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Em Pauta

BRASIL EM CRISE: COMO SERÁ O AMANHÃ? RESPONDA QUEM PUDER...

“Como será o amanhã? responda quem puder... o que irá nos acontecer...”, versos da conhecida canção popular, que deixa nosso destino para o que Deus quiser, nunca foi tão profética como neste momento. Depois de uma paralisia geral em 2015, ano devastado por notícias diárias de corrupção, prisões de grandes empresários e políticos, nunca dantes imaginados, 2016 não começou diferente...

Todos os dias continuam marcados por novas revelações da operação “Lava Jato” sobre a extensão do esquema de corrupção que vai além da Petrobras, de novas prisões e pior, a permanência da falta de condições de governabilidade da atual presidente, que agora corre o risco de perder o apoio de seu próprio partido, o PT.

Esse verdadeiro carnaval de informações, em que qualquer agenda econômica está pendurada na política, está exigindo um esforço redobrado nas Relações com Investidores. Os profissionais de RI que antes tinham que responder sobre a empresa, seu setor e cenários macroeconômicos do país, agora se vêem chamados a responder sobre questões de política e de polícia...

Edmar Prado Lopes, presidente do Conselho de Administração do IBRI (Instituto Brasileiro de Relações com Investidores) e CFO da Gol, diz que a demanda por informações está maior e mais complexa do que nunca. No caso da Gol, que atua num setor que depende muito do exterior e que tem a Petrobras como sua maior fornecedora, a equipe de RI já recebeu perguntas inusitadas como: a Polícia Federal já foi a seu escritório hoje?

De modo geral, segundo Lopes, os “compliances” dos investidores estão exigindo esse tipo de informação. Também está se formando uma convicção de que a crise vai durar mais que outras, o que tem levado a perguntas sobre como a empresa vai responder a uma crise mais prolongada. Há ainda uma demanda muito significativa de informações sobre a questão política, além das questões macroeconômicas como crescimento do PIB, inflação, câmbio, taxa de juros, que também impactam os resultados das empresas. E ainda tem mais: além da renda variável, o RI precisa dar informações para o investidor de dívida, que também teve uma redução relevante no volume de recursos disponíveis para o Brasil, acrescenta.

Outra mudança importante decorrente da crise é o tempo de resposta. “Houve um aumento exponencial na velocidade das respostas”, diz o presidente do IBRI. Antes o RI podia agendar uma teleconferência, por exemplo, para passar informações. Hoje tem que responder na hora, se não quiser criar mais problemas do que já tem. E isso considerando que, se fazer projeções já era difícil, no momento elas estão beirando o imponderável.

Como exemplo, Lopes cita o PIB (Produto Interno Bruto). No início de 2015, a previsão do governo era de um crescimento do PIB na casa dos 3% pelo menos e o país acabou fechando o ano com um do PIB em queda de 4%.

“Lidar como a realidade atual não é tarefa fácil. Uma prática que pode ajudar o RI é não se esconder e não ter assimetria na informação. Tem que estar ainda mais disponível e com um tempo de resposta muito mais rápida do que antes,” pontua o presidente do IBRI.

Perda continua
Para Rodrigo Luz, diretor presidente do IBRI e RI da Eternit, a queda da Bolsa mostra que tem havido grande retração dos investidores. Em 2015, o IBovespa, principal índice de preços das ações da bolsa de valores brasileira, perdeu 13% de seu valor em reais e 41% do valor em dólares, que também refletiu a expressiva desvalorização do real frente à moeda norte americana.

Na avaliação de Luz, a expectativa é de que a perda vai continuar, sobretudo agora que o Brasil perdeu o selo de bom pagador, com mais um rebaixamento de seu grau de investimento pela Moody’s, a única entre as maiores agências de classificação de risco, que ainda não havia rebaixado o risco do Brasil.

“Isso significa que a saída de investidores deve continuar, já que a política de muitos fundos de investimento impede que apliquem em países que não tenham boa classificação de risco. E o RI tem que conviver com mais situação de complexidade e incerteza”, observa.

