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Investimento Sustentável

QUEM SE SAI MELHOR, INVESTIDORES ATIVOS OU DE ÍNDICES?

A guerra de palavras entre gestores ativos e de índices ganhou novas proporções. Um acusa o outro de não cumprir seu principal dever fiduciário. Mas esta é a pergunta correta a se fazer?

Saker Nusseibeh, CEO da Hermes Investment Management, diz que a virada do mercado para a gestão passiva é "um desastre", e para a Bernstein Investment Research, "o investimento passivo é pior do que o Marxismo para a sociedade". É claro que os investidores se sentem ameaçados. Em uma economia de baixo retorno, as taxas administrativas tiram a competitividade do investimento ativo quando comparado aos fundos de índices, e a saída de capital vem acelerando nos últimos quatro anos.

Os gestores ativos aproveitam para "vender seu peixe" quando falam dos pontos fracos do investimento em índices, mas eles têm certa razão. Ao seguirem índices baseados no valor de mercado, os gestores de índices alocam mal o capital para cima e para baixo.

Os investidores de índices contra-atacam, destacando em um estudo após o outro — sendo o mais recente do Bank of America Merrill Lynch — que somente uma minoria de gestores ativos (segundo o BoAML, 14%) consegue bater o benchmark. Onde fica o dever fiduciário se você cobra mais para entregar menos, eles perguntam (com razão)?

Mas esta discussão é antiga. Por sorte, temos dados recentes que trazem uma luz nova sobre esta questão.

O primeiro é um importante estudo que fez uma referência cruzada entre dados de ASG de companhias e levantamentos setoriais dos principais dados de ASG. Os acadêmicos descobriram que "as companhias com bom desempenho nos principais aspectos de sustentabilidade têm desempenho significativamente melhor do que as companhias que apresentam desempenho ruim nestes mesmos aspectos". O resultado é um alfa de sustentabilidade para investidores competentes que excede 3% ao ano. Estes dados poderiam ser utilizados em estratégias quant ou smart beta, mas provavelmente oferecem mais valor para carteiras ativas e concentradas sem benchmarks, e nas quais os gestores são incentivados a atuar no longo prazo.

O segundo são dados sobre a votação de resoluções relacionadas a ASG em AGOs. As resoluções de companhias norte-americanas, incluindo Chevron e ExxonMobil, sobre divulgação de questões de alto risco climático em 2016 levaram a uma análise de como foi a votação, e as respostas são preocupantes. 60% dos investidores que votaram a favor de testes de estresse para 2ºC em companhias não americanas (BP, Shell, Statoil e Suncor), votaram contra ou se abstiveram em decisões bastante semelhantes em companhias norte-americanas, simplesmente porque a diretoria aconselhou assim. Isto levou a Preventable Surprises, uma "think-do tank" global a lançar a Iniciativa "#Missing60" (em português, "#Faltam60"), que pede que os gestores expliquem porque votaram de forma inconsistente em uma questão com risco sistêmico tão iminente, apoiando assim companhias que apostam contra o acordo da COP21, penalizando as companhias líderes neste setor.

O que esta análise mostra é que alguns investidores de índices votaram corretamente (p.ex. Legal & General Investment Managers, Florida State Pension Fund, HSBC Global Asset Management e State Street Global Advisers), mas outros, não (Vanguard, gigante invisível de US$ 3,5 trilhões, e a Blackrock, que possui mais fundos de índices em seus ativos sob gestão do que investimentos ativos). Há ainda alguns gestores ativos que votaram corretamente (p.ex. Alliance Bernstein, AXA IM, Canadian Pension Plan Investment Board, Schroders), mas muitos outros votaram de forma inconsistente (p.ex. Capital Group, Fidelity, Franklin Templeton Investments e JP Morgan Asset Management).

O resultado é que, principalmente grandes investidores norte-americanos criam um comportamento corporativo disfuncional no campo climático, e tanto ativos quanto índices são parte do problema.

Por que nos concentramos na divulgação corporativa de riscos climáticos de companhias norte-americanas? Porque os EUA estão dando o tom do debate em muitas questões de sustentabilidade e porque eram os dados estão disponíveis. No Brasil, pode ser mais apropriado nos concentrarmos em saúde e segurança, ecoeficiência no fornecimento de água e atividades anticorrupção e propinas, com o objetivo de mudar normas setoriais. No entanto, os mesmos princípios – e as mesmas objeções – podem ser provavelmente se aplicam neste caso.

Portanto, se a referência "ativo x índice" não é o melhor para ser utilizado na comparação de desempenho de dever fiduciário no século XXI, qual referência devemos usar?

