Ponto de Vista

O COMBATE AO FALSO ETARISMO

O etarismo é o preconceito por idade menor ou maior, como presenciamos no caso recente de três universitárias que divulgaram um vídeo com deboches e ofensas à uma caloura com mais de 40 anos de idade. No contexto profissional devemos distinguir quando o etarismo, de fato, inibe o acesso ao mercado de trabalho, e quando tal dificuldade decorre de outros fatores. O falso etarismo aprisiona o profissional na crença de que perdeu competitividade comparativa unicamente em função de sua idade.

Com o aumento da longevidade da população, observamos o aumento do número de trabalhadores mais velhos disponíveis para o mercado de trabalho. Apesar de algumas empresas incentivarem a diversidade e fomentarem um ambiente de colaboração entre as diversas gerações, a discriminação etária é um problema real que precisa ser confrontado e transformado. No entanto, há situações quando a sentença de etarismo é turvada pela ambiguidade típica dos cenários mais complexos.

Por exemplo, no Brasil, cerca de 70% dos conselheiros de administração têm mais de 50 anos. Será que podemos afirmar que existe maliciosa articulação de conselheiros experientes que desacreditam a capacidade dos mais jovens e a deliberadamente excluem os profissionais com 20 ou 25 anos de carreira de oportunidades nos boards? Ainda que tal hipótese justifique o termo etarismo, há alternativas.

Poderíamos supor que o processo de formação de um conselheiro é intrinsecamente lento e que requer uma vasta experiência em cargos de alta hierarquia organizacional, além de uma maturação gradual de um extenso repertório de conhecimentos. Ou poderíamos considerar a hipótese, bem menos honrosa, de que profissionais mais experientes mantêm uma reserva de mercado ao excluir os mais jovens - não por preconceito etário, mas por classismo. Nestas situações seria infundada a classificação de etarismo, pois sustentaria uma falácia do motivo falso. Deixo para o leitor decidir sobre a correlação ou causalidade entre etarismo e a baixa proporção de jovens conselheiros de administração.

Também devemos reconhecer que algumas profissões valorizam o acúmulo de conhecimento, experiência transdisciplinar ou rara maestria na execução de tarefas especializadas, proporcionando aos trabalhadores mais experientes uma vantagem competitiva. Este grupo é composto, por exemplo, por médicos, filósofos, sacerdotes, pesquisadores e psicólogos – ocupações cuja excelência resulta dos muitos anos de prática e estudo, além de constante atualização. No mercado financeiro, o profissional de análise fundamentalista se enquadra nesta categoria, dominando o ciclo de negócios das empresas e as complexidades dos mercados. Aqui, a palavra-chave é experiência, e o etarismo é menos evidente.

Por outro lado, existem as funções com amadurecimento mais rápido, geralmente entre 5 e 10 anos atividade. Após esse período, há uma escassez de conhecimentos adicionais relevantes e os empregadores devem escolher entre profissional mais experiente e com performance incrementalmente melhor, e a entrega satisfatória de resultados do menos experiente, que normalmente recebe salário mais baixo. Muitos trabalhadores se enquadram nessa categoria, especialmente aqueles que ocupam cargos na base da hierarquia.

Diante da possibilidade de contratação de pessoas com menos tempo de profissão, as empresas frequentemente não enxergam vantagem em manter um profissional mais oneroso quando podem contratar outro mais barato, ainda que com desempenho um pouco inferior, pois sabe que seu amadurecimento será rápido. Nesse contexto, a atribuição de etarismo não é precisa, uma vez que leva à uma falácia do motivo falso, dado que a dificuldade de acesso ao mercado de trabalho não tem origem objetiva na diferença de idades.

O etarismo infundado resulta da falta de discernimento dos fatos, da limitação intelectual para articular assuntos complexos ou do simples desejo de agradar a opinião pública. Esta armadilha mental impede a autoavaliação imparcial e produz um diagnóstico incompleto ao desconsiderar fatores relevantes como a desatualização de conhecimentos, diferenças culturais, relação performance-custo, que não tem a ver como preconceito de idade. Sem jogar luz sobre este contexto mais amplo e complexo, o profissional deixa de identificar as ações necessárias para que recupere sua relevância de outrora e fica exilado na informalidade ou em atividades aquém de seu potencial.

Mais recentemente, com a aceleração da transformação digital, muitas das funções que já enfrentavam o desafio do excesso de mão de obra passaram a lidar também com digitalização dos processos. Esse impacto pressiona, por exemplo, os profissionais envolvidos em atividades que podem ser realizadas pelas soluções de RPA (Robotic Process Automation).

A capacidade de atualização é um importante fator de empregabilidade para os profissionais mais expostos à inovação tecnológica, e muitas empresas tendem a associar esta habilidade aos mais jovens, perpetuando a visão preconceituosa de que a idade é uma barreira para a adoção de novas práticas digitais. Isso leva à exclusão de profissionais mais velhos, que possuem experiência e habilidades valiosas, mas são estereotipados como menos adaptáveis às mudanças tecnológicas.

É importante ressaltar que essas correlações são gerais e que a situação de cada profissional e empresa é única. Uma análise personalizada é essencial para compreender como as múltiplas influências do complexo ambiente profissional impactam cada indivíduo.

Deixo meus votos e empenho para que, a partir do entendimento das sofisticadas relações transdisciplinares que impactam a empregabilidade de um profissional, as empresas, parte vigorosa da sociedade, caminhem na direção da valorização da diversidade etária.

Alexandre Oliveira, PhD, CCA
é Conselheiro de Administração com foco em Estratégias e Riscos da Transformação Digital. Membro da Comissão de Estratégia do IBGC, da Agroven (Smart Money for AgTechs) e CEO da Cebralog Consultoria. Doutor em IA nas Decisões Corporativas (Unicamp), pós-graduado Negócios Digitais (MIT) e em Finanças (Unicamp). Mestre em Supply Chain (Cranfield University).
oliveira.a@cebralog.com


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