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Em Pauta

RI EM TEMPOS DE CRISE

Dar informações precisas e tempestivas é fundamental para que as empresas se diferenciem na bolsa nesse momento de incerteza da economia. Em tempos de crise, investidores tornam­-se mais seletivos em seus investimentos, demandando informações não apenas sobre os rumos da companhia, mas também sobre como esta pretende atravessar a tempestade. Diante desse cenário, como deve agir o profissional de Relações com Investidores?

De acordo com Doris Pompeu, sócia da consultoria Global RI, em períodos de maior instabilidade econômica, quando os investidores estão mais cautelosos, a atividade de RI se torna ainda mais importante. “Quando as empresas enfrentam uma conjuntura econômica adversa que tende a prejudicar o desempenho da maior parte delas, o profissional de RI deve ser ainda mais proativo, evitando a tentação de se retrair dentro “dos muros” de sua empresa e se proteger apresentando ao mercado apenas o mínimo necessário”, alerta.

A postura que a especialista recomenda nesses momentos é a de procurar estar municiado das melhores informações sobre o comportamento dos investidores, seus temores e suas dúvidas. “Mais do que nunca, é essencial que o RI ofereça aos profissionais de mercado as informações que eles precisam para perceberem o quanto a companhia está preparada para enfrentar essa fase”. Para isso, cabe ao RI reforçar os diferenciais da sua companhia, dar ênfase à estratégia, ao plano de negócios, às ações que estão sendo feitas para enfrentar esse período de maior adversidade, à capacidade da companhia para enfrentar diferentes cenários.

Mercado de trabalho
Nos últimos anos, as movimentações na área de relações com investidores foram consequência do grande número de empresas que realizaram suas ofertas públicas de ações. Já agora, a maior parte está ligada a trocas de profissionais. Recentemente, Natura, Bradesco, BM&FBovespa e Ser Educacional anunciaram novos executivos para o cargo de RI.

O perfil de profissional procurado pelo mercado é de executivos extremamente bem preparados e seguros. “Além da parte técnica, as empresas estão prezando por pessoas com grande capacidade de entrega de resultados e com grade tolerância à pressão interna e externa”, diz Rudney Junior, sócio da empresa de recrutamento e seleção BR Talent.

Segundo Tais Cundari, vice- presidente da Fesa, consultoria de recrutamento e seleção de executivos, no início de 2015 houve um crescimento mais latente na demanda por profissionais de RI, seja para empresas que estavam se preparando para abrir capital, seja para empresas com o capital aberto há algum tempo, mas que pretendiam reestruturar seu quadro de funcionários em função da oscilação no valor das ações e/ou dos resultados aquém do esperado. Esse movimento, no entanto, não está tão intenso nesse momento. “Na realidade, estamos conduzindo poucas buscas por profissionais de RI. Imagino que por conta da situação político-econômica do país, as empresas estejam aguardando o momento mais adequado para este investimento”, conclui.

No caso de empresas que ainda não possuem capital aberto na Bolsa, a decisão de buscar um executivo no mercado responsável por conduzir o processo de abertura de capital se justifica pela necessidade de viabilizar um crescimento orgânico ou através de aquisição com o capital recebido. Porém, esta decisão implica necessariamente em uma adaptação da empresa com as leis, processos e políticas que regulamentam as instituições de capital aberto, uma vez que as informações que serão repassadas ao Banco Central e à CVM exigem total transparência de números e resultados.

Em outros casos, a troca de cadeiras se faz necessária em razão da oscilação das ações das companhias abertas. “Embora a oscilação usualmente ocorra por fatores externos e não pela postura e pelo conhecimento do executivo responsável pelo RI, a área acaba sendo penalizada ou responsabilizada pelo resultado ruim das ações”, afirma Tais.

Demanda por empresas fechadas
Segundo o sócio da BR Talent, Rudney Junior, a demanda de RIs por empresas fechadas aumentou, mas ainda é pequena diante do grande potencial. “As empresas começaram a estar mais preocupadas com RI na medida em que passaram a entender que uma empresa bem gerida e com informações bem trabalhadas passa a ser uma vitrine para investidores”, ressalta.

