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O EFEITO ESG NA ATRAÇÃO DE INVESTIMENTOS: A BIOECONOMIA DE MERCADO

O mundo tem consolidado os aspectos sustentáveis das atividades produtivas em múltiplas dimensões interconectadas, principalmente, nessa fase, as questões ambientais, sociais e econômicas formam um tripé-base. A inovação traduz essa transformação nos novos modos de produção e alternativas nas formas de geração de emprego e renda, sem desperdícios, por exemplo: o melhor aproveitamento da água, as energias renováveis, a preocupação da equidade nas relações de trabalho, associados a busca de ciclos virtuosos na economia.

O tema ESG – Environment, Social and Governance tem sido a agenda mais forte dos investidores internacionais diante das crises sanitárias e econômicas que rodam o Globo. Aprender com esse comportamento, antes muito forte entre os investidores institucionais, aderiu também a pandemia. Leitura obrigatória para a cooperação Estado-Mercado na construção de políticas públicas e atração de investimentos.

O resultado pode ser a Bioeconomia de Mercado, a revolução em curso ressalta as “ações tóxicas” e privilegia as ações ESG. A ciência e a inovação transformam também o mercado e revelam os novos entrantes investidores com preocupações na sustentabilidade do Ecossistema, tornando o mercado de capitais parte e um organismo vivo. Os investimentos, nessa mutação, desenvolvem mecanismos alternativos na seleção de carteiras contribuindo no acesso ao capital para o desenvolvimento de soluções corporativas que sejam sustentáveis Ambientalmente, Socialmente e na Governança.

A mudança de época, não é episódica, vem ocorrendo nos últimos cinquenta anos. A transformação tecnológica e agora digital aproximaram os ideários de preservação socioambiental das demandas do sistema econômico. Uma das criticas a preocupação ética das questões socioambientais nas corporações era o custo, inviabilizando a sua sustentabilidade econômica. A tecnologia trouxe recursos naturais abundantes, da condição de vantagens comparativas potenciais para vantagens competitivas efetivas. No caso, o vento e o sol nas energias renováveis (eólicas e/ou fotovoltaicas solares) criaram riquezas e possuem um menor impacto ambiental do que as energias fósseis. Mas, a origem desses debates, de décadas, se confunde na recente história econômica.

Em 1969, o homem chegava à lua, e, em 1971, os microprocessadores aterrizavam itos pela Intel. Um momento de queda do padrão ouro e alterações profundas no sistema financeiro internacional. A moeda passou a ter novo significado na fidúcia dos governos, “in god we trust”, no dólar americano e “Deus seja Louvado” até nossos dias no Real brasileiro. A energia fóssil, pelas guerras do Yon Kippur (1973) e Revolução Islâmica no Irã (1979) trouxeram os choques do Petróleo e um desequilíbrio na ordem mundial. Alterações profundas nas forças e deslocamento das riquezas.

Naquela época, em 1972, a Conferência de Estocolmo promovida pelas Nações Unidas discutia a necessidade de mudanças de atitude para a preservação do meio ambiente. Em 1982, era formada a Comissão Mundial sobre o Meio-Ambiente, Nairobi-Quênia. Seguida do Relatório Nosso Futuro Comum, com ênfase ao Desenvolvimento Sustentável.

Na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, o Brasil protagoniza a Eco-92, no Rio de Janeiro, estabelecendo a agenda 21, baseada na proteção Ambiental, Justiça Social e eficiência Econômica. Em 1997, foi assinado o Protocolo de Kyoto, o caminho Brasil-Japão, do contemporâneo ao respeito às tradições milenares, avançando nas questões do meio ambiente e dando início ao mercado de créditos de carbono.

No Auge da cooperação mundial pelos aspectos socioambientais, as Nações Unidas (2000) lançaram os 08 objetivos do Milênio. Em Johanesburgo (2002), na Rio+10, na cúpula mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável, a agenda se mostrava com um retrocesso. As prioridades talvez tivessem perdido o foco por uma sequência de crises, das crises asiáticas (1997) as crises Russa e Brasileira (1998 e 1999) até as das Bolha.com (2000), culminando com o 11/09 em 2001.

A Rio+20, a Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, reforça os compromissos assumidos no relatório o Futuro que queremos. As iniciativas sobre as questões do tripé se aprofundam em 2015 com a adoção da nova agenda de desenvolvimento sustentável e um acordo global sobre a mudança climática. O Economista norte-americano liberal Jeffrey Sachs, conselheiro das Nações e um dos principais autores, apresentou os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. No mesmo ano, foi assinado o acordo de Paris, com vigência a partir de 2020, substituindo o Protocolo de Kyoto.