Acreditamos que a pergunta central seja: os investidores entendem a importância da produtividade dos recursos e a importância dos propulsores da sustentabilidade? Não há dúvida de que muitos gestores ativos diriam que são parte inerente da solução, uma vez que apoiam a boa gestão. Mas esta ilusão sobre seu papel positivo na alocação de capital está lado a lado com a ilusão sobre o seu papel na entrega de alfa! Por quê? Em primeiro lugar, muitos dos investidores ativos são, na prática, investidores "closet index", o que significa que, na prática, os clientes têm o pior dos dois mundos: taxas altas para, de fato, gestão de índice. Em segundo lugar, como muitos investidores na verdade se envolvem com trading ao invés de investimento baseado em valor de longo prazo – o crescente movimento de curto prazo é impulsionado por poderosos incentivos financeiros e outros incentivos pessoais e organizacionais – qualquer função positiva de alocação de capital de mercados secundários acaba sendo exagerada. Até mesmo o FMI já diz que os investidores institucionais contribuem para a instabilidade do mercado financeiro.

A realidade é que a maioria dos investidores ativos não integra a análise de sustentabilidade a seus processos centrais. As companhias altamente lucrativas, como BP, Tesco, VW e Sports Direct – as quais um de nós chamou de "surpresas evitáveis" – recebem bastante atenção quando já é tarde demais. A destruição de valor causada é a ponta do iceberg relacionado à destruição de valor que acontece "debaixo d'água" e fora do campo de visão, com executivos administrando as companhias de modo a maximizar o preço das ações no curto prazo e atingir a meta trimestral de LPA. E os gestores ativos não são melhores que seus colegas de índices no que se refere a recompensar os executivos por esta destruição silenciosa do valor para os acionistas. 95% dos investidores votam 'a favor' dos planos de remuneração dos executivos nos EUA, o chamado "Say on Pay", ainda que 80% das companhias não tenham eficiência de capital ou métricas de inovação relacionados a criação de valor de longo prazo.

É claro que os investidores ativos poderiam se tornar parte da solução ao concentrar seus perfis em, digamos, 30 ações, com foco nos aspectos relevantes de ASG para o desempenho e adotar horizontes de longo prazo, recompensando o desempenho de profissionais de investimento (p.ex., janelas móveis de desempenho de 5 anos). Se isto é possível para todos os gestores envolvidos com entidades de capital aberto (com a controladora também fazendo o jogo do lucro trimestral), ainda não está claro. Mas, certamente, um importante primeiro passo é tornarem-se "administradores responsáveis vigorosos", principalmente com relação às questões de riscos sistêmicos, como mudanças climáticas e outras prioridades nacionais, como escassez de água, corrupção e propinas.

Talvez de maneira paradoxal, os investidores de índices cujo foco exclusivo nas métricas tradicionais de desempenho quantitativo os mantenha concentrados nos retornos de curto prazo, impedindo que identifiquem os principais atributos para o crescimento, estejam melhor posicionados para progredirem mais rápido neste campo de administração responsável de carteira. Na falta de analistas tradicionais, que podem desacelerar a mudança por motivos 'territoriais' organizacionais, tudo o que precisam fazer é decidir tornar a administração responsável uma estratégia corporativa prioritária e investir no aprimoramento de aptidões para mudar as decisões internas das companhias sobre investimentos. O maior desafio enfrentado por investidores de índices é superar os mesmos conflitos de interesse que seus colegas ativos enfrentam. Os custos financeiros são relativamente insignificantes em relação ao total de seus orçamentos organizacionais.

Hoje, gestores de fundos – tanto ativos como de índices – têm uma visão pulverizada da realidade, com um foco mal posicionado em definições estreitas e de curto prazo de alfa e não nos propulsores subjacentes de valor de longo prazo de suas companhias investidas. Esta cegueira quanto aos efeitos sobre a carteira segue uma visão defasada do dever fiduciário – uma visão que ignora a ciência, é baseada em uma teoria que era "moderna" na década de 1950, desconsidera os horizontes de tempo de membros ordinários e também ignora o dever legal de muitos investidores na renda variável intergeracional. Assim como já aconteceu anteriormente, provavelmente não haverá muitas consequências para os agentes fiduciários, que encolherão os ombros mais uma vez, dizendo: "O que eu poderia ter feito?".

É natural presumir que esta é uma responsabilidade de outros, mas, como já disse Christiana Figueres, nós somos estes "outros". A escolha – mercados financeiros verdadeiramente sustentáveis ou que se "siga como de costume", mas com alguns ajustes a mais ou a menos – está em nossas mãos.

 

Miguel Santisteve
é fundador e diretor presidente da Leaders Arena
miguel@leadersarena.global

Raj Thamotheram
é fundador e CEO da Preventable Surprises
raj.thamotheram@preventablesurprises.com


Continua...