Embora o momento atual não seja propício para conduzir um processo de IPO (oferta pública inicial de ações), Tais Cundari, da Fesa, também confirma que muitas empresas nacionais em processo de profissionalização já se preparam internamente para que isso ocorra no momento adequado. “Com a redução de recursos financeiros oriundos do BNDES, provavelmente um maior número de empresas poderá viabilizar seus investimentos através desses processos, semeando uma boa perspectiva futura para profissionais da área”, afirma.

Essa estruturação pode se reverter em vantagens competitivas, uma vez que permitirá às empresas de qualquer porte – e mesmo que não tenham interesse imediato em abrir o capital – mais oportunidades de captar recursos para financiar seu crescimento, na forma de emissão de títulos de dívida, como debêntures, ou injeção por meio de fundos de venture capital private equity.

Para Doris Pompeu, da Global RI, embora existam casos nos quais a contratação do RI é feita (ou lembrada) às vésperas da abertura de capital ou mesmo a posteriori, há, hoje, melhor entendimento sobre a atividade nas companhias abertas ou com planos/em processo de abrir o capital, e mesmo entre algumas empresas de capital fechado, ainda que mais raramente.

Segundo a especialista, as atividades exercidas pela área de RI podem ser de grande valor para empresas de capital fechado para a produção de materiais financeiros adequados e padronizados tanto para envio aos conselheiros, sócios, ou a matriz no exterior, como para o mercado bancário. Em empresas de capital fechado, tais profissionais podem atuar com foco no custo de financiamento ou, ainda, na captação desse financiamento, auxiliando o CFO ou CEO em tal tarefa. “Em um momento em que a economia está retraída e os bancos tendem a ser mais rigorosos em suas concessões de crédito, contar com um profissional dedicado para a preparação de material que facilite a análise de crédito é um diferencial que poucas empresas fechadas no Brasil perceberam”, diz.

Profissionalização
Apesar da função ser exigida por lei para todas as companhias abertas, só recentemente que a maioria das empresas começaram a criar uma área específica de RI e foram em busca de profissionais que pudessem assumir com exclusividade esse papel, até então acumulado pelos executivos financeiros. Atualmente, o IBRI (Instituto Brasileiro de Relações com Investidores) conta com 500 associados, de 150 companhias. Considerando que há mais de 500 empresas de capital aberto no país, é possível perceber o grande espaço para crescimento.

Segundo Francisco D’Orto, coordenador do MBA Finanças, Comunicação e Relações com Investidores da Fipecafi, o primeiro curso de pós-graduação em RI no Brasil, a dinâmica das aulas com estudos de casos e debates têm produzido um ótimo resultado para os alunos os quais experimentam o cotidiano de um RI em uma empresa fictícia. O curso possibilita uma visão global em finanças corporativas e negócios, aliando o entendimento teórico e prático das diversas atividades relacionadas ao mercado de capitais. “Além disso, não se limita aos aspectos financeiros tradicionais, mas também aspectos relacionados à imagem e governança corporativa e comunicação interna e externa das empresas, proporcionando uma visão ampla, multidisciplinar e integrativa na área de business”, destaca.

Perfil do profissional
O profissional de RI é um agente importante para a gestão equilibrada das expectativas dos diferentes públicos de interesse das empresas, bem como para a geração e preservação de valor junto aos acionistas e ao mercado. Essa é a principal conclusão de um estudo realizado pela Deloitte em parceria com o Ibri.

De acordo com a pesquisa, o papel do RI é visto mais como comunicador (46%) do que estrategista (29%), mesmo atuando fortemente junto à liderança e ao Conselho de Administração. Segundo Bruce Mescher, sócio da Deloitte, esse indicador é reflexo de um processo de mudança ainda em curso quanto à percepção do perfil do profissional de RI. Se, no passado, o perfil mais operacional e comunicador era o mais comum para a área de RI, as novas demandas e realidades das empresas e do mercado estão exigindo cada vez mais um perfil de RI mais estratégico na interlocução com diversos públicos e investidores.

