Fórum Abrasca

EMPRESAS ESTÃO BUSCANDO NOVOS CAMINHOS PARA SE CAPITALIZAR

Diante de inúmeras regras e um complexo sistema de prestação de informação, captar recursos via ações no Brasil está cada vez menos atrativo.

A Comissão de Valores Mobiliários divulgou a Agenda Regulatória para 2020 com a proposta de analisar vários temas, entre eles o regime informacional das companhias abertas, um dos pleitos da Abrasca à Autarquia. A CVM também prevê reformar três outras instruções que foram objeto de pleitos da associação: a Instrução 308, que prevê o rodízio obrigatório da firma de auditoria independente; a Instrução 481, que regulamenta o voto a distância em companhias abertas; e a revisão do arcabouço de ofertas públicas.

Esses temas estão inseridos há três anos no projeto estratégico desenvolvido pela Abrasca com objetivo de reduzir o custo de observância das companhias abertas. As propostas foram apresentadas à CVM ainda em 2018.

Desde 2017, estamos empenhados com essas propostas de simplificação, que consideramos relevantes e urgentes. É notória a redução do número de companhias listadas na B3, mesmo diante da queda expressiva das taxas de juros e da saída do BNDES como financiador de projetos de longo prazo. Evidentemente que o cenário político pesa nesta decisão, mas como ele é transitório, o determinante são os custos associados ao processo de listagem no Brasil.

Algumas companhias, inclusive, estão optando por realizar ofertas primárias de ações no exterior. O caso mais recente foi a XP que escolheu a Bolsa americana Nasdaq para realizar sua IPO. Foram duas as razões alegadas pela diretoria da empresa ao tomar a decisão: ambiente mais propício em termos de regulação e possibilidade obter um volume maior de recursos. A XP conseguiu captar US$ 2,25 bilhões.

Isso significa que o Brasil e o mercado de capitais começam a registrar prejuízos em função das regras rígidas exigidas das empresas e do mercado. Mesmo com tudo isso, a B3 anunciou, no início de janeiro, que irá cobrar tarifas dos investidores sobre o recebimento de dividendos e JCP. E o governo, por sua vez, estuda taxar esses benefícios. Todos esses fatos culminam em grande desestímulo ao empresário e ao investidor.

Em 2018, a Abrasca publicou em seu Anuário Estatístico estudo exclusivo, assinado pelos professores Carlos Rocca e Lauro Modesto, do Centro de Estudo do Mercado de Capitais da FIPE, mostrando que, em 10 anos, o mercado de capitais brasileiro tinha potencial de dobrar o número de companhias abertas listadas na B3. Para realizar a simulação eles tomaram como base a evolução dos principais indicadores de mercado em 2017, que evidenciava forte resposta positiva à queda da taxa de juros e redução da oferta de crédito subsidiado do BNDES.

No final de 2019, o País registrava uma das menores taxas de juros de sua história e o BNDES tinha realmente alterado sua política de financiamento. O mercado, porém não apresentou a resposta esperada. As empresas estão descobrindo caminhos mais vantajosos, como abrir o capital no exterior ou captar recursos, por meio de uma subsidiária de capital fechado, via debêntures ou outros títulos de renda fixa. Qual a razão desta “segunda via”? Tudo indica que o cerne dessa questão são as regras obsoletas e as restrições que afastam as empresas e os investidores do mercado.

A Abrasca vem trabalhando há três anos, com apoio da CVM e da B3, no projeto [abertas+SIMPLES], que objetiva simplificar a prestação obrigatória de informações pelas companhias abertas, racionalizando o processo de maneira global e eliminando repetições, redundâncias e dados de menor relevância. O diagnóstico foi realizado com base em uma série de entrevistas com profissionais das áreas de relações com investidores, contabilidade e jurídica das nossas associadas.

Essas entrevistas geraram várias propostas de simplificação nos diversos formulários exigidos das companhias abertas. As sugestões foram agrupadas em quatro tópicos:

  1. Fiscalização e Controle;
  2. Ofertas Públicas;
  3. Representação Acionária; e
  4. Prestação Obrigatória de Informações.

Uma das propostas para simplificação do Tópico IV é a adoção do modelo europeu de prestação de informações intermediárias. Ou seja, DFs semestrais completas em junho e dezembro e somente release de resultados, nos 1º e 3º trimestres do ano. Em nossa avaliação, este modelo vai reduzir custos e, principalmente, melhorar a qualidade das informações.

Nas entrevistas que foram realizadas, os profissionais das empresas apontaram também para o desperdício de tempo com o preenchimento dos formulários tanto pela sua complexidade quanto pelas deficiências tecnológicas.

Como se trata de um aspecto muito relevante na proposta de simplificação e não houve compromisso da B3 nem da CVM de reformar o sistema eletrônico de prestação de informação, a Abrasca desenvolveu o E.NetBot: sistema de automatização do preenchimento dos formulários exigidos pela CVM. O desenvolvimento foi concluído ainda em 2019 e passa por teste de avaliação por um grupo de empresas selecionadas. Em breve, a ferramenta será disponibilizada aos associados da Nova Abrasca. A iniciativa vai reduzir o custo de observância das companhias, o tempo gasto na elaboração desses formulários e melhorar a qualidade da informação na medida em que elimina redundâncias.


Alfried Plöger
é presidente do Conselho Diretor da Associação Brasileira das Companhias Abertas (ABRASCA)
abrasca@abrasca.org.br


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