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AMAZÔNIA: UM PROJETO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Recentemente, dia 19 de setembro, houve no Congresso Nacional uma reunião da Comissão Mista sobre Mudanças Climáticas. O número de participantes esteve aquém do desejável para um tema tão importante como a integração da natureza à atividade econômica. Somos pródigos em discutir questões econômicas como Previdência, Reforma Política, Reforma do Estado, que inclui privatização e a qualidade da intervenção na economia, a discussão de um novo pacto federativo que contempla também a reforma da estrutura tributária e outros assuntos de interesse regional. A pergunta que fica é: quando vamos discutir a relação da economia e da sociedade com o meio ambiente. Que estrutura econômica e social devemos construir para estabelecer essa integração? Qual o papel da educação, academia, da ciência e da tecnologia, do setor produtivo e do mercado financeiro de capitais?

Estamos fazendo ilações e perguntas sobre a integração econômica da Amazônia Legal, uma região que representa 59% do território brasileiro igual a 5,1 milhões de km2. Esta região é composta pelas áreas dos Estados de Amapá, Pará, parte dos Estados do Maranhão, Tocantins e Mato Grosso além de Rondônia, Amazonas, Acre e Roraima. O excedente, Mato Grosso do Sul, Goiás, a outra parte do Maranhão, Mato Grosso e Maranhão, além do Nordeste, Sudeste e Sul representam uma área de 3,4 milhões de Km2, uma área pouco superior à Índia.

No quadro abaixo apresentamos a população de cada uma dessas regiões de acordo com os dados do IBGE (2018) e da ONU (2018). Mostramos ainda dados estimados para São Paulo e Japão baseados nas mesmas fontes.

Região População
(milhões hab.)
Território
(milhões km2)

PIB
(US$ trilhões)

Amazônia Legal 22,5 5,1 0,16
Outra parte do Brasil 187,5 3,4 1,8
São Paulo 44 0,25 0,65
Índia 1.343 3,3 2,8
Japão 127 0,34 4,8

O Brasil sem a Amazônia cairia de 5º país mais populoso do mundo para 7º, mantendo-se acima de Índia e Argentina. O que esses dados revelam é que, do ponto de vista econômico e populacional, não existe correlação entre extensão territorial e PIB. A população da Índia é 7 vezes superior ao “Brasil sem Amazônia Legal” e o PIB já é 1,5 superior. O Japão tem uma extensão territorial 55% maior que São Paulo e um PIB 7 vezes superior. A população da Amazônia legal é metade de São Paulo, etc.

Está evidente que também extensão territorial não é fundamento para o crescimento do PIB brasileiro, mesmo que sejam equacionadas as questões fiscais, previdenciária e tributária, sem levar em consideração as características de cada região constante da tabela acima. Mesmo que dobremos a renda per capita da população da região, o efeito sobre o PIB nacional seria de 8% sobre.

O problema é mais complexo. Para a ocupação de 187 milhões de habitantes destruímos 90% da mata atlântica e, para atender a interesses agropecuários e de extração madeireira ilegal, estamos caminhando para o desmatamento de 20% da Amazônia legal com foco no sul do Pará, parte do Maranhão, parte do Mato Grosso e Rondônia. Não podemos ir além disso. Abrir caminho para fazer com a Amazônia Legal o que foi feito com a Mata Atlântica iremos destruir a agricultura brasileira e uma estrutura biológica única. Somos a maior floresta tropical do mundo, com a maior biodiversidade do mundo e devemos continuar sendo, se possível recuperando parte do que foi desmatado.

O Brasil sempre foi um país de florestas e diversidade natural. Optamos historicamente por destruir valor de biodiversidade para construir, de forma extensiva, um modelo de desenvolvimento dependente da agropecuária. Conseguimos estar entre os dois maiores produtores do mundo de soja em 50 anos. A produção de gado bovino é de 205 milhões, 1 boi per capita, estando o Brasil entre os maiores exportadores de proteína animal do mundo.