Mescher aponta que a tendência é de consolidação do papel de estrategista, valorizando a função do profissional de RI. “O profissional de RI não deve apenas se preocupar com uma comunicação ágil com o mercado periodicamente. Hoje, ele deve ter uma visão mais integrada e estratégica sobre os objetivos e o potencial da organização, conhecendo profundamente o negócio, sua estratégia e seus direcionadores de valor. Ainda mais importante, o RI deve alavancar este conhecimento e o feedback do mercado para influenciar a execução da estratégia e da tomada de decisões das empresas”, exemplifica.

Essa nova realidade estratégica do RI está se refletindo no perfil dos profissionais e nas suas próprias estruturas. A formação do profissional é ampla, mas focada na área de negócios – notadamente Administração de Empresas (33%) e Economia (29%). Entre os entrevistados, 65% destacaram ter iniciado a carreira na área financeira.

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De acordo com a sócia da Global RI, é possível perceber uma mudança positiva em termos do entendimento e da importância dada à atividade, embora ainda longe do ideal. “Houve uma evolução nos últimos tempos. As atividades e responsabilidades de RI continuam sendo as mesmas, apenas são mais empresas que estão reconhecendo o valor da área e permitindo que essas atividades e responsabilidades sejam exercidas”, conclui.

Desafios
A volatilidade macroeconômica e política no Brasil foi significativa nos últimos 12 meses, impactando de forma relevante nas expectativas dos agentes do mercado. A seguir, RIs comentam o que consideram ter sido seu principal desafio no último ano:

Geraldo Soares - Itaú Unibanco: O cenário foi desafiador para o profissional de RI, pois teve que se aprofundar em assuntos como eleições em 2014, lei anticorrupção, compliance, ratings em seu cotidiano. E o cenário prossegue desafiador e dinâmico para os próximos meses, pois a tendência é que a volatilidade e fatos novos prossigam gerando mudanças constantes de humor nos agentes de mercado.

Calos Lazar - Kroton: Diversas empresas ou mesmo setores da economia enfrentaram nesses últimos meses um cenário bastante desafiador, o que reflete diretamente na tomada de decisões de investimento dentro e fora do mercado de capitais. Nesse contexto, o principal desafio da Kroton no que tange à área de RI é explicar todas as mudanças regulatórias e seus verdadeiros impactos na operação, com o propósito de minimizar possíveis compreensões equivocadas. Além disso, buscamos atrair o interesse dos investidores, principalmente destacando as inúmeras oportunidades que a companhia ainda vislumbra no horizonte e demonstrando que o grupo trilha um caminho de geração de valor, no longo prazo, a todos os stakeholders.

Jose Roberto Pacheco - Odontoprev: O principal desafio recente em RI tem sido o de posicionar a Companhia, líder em planos dentais corporativos no Brasil, como a pioneira também em novo ciclo de crescimento orgânico, destinado ao mercado de empresas PME e planos individuais, ambos de grande potencial futuro. Esta ampliação do foco estratégico conta com o comprometimento e apoio de canais exclusivos de distribuição OdontoPrev, como o Bradesco e BB Seguridade, sócios da Companhia. Com 90% das ações votantes em circulação com fundos estrangeiros, dívida zero e prática de distribuição trimestral integral de lucros a investidores, as ações da OdontoPrev no Novo Mercado tem representado capitalização superior a R$ 5 bilhões, nos últimos 3 anos.

Área de RI - Marcopolo: Os principais desafios incorridos pelo RI no último ano foram transmitir de forma clara e objetiva os impactos que a empresa incorreu por conta da desaceleração no setor de atuação e expor quais foram as medidas adotadas para mitigar este desaquecimento, assim como comentar sobre as perspectivas de médio e longo prazo, dado a falta de visibilidade do setor da atuação da Companhia naquele momento.

ENTREVISTAS:

Rodrigo Alves, Diretor de RI da Ser Educacional

Qual seu principal desafio ao assumir a diretoria de RI do grupo Ser Educacional?

