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Educação Financeira

O RISCO & OS CERTIFICADOS DE OPERAÇÕES ESTRUTURADAS

Qual o tamanho do salto, a grossura da gravata, o estilo das saias ou o número de botões do paletó que vamos usar neste inverno? Sabemos que o mercado do vestuário é influenciado por tendências e modismos, mas ele não está sozinho. Os modismos influenciam também o mercado financeiro. E não são apenas as roupas dos operadores que mudam a cada estação, os produtos financeiros também entram ou saem de moda. A tendência da vez são os COEs, ou Certificados de Operações Estruturadas.

A emissão de COEs foi regulamentada pelo Banco Central no segundo semestre de 2013 e desde então virou tendência, virou moda. O COE se tornou tão popular que em uma revista voltada para quem vive o mercado financeiro no dia a dia, como a RI, não vale a pena retomar definições. Prefiro aproveitar o espaço para refletir sobre os riscos desse produto.

Risco - vilão ou mocinho?
Uma das mais sólidas verdades em finanças é a máxima de que o retorno é diretamente proporcional ao risco. Ou seja, quanto mais risco tomamos, maiores são as expectativas de retorno. Segundo a hipótese dos mercados eficientes, risco e retorno se auto ajustam ao longo do tempo.

Afinal, risco é algo bom ou ruim? Nem um, nem outro. Muitas vezes correr risco é aconselhável. Em outras vezes é algo que se deve evitar. Para explicar aos meus alunos na universidade, recorro ao exemplo de uma festa. Escolho um aluno ou aluna e coloco a seguinte questão: se você for a uma festa e escolher se aproximar da pessoa mais atraente que estiver desacompanhada, qual sua chance de sucesso? E se você escolher investir atenção em alguém não tão atraente e menos disputado, qual a chance de sucesso? A maioria acredita que a chance de sucesso na segunda opção é maior. Mas quase todos concordam que assumir risco neste caso compensa. Nesse exemplo, o risco maior vem acompanhado de uma recompensa.

Agora imagine se o risco pudesse ser fatal. E se alguém se jogasse de uma ponte elevada e, para evitar o impacto, apenas amarrasse uma corda elástica aos pés? Caso a corda se rompesse, a probabilidade de o sujeito morrer seria enorme. Quanto alguém cobraria para se submeter a tamanho risco? Parece estranho, mas em vez de receber pelo risco, muitas pessoas pagam valores elevados para praticar Bungee Jumping.

Há algum tempo eu falava com um amigo sobre investimentos e ele se dizia extremamente conservador. Eu sabia que ele era praticante de Bungee Jumping e demonstrei minha estranheza com o fato de alguém que se diz “extremamente conservador” correr tamanho risco nas horas de lazer. Ele justificou que não julgava o esporte arriscado, pois tinha controle dos equipamentos e confiava nos cálculos que fazia antes da prática. Além do mais, a adrenalina gerada em um salto compensava imensamente o risco corrido.

Pois bem, parece que ele não era de fato conservador, apenas avesso a assumir um risco que não entendia no mercado financeiro. Da mesma forma, eu considero absurda a proposta de pular da ponte com uma corda amarrada aos pés. Isso porque não percebo a recompensa da adrenalina com o mesmo valor que meu amigo a percebe.

O lado bom de assumir riscos
Vamos imaginar que alguns jovens talentosos decidam ganhar a vida no mercado financeiro. Montam, então, uma pequena gestora de investimentos. Alugam uma bela sala, compram mobílias caras, dão um belo nome em inglês como Something Asset Management e se lançam a captar recursos.

Como jovens inteligentes, sabem que se forem conservadores e colocarem todo o dinheiro dos clientes em títulos vinculados à Selic obterão uma rentabilidade muito próxima àquela que os grandes bancos de rede oferecem. Também sabem que precisarão cobrar taxas de administração elevadas para cobrir seus custos, muito maiores do que os dos grandes bancos – levando em conta a proporção do volume de dinheiro captado.

