Fórum Abrasca

EQUAÇÕES IMPOSTAS PELOS PRINCÍPIOS ESG DEFINEM PERENIDADE DAS EMPRESAS

Sustentabilidade é um tema que se impôs na agenda de prioridades da Abrasca nos últimos anos. O interesse crescente das associadas em participar dos inúmeros eventos promovidos para debater assuntos ambientais, sociais e de governança foi determinante, inclusive, para a entidade anunciar, em julho último, a criação da sua Comissão ESG. Cabe a essa comissão tratar de temas como riscos climáticos, métricas de avaliação, bônus ESG, inclusão e diversidade, entre outros.

As empresas entenderam que, neste novo milênio, sustentabilidade se tornou elemento chave na estratégia corporativa. Não se trata de uma questão de modismo, mas de uma exigência cada vez maior dos stakeholders em todo o mundo. Na verdade, a exigência pelo mercado de informação sobre sustentabilidade vinha em processo crescente nos últimos anos e se acentuou recentemente.

Cada vez mais os grandes investidores tomam decisões com base nessas informações como vem alertando há algum tempo Larry Fink, CEO da BlackRock, a maior gestora de ativos no mundo. Ele inclusive faz uma recomendação direta em sua última carta: as empresas devem ser precisas e detalhadas em seus relatórios ESG.

Os investidores querem entender os planos das companhias para lidar com diversos riscos, principalmente os ambientais, assim como metas de políticas sociais, que envolvem colaboradores, fornecedores, clientes e a comunidade onde atua.

Em 2020, só os fundos exclusivamente ESG aplicaram cerca de US$ 51 bilhões contra US$ 20 bilhões em 2019. Se forem consideradas as aplicações de fundos que utilizam algum critério ESG os valores devem chegar ao trilhão de dólares, avaliam alguns analistas. Portanto, são fatores que justificam a atenção cada vez maior das empresas por governança e crescimento sustentável.

As métricas
Evidentemente que a questão já foi entendida como relevante para os negócios das companhias. Na prática, porém, não é simples mensurar e relatar uma política de sustentabilidade. Por exemplo, as métricas ESG geram grandes questionamentos e discussões na comunidade internacional.

O assunto é tão complexo que no final do ano passado, a Fundação IFRS lançou uma audiência pública para saber se deveria criar um board específico para tratar das informações ESG nas demonstrações financeiras. A Abrasca participou ativamente dessa discussão e na carta enviada ao IFRS manifestou a opinião de suas associadas sobre a relevância da instituição adotar métricas de sustentabilidade para o relato das empresas. A proposta é reunir dados de forma estruturada que poderão ser auditados e comparados, o que será de grande valor para empresas e acionistas.

Por que essa questão de métrica é tão importante? Segundo alguns pesquisadores existem mais de 600 métricas circulando no mercado, o que confunde mais do que facilita. Portanto, há urgência em uma uniformização para que as companhias possam utilizá-las e permitindo comparabilidade.

A questão inclusive ganhou espaço no Fórum Econômico Mundial, realizado em setembro de 2020, quando as quatro grandes firmas de auditoria e contabilidade globais (EY, PwC, KPMG e Deloitte) divulgaram um conjunto de métricas baseadas em padrões já existentes. O objetivo foi o de tentar acelerar a convergência entre esses padrões de forma a permitir comparabilidade e consistência ao reporte sobre sustentabilidade.

As métricas sugeridas partem de padrões como o do Global Initiative Report, o GHG Protocol, o Sustainability Accounting Standards Board (SASB) e o Task-Force on Climate Related Disclosures (TCFD) e abordam princípios de governança, planeta, pessoas e prosperidade.

O “S” de ESG
As barreiras que as empresas têm que superar para se enquadrarem na agenda ESG não param por aí. No início de setembro, a Comissão ESG da Abrasca promoveu webinar para discutir o tema ‘importância de equipes plurais’. Os debates mostraram que, de alguma maneira, o setor produtivo avançou muito nos princípios ambientais e de governança e muito pouco nos temas ligados à dimensão social da sustentabilidade.

Esses pontos não são novos: foram pautados na ECO-92, conferência da ONU sobre o meio ambiente que ocorreu no Rio de Janeiro em 1992. Foi naquele momento que a comunidade internacional admitiu claramente que era preciso conciliar o desenvolvimento socioeconômico com a utilização dos recursos da natureza.

O grande desafio atual é a sustentabilidade social, o S de ESG. A dimensão social inclui diversidade de raça, gênero e formação. Essa questão não se resolve simplesmente cumprindo uma meta ou um percentual. O objetivo está muito além. Implica em mudar a cultura da empresa. A tarefa não é fácil principalmente na sociedade brasileira que foi estruturada com base em diferenças entre ricos e pobres, brancos e negros, letrados e iletrados.

O presidente do Conselho Diretor da Abrasca, Luis Henrique Guimarães, ao falar no webinar da Abrasca sobre o tema reconheceu que o processo de inclusão não é simples de desenvolver em uma companhia. Destacou que vivemos em uma sociedade machista e com um sistema hierárquico arraigado em todos nós por gerações. Portanto, o primeiro desafio, disse ele, é vencer a barreira dos padrões tradicionais.

Guimarães acredita que esta mudança trará um reflexo econômico relevante para as empresas. “Equipes plurais têm a possibilidade de encontrar soluções bem mais criativas que equipes compostas por membros de formação cultural ideias e valores similares”, destacou.

Materialidade
Evidentemente que quando se fala em relato de uma política é preciso considerar a materialidade, o que, no trinômio ESG, ainda é complexo. Os especialistas recomendam uma avaliação sincera sobre o processo de produção e a materialidade de seus eventos. Recomenda também um olhar mais atento para o que está ocorrendo agora com o clima: ondas de calor, geadas, secas e outros eventos climáticos no mundo já afetam os preços de alimentos e produtos com severos impactos sociais. Esses fatores, inclusive, fazem parte dos itens que explicam a alta da inflação no Brasil este ano.

Portanto os riscos, principalmente ambientais, quando se materializam se tornam difíceis de gerenciar e quantificar seus efeitos financeiros. Neste cenário, a discussão se enquadra em um contexto bem mais amplo, mas com um foco muito claro: a garantia de sobrevivência de uma companhia no longo prazo.

É com base nesse horizonte temporal que devem ser pautadas as discussões nos conselhos de administração. Estamos vivendo um processo de amadurecimento dos conceitos de gestão de riscos e sustentabilidade econômico-financeira. Os modelos de gestão com foco no retorno de curto prazo devem ser reconsiderados em prol de um novo, com foco na criação de valor no longo prazo para acionistas e demais stakeholders.

Eduardo Lucano da Ponte
é presidente executivo da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca)
abrasca@abrasca.org.br


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