Em janeiro deste ano, o balanço da negociação dos investidores estrangeiros na BM&FBOVESPA foi negativo em R$ 167,3 milhões, resultado de compras no valor de R$ 53,53 bilhões e de vendas de ações de R$ 53,70 bilhões. No mesmo período o mercado de renda fixa privada da bolsa também apresentou queda, apesar da elevada taxa de juros praticada no país. Em janeiro deste ano totalizou R$ 57,02 milhões, ante R$ 73,88 milhões em dezembro de 2015.

De olho na nova realidade trazida pela crise, empresas ouvidas pela Revista RI, relatam suas percepções e experiências nas Relações com investidores.

Comunidade alerta
A crise tem afastado ou deixado ainda mais alerta toda a comunidade financeira, especialmente os investidores estrangeiros, processo que levou a uma intensificação na procura por informações e os possíveis impactos para a companhia, de acordo com Rogério Tostes, diretor de relações com investidores da TIM.

“Assuntos como exposição de custos, investimentos, ao câmbio e a inflação, impactos sobre a demanda por serviços, capacidade de pagamento dos clientes e o risco de aumento de impostos passaram a ter posições de destaque nas discussões, em alguns momentos até maiores que questões sobre a nossa operação”.

Para atuar face a nova realidade, a Tim Intensificou a comunicação com os investidores, especialmente em visita aos seus escritórios. Nesses encontros, a companhia busca dar mais visibilidade aos seus potenciais e apresenta os fundamentos micro (da companhia), mas também os atualizamos sobre os impactos macros. Conforme Tostes, questões de exposição ao dólar, impacto da inflação, PIB, desemprego e escândalo de corrupção estão presentes em 100% dos encontros. 
 
Além disso, a TIM aumentou o nível de interação do time de liderança da companhia com o mercado e introduziu o videoclipe de resultado nas suas comunicação ao mercado, com o CEO fazendo sua análise sobre os resultados recentes, acrescenta o RI.

Em relação a diferenças entre solicitações dos investidores nacionais e estrangeiros, Tostes observa que ambos têm preocupações similares. Mas ressalta que a profundidade dos questionamentos e o nível de preocupação com os temas variam. “Os investidores nacionais tendem a ter uma visão um pouco mais pessimista e são mais detalhistas sobre os impactos da crise.”

Por sua vez, os estrangeiros buscam um entendimento maior entre as ligações da crise política com a crise econômica e, muitas vezes, têm demandas menos aprofundadas sobre os impactos da crise. “Os estrangeiros ainda mantêm uma visão levemente menos pessimista, influenciada também pela possibilidade de comprar ativos mais baratos com a depreciação do real, o que altera a relação risco retorno para os mesmos”.

Sobre a percepção de qual crise paralisa mais o país, a Política ou Econômica, Tostes afirma que a percepção dos investidores é de que ambas estão estreitamente ligadas. “As duas questões estão totalmente ligadas e os investidores têm esse entendimento. Como a crise política não dá sinais de melhora, ações imediatas para controlar a crise econômica passam a ganhar mais o foco dos investidores.”

Contatos pró-ativos
Para consolidar a credibilidade no que diz respeito ao negócio da Usiminas, sua equipe de RI aprofundou-se em discutir efeitos não recorrentes, situações adversas diante de decisões operacionais nunca vividas até então, devido ao cenário de crise. Segundo Cristina Morgan, gerente-geral de relações com investidores da Usiminas, com a crise, o nível de discussão ficou muito mais profundo, mais amplo. Isso tornou “imprescindível comunicar o que a companhia está fazendo para reverter os resultados, adequar-se à realidade, superar momentos de falta de crescimento da economia e da indústria.”

Com este objetivo, a Usiminas passou a fornecer um melhor detalhamento de informações que antes eram consideradas imateriais. Além disso, a empresa tem feito contatos pró-ativos com analistas e investidores, sempre buscando atendê-los de uma maneira ágil, com a equipe de RI estando ainda mais disponível e próxima ao mercado, incluindo rodadas de non-deal roadshows (reuniões na “casa” dos investidores), participação em conferências e conference calls

Quanto à percepção em relação à duração da crise, Cristina afirma que as expectativas são de melhoria do ambiente político e econômico apenas no segundo semestre de 2017. “A maioria dos investidores está muito preocupada com a situação política, que traz muitas dúvidas sobre a recuperação da economia, retorno dos investimentos, resgate de confiança de empresários e consumidores”, destaca.