Os jovens precisarão correr riscos elevados para ter chances concretas de ganhar muito acima do mercado e atrair clientes. O risco que devem correr pode ser o de crédito ou os riscos assimétricos. Os fundos que correm riscos de crédito geralmente trabalham com crédito privado. Os fundos de arbitragem de riscos são chamados fundos de arbitragem ou long/shorts. Fundos com riscos assimétricos podem ser interessantes para os clientes com elevada propensão ao risco, mas é fundamental que o cliente saiba de onde o risco vem.

Risco assimétrico
O risco assimétrico pode ser compreendido a partir de um simples exercício de imaginação. Pense que você é o gestor um fundo de R$ 1 milhão. Compra, então, LFTs (Letras Financeiras do Tesouro) que, descontando os custos de administração, vão render menos que a taxa Selic. Neste caso você teria um rendimento medíocre para seu fundo e nunca receberia qualquer taxa de performance.

Agora digamos que um amigo seu compre uma Ferrari e resolva fazer um seguro com prêmio de R$ 50 mil. Ele é extremamente cuidadoso e vai usar o carro muito pouco. Então, você resolve assumir o risco, em nome do fundo, em troca dos R$ 50 mil. Se não houver sinistro em um ano, ótimo. Seu fundo vai poder pagar uma taxa de administração de 3% e ainda aumenta em quase 50% sua rentabilidade em relação a Selic.

Mas se o seu amigo destruir a Ferrari em um acidente, pode ser que você tenha que gastar todo o dinheiro do fundo e mais um pouco para recuperar o prejuízo. Seus clientes iriam ver suas poupanças virando pó. Já você, no máximo, perderia o emprego. Claro que se você não corresse riscos, também ficaria desempregado.

Evidentemente, os fundos são proibidos de fazer seguros de carro ou qualquer seguro, mas podem reproduzir uma situação semelhante nos mercados futuros e de derivativos. O mercado futuro compra e vende expectativas. Nesse mercado não são negociados títulos ou bens, mas o direito de comprar ou vender algo em data futura, a um determinado preço.

Você pode, por exemplo, vender por R$ 0,40 por cada dólar uma opção que dá a um empresário o direito de comprar de seu fundo um milhão de dólares a R$ 4,20 em 15 de dezembro de 2016. Digamos que este empresário tenha uma dívida a ser paga nesta data. Caso o dólar chegue ao dia 15 de dezembro valendo mais, o empresário tem o direito de comprar seus dólares a R$ 4,20. A diferença entre a cotação futura e o valor da opção teria que ser suportada por seu fundo. Mas caso o dólar custasse menos que os R$ 4,20, o empresário não exerceria a opção e seu fundo embolsaria um prêmio de R$ 400 mil.

O COE e o risco
Ao estruturar um COE, o gestor pode apresentar para os clientes quais são os limites do risco e qual o ativo objeto ao qual o risco está vinculando. É um processo muito mais claro do que o de um fundo. Este risco pode estar vinculado a uma moeda estrangeira, à inflação, à taxa de juros, ao preço de uma ação ou de um índice de ações, ao valor de uma commodity ou a uma combinação destes preços, não descartando outras opções.

Outra vantagem de um COE é que ele pode definir claramente um limite máximo de perda, sendo que no Brasil o mais comum tem sido a modalidade de capital garantido. Ou seja, se tudo der errado você recebe o dinheiro de volta, mas sem correção. O risco, portanto, é perder o rendimento do período.

Como você já viu neste artigo, o risco não é nem vilão nem mocinho. Da mesma forma, os COEs podem ser uma boa opção ou não. O fundamental é que você entenda sempre qual risco está correndo e qual o impacto em sua vida financeira caso as coisas não saiam como você espera. A motivação do risco também precisa ser compreendida: você busca o prêmio como os jovens na festa ou a adrenalina do praticante de Bungee Jumping?

Infelizmente, tenho visto o mercado vender COEs para, e por, pessoas que não entendem o que ele é. Lembrando Sir John Templeton “as quatro palavras mais caras da língua inglesa são: this time it’s different - desta vez será diferente..


Jurandir Sell Macedo
é doutor em Finanças Comportamentais, com pós-doutorado em Psicologia Cognitiva pela Université Libre de Bruxelles (ULB) e professor de Finanças Pessoais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
jurandir@edufinanceira.org.br


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