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A EMPRESA E O INVESTIDOR DO FUTURO

Este mês aconteceu em São Francisco, EUA mais uma edição do PRI in Person simultaneamente ao Global Climate Action Summit ambos no período de 12-14 de setembro de 2018. Neste Summit foi estabelecido o compromisso do Estado da Califórnia emissão neutra de carbono e atingir 100% de energia limpa em 2045, com expectativas de alcançar essa meta antes, em 2035. Só para lembrar a Califórnia quase foi à falência com o colapso financeiro de 2008, tendo se recuperado e voltado à condição de 5ª economia do mundo, se fosse país.

Só para registro, durante o Summit, não foram poucas as pressões contra o desmatamento na Amazônia com o apoio de empresas globais como a Amazon.

Mesmo com as dificuldades dos últimos 10 anos, a Califórnia está cumprindo suas metas tendo havido uma redução de 13% em relação aos níveis de 2004, um pouco abaixo da meta estabelecida para 2020. Não é possível, dessa forma, minimizar o impacto desse acordo. Veja que adicionalmente, o Governo da Califórnia quer estabelecer medidas que não incentivem a produção de petróleo off-shore, autorizado pelo Governo Trump, em sua costa marítima.

Este é o quadro geral na Califórnia claramente orientado para a energia limpa. E nesse contexto, ocorreu o PRI in Person que iniciou o evento com a palestra de Al Gore que obviamente destacou o compromisso público e legal do governo da Califórnia na direção do carbono neutro. É difícil não considerar que empresas e investidores não sejam influenciadas por fato político, econômico e social.

Entre os temas discutidos, destacamos a opinião dos millennials, estratégias passivas e barreiras à integração ESG, a gestão de florestas. Neste conjunto temático ficou evidenciado a dificuldade de avaliação quantitativa das questões ESG e neste contexto, os millennials estão mais conscientes disso.

A adoção de estratégias passivas para índices padrão DJSI, ISE não foram valorizadas nos debates como benchmark para investidores responsáveis. Aliás, uma das questões mais destacadas no painel das estratégias passivas foi a integração dos fatores ESG ao dever fiduciário dos investidores e da adesão dos asset managers aos stewardship codes.

Entendi que se existem obstáculos relacionados aos interesses de retorno para os cotistas de assets e participantes de fundos de pensão então a educação financeira integrada à Integração ESG pode exercer um papel crucial na mudança de paradigma.

Temas como Desmatamento e riscos e oportunidades na América Latina mostraram de forma clara que o desmatamento tem de ser levado mais a sério e de que não podemos ignorar a repercussão em termos globais da retomada da exploração desorganizada da Amazônia. Em outras palavras, precisamos resgatar o princípio da preservação dos biomas brasileiros, em especial a Amazônia e o Cerrado, sendo esse um objetivo prioritário de políticas públicas. Como ressaltou Carlos Nobre em seu painel sobre “riscos climáticos além dos combustíveis não Renováveis: a Importância do gerenciamento de florestas“, a situação no Brasil exige iniciativas próprias que vão além metas brasileiras voluntariamente determinadas – NDC”. Por que o mercado de capitais não entra nesses temas de forma séria? É uma questão de atitude.

Quanto às iniciativas latino-americanas, ficou claro que o Brasil e a América latina espanhola têm enorme campo de negócios, um mundo de oportunidades que deverão exigir ações mais profundas no campo do desmatamento e do agro-negócios que são responsáveis por 2/3 das emissões de GHG no Brasil. O restante vem predominantemente do setor energético, do setor de construção civil e da infraestrutura urbana.

No Brasil, temos avançado muito nos fundamentos, “Relate ou Explique”, Stewardship Code da Amec, instituição do Laboratório de Inovação Financeira da CVM com apoio do BID e ABDE. Temos que subir um novo degrau que é do engajamento seguido de ações práticas. E essas ações passam pela ampliação dos investimentos em energias renováveis (sol, vento, oceanos, álcool, co-geração, etc), mobilidade urbana, transportes eficientes, redução do desmatamento e reflorestamento, gestão de bacias, agricultura sustentável, green buildings, logística reversa, reuso de água e mitigação da emissão do carbono na indústria-comércio-serviços, saneamento básico, bio-tecnologia, empreendedorismo orientado para aproveitamento de resíduos.

