), criado em 2009 pelo ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama, estimou o custo social do carbono em US$ 41 a tonelada em 2016 e US$ 50 em 2050. Trabalhos acadêmicos já simulam o impacto no EBITDA das companhias.

Sistemas compulsórios de precificação do carbono têm sido adotados por países e governos subnacionais como instrumentos valiosos para o cumprimento de suas metas de redução de GEE. Os instrumentos de precificação do carbono mais utilizados são a tributação das emissões, sistemas de comércio de emissões e modelos híbridos, que combinam os dois anteriores. Em abril de 2018, havia 45 países e 25 governos subnacionais com sistemas de comércio de emissões e/ou tributação de carbono estabelecidos, de acordo com a publicação Diálogos de Financiamento Climático do Pacto Global da ONU. No Brasil, estudos sobre a viabilidade de implementar esses instrumentos como estratégia para alcançar os compromissos de redução das emissões assumidos no Acordo de Paris estão sendo conduzidos pelos Ministérios da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e da Economia (ME). É levado em consideração o papel que cada setor econômico pode desempenhar na estratégia nacional de redução nas emissões, segundo uma ótica de custo-benefício, e o impacto dessas medidas no comportamento de indicadores como Produto Interno Bruto (PIB) e geração de emprego e renda.

Como antecipação a regulações futuras, vem crescendo o número de empresas que estabelecem o chamado preço interno de carbono, em que se pode utilizar diferentes metodologias para atingir objetivos distintos, inclusive mensurar os impactos de uma futura precificação mandatória em suas operações. Segundo relatório publicado em 2017 pelo CDP, ONG internacional que levanta e reporta dados ambientais de empresas, 1.389 companhias haviam introduzido ou planejavam adotar a precificação interna do carbono até 2019 em todo o mundo, sendo 43 delas no Brasil. É um indicador que passa a orientar decisões de investimento, como novos empreendimentos e negócios em geral, fusão e aquisição de empresas. Assim, entra na análise de viabilidade técnico- -econômica do investimento, facilitando a busca pela melhor resposta tecnológica para cortar emissões de GEE ao menor custo. É dessa maneira que os agentes econômicos estão cada vez mais atentos a instrumentos que facilitem, barateiem e expandam o financiamento de ações de mitigação dos GEE e adaptação às mudanças climáticas.

As empresas incluem os temas ESG na agenda, porém com incertezas e desafios para implementá-los e comunicá-los na estrutura já existente de comunicação com o mercado. Conscientização e engajamento de lideranças, encorajar soluções coletivas no setor privado para apoiar a regulamentação, a capacitação de profissionais de áreas de negócio e serviços especializados de consultoria para diagnóstico, são possíveis caminhos a serem seguidos nessa corrida.

Bruno Youssif
é sócio da Resultante Consultoria ESG.
bruno.youssif@resultante.com.br


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