A agenda Global para os Investimentos tem um epicentro de ações na Europa Ocidental, apoiada pela União Europeia. Não obstante, os mercados financeiro e de capitais ao redor do mundo tem aprofundado as preocupações com os aspectos ambientais, sociais e econômicos na seleção de investimentos. Nos Estados Unidos o índice de sustentabilidade do Dow Jones reflete essa jornada em busca das melhores práticas. O DJSIW avalia a performance financeira de corporações líderes em sustentabilidade globalmente. Segundo a Dow Jones & Company-DJ, “as empresas que constam deste Índice, indexado à bolsa de Nova Iorque, são classificadas como as mais capazes de criar valor para os acionistas, a longo prazo, através de uma gestão dos riscos associados tanto a fatores econômicos, como ambientais e sociais.”. O primeiro Índice foi lançado em 1999. Uma tendência de uma nova ordem mundial com alterações climáticas sérias, sem querer debater o tamanho das questões geocêntricas ou antropocêntricas da questão, aprofundadas nesse terceiro milênio. Como tem sido os retornos das carteiras Globais, de regiões ou de Países com relação a sustentabilidade? Realmente há criação de valor com a ética compreendendo esses princípios e valores morais e a mudança de comportamentos para os Investimentos?

A referência internacional pelo DJ oferece pistas sobre a evolução das carteiras teóricas dos índices de sustentabilidade vis-à-vis retorno e risco para se ter uma proxy da recompensa-variabilidade de Sharpe (1964), enfatizando o tema ESG Sustainability.

Tabela I - Indices de Sustentabilidade Vs Indices do Mercado

  Return Annualized Risk-
Adj Return
Proxy Recompensa-
Variabilidade
Indice Dow Jones 10Y 5Y 10Y 5y 10Y 5Y
Sustainability world index 6,23% 6,89% 0,41% 0,41% 15,20 16,80
Sustainability North America Diversified Select index 10,64% 8,84% 0,76% 0,53% 14,00 16,68
Sustainability Emerging Markets Diversified Select index -1,58% -3,02% -0,08% 0,09% 19,75 -33,56
Sustainability Asia/Pacific index 2,03% 1,10% 0,09% -0,05% 22,56 -22,00
Sustainability Europe index 3,94% -0,19% N/A -0,08% N/A 2,38
Sustainability Nordic index 5,44% 2,12% 0,36% 0,04% 15,11 53,00
Sustainability Korea index 4,89% 4,41% 0,04% 0,13% 122,25 33,92
             
Industrial index 10,31% 9,67% 0,74% 0,55% 13,93 17,58
 

Fonte: S&P DJ, Elaboração Própria. Nota: Os dados coletados tem data final em 18/08/2020.

Os prêmios oferecidos pela boa governança e a observação dos aspectos socioambientais, no longo prazo, caracterizado por um horizonte de 10 anos, se mostraram aparentemente superiores nas carteiras que atenderam os aspectos de sustentabilidade.

A relação é tratada com metodologias comparáveis. O prêmio é de acordo com a performance das carteiras sustentáveis e a carteira principal da Indústria no Estados Unidos. A avaliação não segue um rigor científico e serve somente como sinalização para a observação do tema ESG em diversas regiões do mundo.

Os retornos e riscos da carteira de um Índice Norte Americano de Sustentabilidade apresentaram resultados e recompensas a variabilidade próximos da carteira Industrial DJ. A maior recompensa-variabilidade é indicada no Índice da Korea de Sustentabilidade, talvez o tigre asiático se mostre com maior equilíbrio em seu desenvolvimento e possa ser considerado um benchmarking para as economias emergentes. Em todas as regiões do mundo representadas pelos indicadores de sustentabilidade, retornos em relação ao risco em 10(dez) anos se mostraram com prêmios positivos na avaliação da proxy recompensa-variabilidade.

A direção dos investidores internacionais para carteiras de investimentos com base na sustentabilidade parece uma tendência construída há décadas e sem volta.

O pequeno ensaio não é categórico na afirmação, mas oferece pistas importantes para os novos investidores de Renda Variável no Brasil. A formação das carteiras sustentáveis tem um apelo de longo prazo e são aderentes a formação de poupança para os investidores pessoa física que buscam uma proteção na vida pós-laboral, constituindo sua previdência.

A tabela formulada pela OCDE abaixo exemplifica a atenção em alguns pontos:

Tabela II - Exemplos de problemas de ESG e o seu efeito no valor da Empresa Ambiental, Social e de Governança

AMBIENTAL SOCIAL GOVERNANÇA
Questão: Alterações climáticas e
emissões de carbono
Questão: Relações comunitárias Questão: Pagamento executivo
  Risco de avaliação: futura regulamentação e tributação Risco de avaliação: falha na antecipação das tendências sociais, por exemplo, empresa alimentar não inova em linha com as preocupações
com a obesidade
  Risco de avaliação: estrutura de recompensa inadequada leva a más decisões a longo prazo
Questão: Risco de avaliação da poluição
atmosférica e hídrica
Questão: Normas laborais Questão: Divulgação
Risco de avaliação:multas Risco de avaliação:
Danos reputacionais
Risco de avaliação: risco de litígio se
não revelar riscos conhecidos do ESG
Questão: Risco de avaliação da gestão
de resíduos
Questão: Risco de avaliação do
recorde de saúde e segurança
Questão: estratégia fiscal
Risco de avaliação: Custo de produção Risco de avaliação: Acidente grave ou
produção interrompida
Risco de avaliação: impostos recuperados,
opinião pública leva a boicote

Na Governança, a disclosure (divulgação) de resultados, tem ocorrido da seguinte forma no ambiente brasileiro: o mercado de bolsa reúne cerca de 330 empresas, que construíram a entrada em Ofertas Públicas e ampla divulgação, em seguida, reportam a imprensa os resultados, nos sites corporativos e se apresentam em roadshows para investidores qualificados e, algumas, fazem reuniões com os Analistas de Mercado e Profissionais de Investimento. O modelo atende ao Novo Mercado, mas a inovação trará alternativas às formas de divulgação e públicos no conceito ESG.