A RI da Usiminas observa que ambas as questões, política e crescimento econômico estão sendo avaliadas em conjunto. Se a crise política for superada mais rapidamente, o crescimento econômico acaba sendo uma consequência natural”.

Mudança de foco
Na Brasilagro, o foco das solicitações de informações por parte dos investidores mudou bastante com a crise, conta Ana Paula Ribeiro, RI da empresa. “Os investidores estão mais preocupados com a duração da crise. Também existe uma preocupação com as perspectivas de crescimento econômico, mas nada comparado com a instabilidade política, que gera uma incerteza ainda maior no lado regulatório”.

Nessa perspectiva, os investidores estão mais focados em saber se o modelo de negócio da Basilagro continua sustentável, e como a empresa está se preparando para enfrentar a crise, e não mais no dia a dia das operações. Para fazer frente à nova realidade, “estamos fazendo um follow-up com os investidores que já conhecem a empresa para falar o quão descontado está o preço da ação e que pode ser uma oportunidade de entrar no papel.”

Também atuam de forma a mostrar que a empresa se preparou para esse momento (caixa forte, dívida baixa, nada de dívida em dólar, hedge, etc) e que este cenário pode trazer grandes oportunidades de crescimento. Desta maneira, a Brasilagro acredita que pode atrair a atenção de novos investidores e continuar melhorando a liquidez do papel.

“É importante transmitir para o investidor o bom momento da empresa, com discurso embasado em dados e fatos, estar preparado faz toda a diferença.” Grande parte dos acionistas vê a depreciação do real como uma oportunidade de investimento, mas estão "on hold" (aguardando) até o cenário ficar mais claro no aspecto político, acrescenta Ana Paula.

Desafios relevantes
A crise prejudicou muito a percepção de valor da Randon. Diante disso, a empresa mantém contato mais frequente e mais próximo com seu público. De acordo com Hemerson Fernando de Souza, gerente de planejamento e de RI da empresa, a Randon tem direcionado e adequado sua comunicação com o mercado, com foco em seus desafios mais relevantes.

“Ampliamos a discussão sobre os ajustes que estamos fazendo em nossas estruturas, cortes de custos e despesas. Mostramos os impactos que as reduções de resultados têm promovido em nossa estrutura de capitalização e no tamanho de nossa dívida.”

Segundo Souza, infelizmente existe uma percepção de que o país está inerte frente aos problemas e com isso está alongando o tempo de nossa crise. “É comum comentários de que não temos nem vontade e força política para atravessar rapidamente estes problemas. E ligam um problema ao outro: a situação política paralisa o crescimento”.

A situação da economia internacional, com uma retração mais forte do preço das commodities, também entrou na preocupação dos investidores, reduzindo ainda mais a confiança no Brasil. ”Se já não estávamos conseguindo lidar com nossos problemas domésticos, teremos ainda mais dificuldades.”

Diante disso, as demandas por informações sobre a empresa continuam intensas. “Em muitos casos, a frequência e as checagens acontecem em maior intensidade agora”.

Hemerson ressalta, porém, que a abordagem é distinta. “É fácil perceber que temas sobre percepção do país e dos entraves políticos ganham mais espaço na abordagem dos investidores estrangeiros, preocupados com o desenrolar dos nossos problemas políticos domésticos.”

Além disso, outros temas, como dívida, inadimplência e caixa acabam ganhando maior ênfase, por parte dos investidores estrangeiros. Já os investidores nacionais têm uma abordagem mais direcionada a oportunidades fora do país e as formas que podemos explorar nossa moeda mais desvalorizada, relata.

Aumento de perguntas
Para o diretor de RI da Kroton, Carlos Lazar, de modo geral, a empresa percebeu um aumento significativo de perguntas envolvendo o cenário macroeconômico e a sua correlação com o crescimento da companhia.

