Relações com Investidores

QUANDO TEREMOS UMA NETFLIX BRASILEIRA EM TERMOS DE RI?  

Se você é um investidor, você tem várias exigências a fazer para as suas investidas. Você espera, acima de tudo, a maior quantidade de informações possível, de maneira oportuna e transparente, além de acesso à gestão. Apesar de parecer óbvio, não são todas as empresas de capital aberto que prezam pela qualidade e inovação quando o quesito é a comunicação. Mas há, no mercado americano, uma rara exceção: a Netflix (NFLX). 

Vamos fazer uma análise de como a Netflix divulgou seus resultados do primeiro trimestre de 2015 no último dia 15 de abril, nos Estados Unidos. A companhia é uma das primeiras empresas a divulgar seus resultados trimestrais a cada temporada. E isso não passa despercebido entre os investidores interessados, que reconhecem esse diferencial publicamente. Bill Gurley, investidor de Venture Capital e membro de conselhos de administração de mais de uma dezena de empresas de tecnologia, entre elas Open Table, Zillow e Uber, postou em sua conta no Twitter: "Parabéns à @netflix pelo excelente trimestre, mas também por divulgar os resultados 15 dias após encerramento do tri. Sinaliza controle efetivo da operação financeira. $NFLX". Vale destacar que Bill tem 317 mil seguidores no Twitter. É um formador de opinião relevante, sem sombra de dúvida.

Investidores querem informação, e querem rápido. E a Netflix oferece. Como pode ser verificado a partir de datas anteriores de divulgação de resultados disponíveis no site de RI da companhia, eles vêm divulgando cada vez mais cedo, trimestre após trimestre.

Este é um feito notável, e os investidores têm recompensado a companhia por esse seu desempenho. A ação já subiu mais de 60% só em 2015. Pois, além da tempestividade, a empresa entrega também o acesso, a transparência, e as informações confiáveis e de qualidade.

Antes da divulgação de resultados, por meio de um comunicado, a Netflix solicita a analistas e investidores que enviem suas perguntas por e-mail, para serem consideradas no Q&A.

Ao contrário de outras empresas públicas, como o Yahoo!, a administração da Netflix oferece um maior acesso a seus investidores ao discutir os resultados por meio de uma videoconferência, que pode ser acessada aqui: www.youtube.com/user/NetflixIR). Nessa videoconferência, a companhia evita comentários pré-preparados, linguagem de divulgação e disclaimers (economizando o tempo dos investidores). Em vez disso, eles vão direto para a sessão de perguntas. Isso é o sonho de dez entre dez analistas e investidores do mercado de capitais.

E mais: eles trazem mediadores para o evento. As questões são colocadas por dois analistas sell-side. Raramente há perguntas básicas ou plantadas. Perguntas como essa são feitas ao CEO da Netflix, Reed Hastings: “Reed, ao longo dos últimos 10 anos, você soube articular perfeitamente a evolução da venda de DVDs para streaming, para produção de conteúdo próprio e para expansão no exterior. Então eu pergunto: quando você olha para o seu plano de negócios, o que te preocupa? Quando você olha para os seus desafios pela frente, o que mais te preocupa?”

Além disso, quando o CEO quer que seus executivos forneçam mais informações, ele tem uma tendência a atropelar e assumir o Q&A. Neste trimestre, não foi diferente, você pode ver a transcrição aqui: http://s.t.st/media/xtranscript/2015/Q2/13114553.pdf.

Tudo isso atrai sólida audiência. Haviam 1.138 pessoas assistindo à transmissão ao vivo - veja aqui: https://twitter.com/pkafka/status/588468712862314497. E o link, postado no YouTube e acessado pelo site de RI da Companhia, já teve mais de 4.300 visualizações em uma semana até a data de elaboração deste artigo.

 A Netflix toma ainda outras medidas para aprimorar a experiência do investidor na sua divulgação de resultados. Eles publicam uma Mensagem aos Acionistas antes da videoconferência, que traz informações abrangentes sobre o trimestre e previsões para o trimestre seguinte. Eles chegam a falar abertamente sobre a concorrência. Uma boa parte das perguntas dos analistas são derivadas diretamente de comentários feitos nessa Mensagem. Isso permite uma discussão mais sólida durante a sessão de perguntas e respostas.

E logo em seguida à conclusão da videoconferência, a companhia publica a transcrição. Embora existam muitas transcrições disponíveis online, os investidores sabem que a mais confiável sempre virá da própria empresa.

No site de RI da Netflix ainda é possível encontrar uma quantidade substancial de conteúdo interativo, com destaque para:

1) Principais Dúvidas dos Investidores: (http://ir.netflix.com/faq.cfm)

2) Visão de Longo Prazo: (http://ir.netflix.com/long-term-view.cfm)

Por último, mas não menos importante, a Netflix tem uma presença significativa nas mídias sociais:

Estes canais são exatamente onde os investidores americanos passam seu tempo pesquisando sobre ações. Sem dúvida, a administração da Netflix está mais do que ciente disso. Eles também reconhecem a possibilidade de que podem divulgar informação relevante usando esses canais.

CONCLUSÃO
Resumindo, a Netflix vai muito além de atender às necessidades dos investidores. E foi reconhecida e recompensada ​​por essa atitude.

Seria de se esperar que outras empresas de capital aberto se inspirassem no modelo Netflix, já que grande parte da inovação que a companhia implementou para as divulgações de resultado traz pouco ou praticamente nenhum custo adicional.

Infelizmente para os investidores isso ainda não acontece. Nem nos Estados Unidos. Que dirá no Brasil. Ou será que acontece?

Guardadas as devidas proporções, já temos no Brasil uma comunidade interessante de investidores conectados por mídias sociais, e que discutem diariamente, por todos os canais disponíveis, o que acontece no mercado brasileiro. Mas ainda são muito poucas as empresas que efetivamente inovam sob o aspecto de comunicação com investidores.

Podemos afirmar que as empresas investem valores substanciais em eventos presenciais, como Investor Days, que são extremamente relevantes, mas custosos. São poucos os RIs que têm presença efetiva nas mídias sociais e que participam das discussões de alta qualidade sobre o mercado de capitais em canais como o Twitter, por exemplo. Com um pouco de planejamento e colaboração, dá para inovar, e muito em RI. Os investidores, com certeza, vão reconhecer.

Nota: Esse artigo foi adaptado do artigo original de Ezra Marbach, do blog Finance 2.0, “Is There a Better Investor Relations Model in the Age of Social Media?”. Ezra gentilmente autorizou a tradução e adaptação do conteúdo.


Fabiane Goldstein
é sócia da MBS Value Partners Brasil e Conselheira da Eleven Financial Research.
fabiane.gold@mbsvalue.com


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