O Brasil é, de fato, um mundo de oportunidades. O futuro dos negócios passa também por aqui. Estou otimista que seremos a próxima onda, pois temos importância estratégica no contexto global.

Para isso é preciso que os investidores enxerguem os negócios além do objetivo imediato do retorno. É preciso entender qual o propósito do negócio. Há vários anos que artigos, teses e estatísticas mostram que no longo prazo empresas engajadas com fundamentos ambientais e objetivos sociais e uma governança orientada para stakeholders dão retorno no mínimo compatível com as exigências ortodoxas.

Bem chegamos ao ponto alto da Conferência.

Paul Polman, CEO da Unilever fez um brilhante discurso de encerramento enfatizando que investidores e empresas devem olhar exatamente para a Integração ESG como pilar das decisões de investimentos não apenas porque elas dão retorno, mas porque tem um propósito. Segundo ele, a visão unicamente voltada para o retorno está fazendo reduzir drasticamente a vida útil das empresas para abaixo de 20 anos, a vida de um CEO nas empresas está aumentando de 10 para 5 anos.

“Não é fácil, hoje em dia, ser um investidor, não é fácil dirigir um negócio. Como gerenciar um negócio não pensando apenas em seus clientes, em seus investidores, mas nas futuras gerações? Como ajustar as emissões de GHG para abaixo dos 2º? Quem não quer ser parte dos Objetivos de desenvolvimento sustentável? Descarbonizar, contribuir para a redução das desigualdades, contribuir para a igualdades de gêneros nas empresas? Quem não quer contribuir para erradicar a fome, a pobreza? Como resolver o problema de 850 milhões de habitantes. Basta eliminar o enorme desperdício de 30% existente na cadeia de alimentos. Porque as empresas estão fazendo isso. Precisamos descarbonizar o planeta. Como? Colocando um preço no carbono que produzimos. Veja os exemplos da China, da Califórnia. As companhias de seguro estão chegando à conclusão de que um aquecimento global acima de 2º gera um risco altíssimo para o setor. Estamos aqui para participar de mudanças que transformam. Mas para isso, nossas lideranças precisam pensar além de seus próprios interesses”.

Bem esses foram alguns pontos de sua palestra. Foi uma palestra inspiradora que faz subir a régua de exigências no processo de análise e decisão de investimentos.

Como disse antes o Brasil está muito bem na discussão dos fundamentos para a ação. Não podemos tapar o sol com a peneira sem reconhecer que o Brasil está arriscado a não cumprir as metas do Acordo de Paris caso continue a aumentar o desmatamento como se tem evidenciado nos últimos cinco anos. Mas prefiro a lente do otimismo que me permite enxergar a importância que o Brasil tem na solução global dos problemas e na redução das emissões de carbono.

O mercado de capitais brasileiro está atuando de forma proativa discutindo o dever fiduciário do investidor, debates das instituições do mercado através do LAB, várias outras iniciativas em curso. É preciso agir.

 Devemos sempre lembrar que a ciência econômica foi criada quando o mundo tinha em torno de 800 milhões de habitantes. Duzentos anos depois são 10 vezes mais. Isso é inédito na história dos “Homos”, requerendo assim um ajuste de fundamentos científicos. A finitude da terra requer maior atenção com a preservação do meio ambiente e com os objetivos sociais que representam o objetivo de todas as empresas, em um mundo a caminho de 9 bilhões.

Por isso, as empresas e investidores do futuro serão os protagonistas na solução dos problemas que nós criamos. Não foram os outros.

As empresas e investidores do futuro deverão considerar os fundamentos ambientais, objetivos sociais e uma governança moderna orientada para os interesses de todos os stakeholders e compreender a sua visão com relação aos objetivos de desenvolvimento sustentável como balizador dos investimentos e processo produtivo. O lucro é uma consequência.


Eduardo Werneck
é vice presidente da Apimec Nacional.
eduardo.werneck@apimec.com.br


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