“Observamos ainda, uma demanda crescente por informações relacionadas às taxas de inadimplência e evasão dos alunos. Com essas informações, os investidores criam cenários para quantificar os impactos que uma piora eventual nessas taxas pode produzir”.

Com a crise, a Kroton procurou ficar ainda mais próxima do mercado, participando de eventos e fornecendo informações que traduzem suas iniciativas para mitigar a piora do cenário macroeconômico. “Com isso, conseguimos elucidar não somente os reais impactos que estamos sujeitos a apresentar, mas principalmente todas as ações que estamos adotando para continuar gerando valor de forma consistente e sustentável”, observa Lazar.

Na percepção da Kroton, a maioria dos investidores, especialmente os brasileiros, estão bastante pessimistas em relação à economia do país, acreditando que a crise deve permanecer pelos próximos dois ou três anos. Tal perspectiva faz com que as carteiras de investimento se concentrem em maior proporção em renda fixa e dólar, em detrimento de ações.

Além disso, no caso de fundos de investimento globais e de mercados emergentes, Lazar diz que “percebemos que os analistas preferem alocar seus recursos em países com menor risco sistêmico, considerando ainda que o peso do Brasil em índices que são colocados como benchmark pelos fundos diminuiu bastante mais recentemente.”

Recursos reduzidos para emergentes
Estudo realizado pelo banco depositário BNY Mellon, revela que houve uma redução relevante dos recursos aplicados no Brasil por fundos dedicados a mercados emergentes. Em 2010 estavam aplicados no país US$ 88,37 bilhões considerando os dez maiores fundos de ações (Top 10 equity investor in Brazil). Em 2015, esse volume havia caído 37%. A expectativa é de que a redução continue, principalmente agora depois da perda do selo de bom pagador.

Segundo Nuno da Silva, diretor para a América Latina do BNY Mellon, a política da maioria dos grandes fundos de mercados emergentes não permite que eles apliquem em países que não tenham boa classificação de risco. E o Brasil foi excluído dessa condição por parte das grandes agências de classificação de risco como a Standard & Poor’s e Fitch Rating e mais recentemente da Moody’s.

Além disso, muita gente perdeu dinheiro com o Brasil devido à expressiva queda do valor das companhias na bolsa de valores e da forte desvalorização do real frente ao dólar com o aprofundamento da crise político econômica no decorrer de 2015, observa Nuno.

Este ano (até 26 de fevereiro) o valor de mercado (Market capitalization) das companhias negociadas na BM&F Bovespa estava em US$ 461,8 bilhões, o que representava menos da metade do valor registrado no final de 2010, de US$ 1,54 trilhão, dados da bolsa.

O estudo aponta que também houve redução das aplicações desses fundos na América Latina, em países como México, Chile e Peru. Mas sem dúvida, a maior redução foi no Brasil que também era o país que recebia os maiores volumes de recursos, ressalta Nuno da Silva. “Na Argentina houve uma mudança na situação. Com o novo governo, o país passou a receber uma nova atenção dos investidores”, destaca.

Apesar dos elevados juros praticados no Brasil, a renda fixa não é atraente para os fundos estrangeiros. De acordo com Nuno, isso se deve ao elevado risco cambial e ainda ao aumento dos juros nos Estados Unidos e à estabilidade da economia americana.

Apesar de apontar que a percepção dos investidores internacionais é de que o fim da crise não está no horizonte, o diretor de BNY afirma que o mercado brasileiro é muito grande para ser totalmente desprezado. Embora ainda não existam estatísticas sobre sua atuação, um novo grupo de investidores que procuram ativos baratos, os chamados Value Fund, podem estar entrando no país. Mas são fundos que aplicam recursos bem menores do que os fundos dedicados.

Na atuação dos RIs, a percepção do banco depositário é de que há uma mudança de comportamento, com a adoção de estratégias para atrair novos investidores. “Apesar da crise, há empresas bem sucedidas que continuam atraentes para os investidores”. Silva diz ainda que investidores também estão mudando o seu olhar. “Estrangeiros que antes olhavam mais para o macro agora olham mais para as empresas”.


Continua...