Ajudar a tornar o grupo cada vez mais conhecido no mercado de capitais brasileiro e internacional. Trata-se de uma empresa jovem, que, em pouco mais de 10 anos de trajetória, conseguiu se tornar um dos maiores grupos educacionais do Brasil, com ações listadas na Bolsa há pouco menos de dois anos e que possui muitas iniciativas para continuar essa história de crescimento.

Diante da atual conjuntura político-econômica brasileira e da postura mais cautelosa do investidor, como o profissional de relações com investidores deve agir e quais competências deve desenvolver nesse momento?

Entendo que esse seja um dos grandes “momentos da verdade” entre profissionais da área e investidores. É no cenário de incertezas que se torna fundamental manter contato proativo com o mercado, combinando fluxo de informações frequente e equânime, por meio da distribuição de comunicados e fatos relevantes. Fazer isso combinando encontros entre os executivos-chave da empresa com os investidores, jornalistas e outros formadores de opinião, de forma a manter o mercado de capitais apto a tomar suas decisões de investimento da forma mais precisa possível. Para isso, o profissional da área deve desenvolver muito seu perfil comunicador e estar muito bem alinhado com a área de comunicação (assessoria de imprensa) para que as mensagens possam ser transmitidas aos stakeholders da melhor forma possível.

Como esse baixo crescimento da economia e o receio dos investidores está afetando o trabalho de RI? Você poderia listar alguns desafios que esses profissionais enfrentam atualmente?

A maior mudança está na sensibilidade dos investidores que de maneira geral se tornaram avessos a qualquer tipo de risco. Esse comportamento se torna ainda mais complexo em virtude do constante fluxo de notícias potencialmente sobre a economia brasileira e setores, que na maioria das vezes não são de controle das empresas. Além disso, em muitos casos são meros boatos, mas de qualquer forma requerem atenção redobrada dos profissionais da área de relações com investidores no sentido de capturar essas notícias e ter uma posição adequada da companhia da forma mais ágil e precisa possível.

Andréa Fernandes, Gerente de RI do Grupo EcoRodovias

Como a crise se reflete na solicitação dos investidores por informações? O trabalho do RI aumentou? Foi necessário aumentar a equipe? Por que?

A demanda por informações aumentou, por isso temos que ser cada vez mais ágeis para atendê-la e, assim, reduzir eventuais ruídos causados por notícias ou rumores de mercado. Tudo isso requer que estejamos ainda mais próximos da alta administração e do conselho, de forma a dar respostas rápidas ao mercado. Os desafios que a crise nos coloca requerem uma postura mais proativa de forma a melhorar a percepção de valor da empresa pelos investidores. São fundamentais a comunicação transparente com os investidores, a disponibilidade para fornecer explicações, e reforçar nosso modelo de governança corporativa. O trabalho do RI aumentou, mas não foi necessário aumentar a equipe. Passamos a interagir de forma mais coesa com outras áreas como Planejamento, Controladoria e Jurídico.

O que os investidores estrangeiros passaram a perguntar para o RI que não perguntavam antes? 

Atualmente, parte relevante das reuniões com investidores estrangeiros é utilizada para explicar o Brasil, premissas macroeconômicas, ambiente político e também insegurança com relação ao marco regulatório do setor. Após esclarecidas as dúvidas sobre o Brasil, os investidores abordam as questões estratégicas e os fundamentos da Companhia, como anteriormente.

E os investidores brasileiros?

Os investidores locais olham o estratégico e os fundamentos, mas o foco no curto prazo é bem relevante. A solicitação de reuniões, e conference calls por investidores brasileiros, em tempos de crise, aumenta muito. Eles querem acompanhar como está a evolução mês a mês e o que está sendo feito para mitigar os impactos da crise nos resultados da Companhia.

Qual a principal diferença entre as informações solicitadas pelos investidores nacionais e estrangeiros?

Os investidores nacionais lidam com os efeitos macroeconômicos, políticos e regulatórios em uma base diária, pois a informação está disponível rapidamente por todas as mídias. As revisões de modelos tornaram-se mais frequentes com a deterioração e incertezas macroeconômicas. Os investidores internacionais observam perspectivas mais de longo prazo, quais os fundamentos do negócio, os drivers de crescimento, indicadores de performance, entre outros.


Continua...