O Quadro I, OCDE (2017) apresenta os efeitos de riscos e oportunidades a serem incorporadas e avaliados na análise do ESG em comparação com os modelos financeiros tradicionais, enfocando a base dados, a modelagem e as técnicas de avaliação dos ativos.

O Brasil está trazendo, com as taxas de juros mais baixas de sua história econômica, um contingente de quase 3(três) milhões de investidores pessoas físicas para um mercado que requer um aprofundamento na análise e seleção de suas carteiras. O investimento em empresas que buscam a responsabilidade corporativa com um olhar ético e moral para as ações nas dimensões Ambientais, Sociais e de Governança poderão produzir no longo prazo a sustentabilidade econômica e os retornos desejáveis. A B3, desde 2005, possui muitos índices com o Tema ESG, os principais: IGC NM-Índice de Governança Corporativa no Novo Mercado, ISE - Índice de Sustentabilidade Empresarial, ICO2-Índice Carbono Eficiente, podendo inclusive, os dois últimos, ser negociados por ETF - Exchange Traded Fund (fundos negociados em Bolsa).

A Bioeconomia de Mercado traz o conceito de economia circular para o Mercado de Capitais na busca de carteiras de investimentos que tragam com inovação a melhor utilização dos recursos naturais, menos desperdícios, equidade social e dentro das boas práticas da governança corporativa, sem deixar de se preocupar com a eficiência econômico-financeira das corporações. Um ambiente sustentável também para o Mercado de Capitais.

Quadro I – Dados, Modelagem e Avaliação (OCDE)

A análise do ESG complementa, portanto, a análise financeira e pode ser considerada uma componente de investimento fundamental, pelo que os investidores tentam modelar todos os impulsionadores do desempenho financeiro de uma empresa. No entanto, nem sempre é fácil compreender os efeitos dos riscos e oportunidades do ESG a nível da empresa de modo a que estes possam ser incorporados em modelos financeiros típicos:

• Disponibilidade de dados: a análise de investimento é limitada pela divulgação corporativa, que é variável em qualidade e âmbito, embora os dados ESG corporativos estão cada vez mais disponíveis de fornecedores como a Thomson Reuters e a Eiris. É também limitada pela compreensão dos investidores sobre esses dados e quais as métricas relevantes para um determinado caso de investimento – uma empresa de fast food será mais vulnerável a riscos sociais, tais como requisitos para melhorar a remuneração dos trabalhadores (que poderia cristalizar-se a curto prazo) enquanto um produtor de petróleo é mais vulnerável a riscos físicos a longo prazo associados a danos ambientais. O sector privado e os decisores políticos estão num esforço considerável para chegar a um consenso sobre o grau e o tipo de divulgação das empresas.

• Modelagem: Os fatores ESG não podem necessariamente ser integrados nos modelos financeiros tradicionais, uma vez que nem sempre têm um impacto financeiro a curto prazo. Além disso, a maioria dos modelos de analistas financeiros extrapolam a partir de dados históricos, o que pode ser menos relevante para a previsão de futuros resultados relacionados com o ESG. Por exemplo, medir o passado e a atual pegada de carbono de uma empresa não dá tanta informação sobre a sua avaliação futura como compreender a sua estratégia de redução da sua intensidade de carbono. Da mesma forma, é difícil estimar a viabilidade ou o impacto de uma inovação tecnológica inovadora baseada em padrões históricos. Notavelmente, muitos modelos ESG focam-se nos riscos, há menos ferramentas para avaliar o desempenho positivo do ESG.

• Técnicas de avaliação: os investidores de capital podem ajustar avaliações corporativas para fatores ESG de várias maneiras. Os investidores poderiam variar a taxa de desconto aplicada aos futuros fluxos de caixa das empresas – o que levanta a questão de saber até que ponto deve ser aplicado um desconto a vários tipos de risco ESG. Em alternativa, poderiam aplicar múltiplos mais altos ou mais baixos a rácios de avaliação como Preço/Ganhos ou Valor Contabilístico – o que pode levar a uma contagem dupla se os fatores ESG já estiverem parcialmente cotizados pelo mercado.

Célio Fernando B. Melo
é economista, Mestre em Negócios Internacionais (UNIFOR), Doutorando em Relações Internacionais (ISCSP/UL). Sócio-Diretor da BFA Assessoria em Finanças e Negócios.
celio.melo@bfa.com.br

 
 

Continua...