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Ponto de Vista

ESTATAIS EM BOLSA: DISCIPLINAR, EXTINGUIR OU PRIVATIZAR?

Várias são as definições para Empresas Estatais, as quais, curiosamente, variam segundo posições ideológicas. Enquanto para alguns basta uma participação mínima ou até mesmo a percepção de algum benefício para que seja alardeada a “indevida intromissão do Estado voraz”, para outros a pureza que revestiria tais organizações exigiria, senão a totalidade, pelo menos uma maioria bem superior aos 50% plus.

Entretanto, a mais eloquente defesa da existência de Empresas Estatais fundamenta-se em seus propósitos. As Estatais serviriam para propósitos que, pelo risco envolvido ou pelo longo tempo de maturação, não encontrariam por parte do mercado investidor a necessária receptividade, aí inclusos objetivos de cunho social, regional, científicos e outros. Trata-se, portanto, de uma relação tumultuada e passível de discussão: disciplinar, extinguir ou privatizar?

Por outro lado, a Bolsa é o local de convergência de investidores os quais, obviamente, buscam retorno para seus recursos aplicados. Isto, porem, não é suficiente para a análise do porque a relação é tumultuada. Cabe considerar dois aspectos fundamentais: Tempo e Governança. No tocante ao Tempo, sem dúvida, o mercado investidor estabelece suas limitações e estas sempre se traduzem na expectativa de maior remuneração, o que pode ser totalmente inviável. Assim, se um projeto sinaliza um longo tempo para que ofereça retorno, dificilmente encontrará muitos investidores interessados e aqueles que motivar não poderão nunca ser considerados de excessiva cupidez.

Porem, é na Governança que reside a maior fonte de divergência. O mercado pode até aceitar que uma Empresa Estatal, pela natureza de sua atividade trabalhe com distante horizonte de maturação, pode, igualmente, aceitar que o governo tenha confortável controle da gestão, mas, cada vez mais, mostra-se rebelde e hostil à falhas de Governança, traduzidas, sobretudo, pela falta de informações fidedignas e submissão a ditames políticos. Seria, assim, uma incoerência total a presença de Empresas com algum grau de participação do Estado na Bolsa de Valores? Um juízo ligeiro poderia até concordar. Mas, a realidade dos fatos é mais complexa e encontra históricos amplamente distintos.

O Valor Econômico publicou em 15/10/2015 uma matéria denominada “Lupa nas Estatais” mostrando que nenhuma das 10 companhias abertas listadas no IBrX-100 cumpre os requisitos mínimos estipulados pelo novo Programa de Governança da Bolsa. São elas: Banrisul, BB Seguridade, Banco do Brasil, Cemig, Cesp, Copasa, Copel, Eletrobras, Petrobras e Sabesp. O programa tem a finalidade de contribuir com a restauração da confiança entre investidores e companhias estatais, estremecida por conta da operação Lava-Jato.

Veja a seguir, o que o nosso acervo de dados tem a mostrar sobre a evolução do Retorno do Acionista – ROE (%) e do Endividamento Líquido (R$MM) das 10 estatais do IBrX-100 no período de 10 anos (2006 a 2015), alertando que Cemig e Eletrobras não publicaram balanço até o fechamento desse artigo:


ROE (%) e Endividamento Líquido (R$MM) das Estatais do IBrX-100 - de 2006 a 2015


Fonte: SABE


Com relação ao ROE (retorno do acionista): Eletrobras e Petrobras tiveram na média dos últimos 10 anos retornos negativos para seus acionistas. Cesp, Copasa e Petrobras tiveram em 2015 retornos negativos por conta dos prejuízos. BB Seguridade e Cemig se destacaram apresentando elevados retornos em 2015 e 2014, respectivamente, acima das médias históricas.

Com relação ao Endividamento Líquido o retrato da situação dessas estatais é bastante dramático, a exceção da Cesp que reduziu sua dívida no período. Na média, essas empresas tiveram um crescimento (CAGR) do endividamento líquido próximo a 16 % ao ano nos últimos dez anos, bem acima da inflação. Os números também revelam preocupação quanto a situação de Banrisul, BB Seguridade, Banco do Brasil, Copasa e Petrobras que cresceram suas dívidas numa taxa anual composta (CAGR) de mais de 15% ao ano.

O gráfico a seguir apresenta a valorização das cotações das ações das estatais (exceto BB Seguridade que iniciou em 2013) em bolsa do 1º Trim/2011 a 30/Mar/2016. Destaque positivo para BB Seguridade ON e Sabesp ON que cresceram 89% e 69%, respectivamente, nesse período. Todas as oito demais ações das estatais sofreram desvalorização no mesmo período, destacando Petrobras PN e Eletrobras ON que caíram 66% e 64%, respectivamente. A título de referência o Ibovespa teve queda de 27% no mesmo intervalo de tempo.


Valorização das Ações das Estatais do IBrX-100 de 1º Trim/2011 a 30/Mar/2016.


Fonte: APLIGRAF - Elaboração: SABE


Comentãrios Finais

Face ao exposto, torna-se fácil perceber que conflitos e divergências surgem menos do percentual de participação do governo e mais, muito mais, da carência e distorção das informações e, especialmente, da governança implementada.

Estatais cujos propósitos foram aceitos e respeitados, porem, cujos prazos de maturação tenham sido sucessivamente postergados e os resultados pretendidos jamais alcançados não deveriam ensejar uma forma de recesso?

Já aquelas bem sucedidas, rentáveis e amadurecidas, não deveriam ser objeto de alguma obrigatoriedade de privatização, mesmo preservando uma posição minoritária ou algum tipo de Golden Share?

E as outras cujo propósito é indiscutivelmente atraente, porem, que falham seguidamente na consecução de resultados como decorrência da patologia de governança, entenda-se ações nefastas do controlador estatal, não deveriam ser simplesmente extintas, abrindo espaço para um recomeço em mãos privadas, já que, nestes casos, a privatização seria um exercício oneroso e não-atingível?

Enfim, é ilusório imaginar-se no Brasil uma Bolsa de Valores despida de organizações estatais, contudo, cada vez mais consagra-se o repudio à organizações com participação do Estado que, vivendo em um passado não distante, considerem-se com a prerrogativa de tomar decisões e implementar ações sem informar e respeitar o mercado investidor.

Com entusiasmo acolhemos o novo Programa de Governança da Bolsa e torcemos pelo seu sucesso.

Nota: Este artigo contou com a colaboração de Ruy Flaks Schneider, sócio-diretor da Schneider & Cia. ruyschneider@schneidercia.com.br


Luiz Guilherme Dias
é sócio-diretor da SABE Consultores. Consultor de Empresas e Conselheiro Certificado.
Lg.dias@sabe.com.br

 

 


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