Devemos entender que cada bioma natural tem características que devem ser preservadas. Isso implica em explorar a Amazônia respeitando os princípios da auto renovação de suas características.

O Brasil pode crescer, desenvolver-se sem desmatar mais florestas, pois o Japão com uma área 50% superior a São Paulo alcançou um PIB 2,4 vezes superior ao do Brasil. O desmatamento atual que estamos vivenciando, na faixa de 7.500 km2, está se descolando da mínima histórica de 4.500 km2, mas está longe do pico de desmatamento dos anos 90 do século XX e primeiros anos do século XXI, que superou 25 mil Km2. A situação se internacionalizou e está chamando a atenção porque a fumaça chegou a São Paulo de forma atípica e também por causa do ativismo das novas gerações. Prestem atenção ao fenômeno Greta.

Analisando o desempenho fiscal dos investimentos do governo que alcançaram, até Julho 19, R$21.451 milhões, o resultado do Ministério do Meio Ambiente foi de 0,25% desse total. Por outro lado, a Política Ambiental no Ministério da Economia contempla em sua agenda de sustentabilidade:

a) Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia – PPCDAM;
b) Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e das Queimadas no Cerrado – PPCerrado;
c) Condicionantes ambientais para o crédito rural;
d) Bolsa Verde – concessão de incentivo financeiro aos proprietários e posseiros;
e) Pronaf Sustentável;
f) Política Nacional de Pagamentos por Serviços Ambientais – PSA;
g) Protocolo Verde; e
h) Acordo TFCA – Tropical Forest Conservation Act.

Todas essas ações dizem respeito à Amazônia mostrando que economia e meio ambiente estão iniciando um processo de interação (ainda não devo chamar de integração). Na realidade, o que devemos considerar é o princípio da inserção da sociedade no meio ambiente invertendo as crenças filosóficas que marcam nossas condutas desde o século XVII.

Ainda no contexto da participação do Governo foi aberta uma negociação para obtenção do selo verde inicialmente para projetos de ferrovias. Acredita-se, portanto, em uma solução para captação a juros mais baixos, no mercado institucional e internacional. Se o CBI considera o Brasil o maior mercado da América Latina, o que podemos prever com a criação no longo prazo de um projeto sustentável para uma região densamente florestada de mais de 5 milhões de km2?

Para isso, não podemos prescindir de recursos e o Fundo Amazônia faz parte desse conjunto de fontes, já tendo formado uma história de 9 anos gestão e conhecimento. Representa a tentativa de um turning point em termos de estabelecimentos de fontes de financiamento, neste caso, a fundo perdido, reforçando o papel do Banco da Amazônia na região.

Nunca será demais reiterar que uma região com área superior a 5 milhões exige recursos para construir uma infraestrutura que não signifique simplesmente desmatamento. Será importante a compensação florestal. Aliás o reflorestamento de floresta nativas tem sido uma tendência. Vejam o exemplo da China, com um ambicioso projeto de plantio de árvores atingindo, em 2018, quase 23% de cobertura vegetal. A Índia, com uma área inferior ao Brasil ex-Amazônia, está investindo fortemente em reflorestamento. A Índia também um objetivo audacioso de alcançar 1/3 de território com cobertura vegetal e 1,4 bilhão de habitantes.

Finalmente, temos de valorizar a base científica e tecnológica desenvolvida com foco na Amazônia, o que ainda é insuficiente. Institutos e Fundações como Imazon (privada), Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia - INPA e Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - INPE (públicos), Map Biomas (privada), Instituto clima e Sociedade – ICS (privada), Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, etc.

Um Projeto de Sustentabilidade deve considerar:

  1. Conhecimento da região da qual conhecemos muito pouco.
  2. Conhecimento social dos vários grupos sociais, dos vários padrões de comportamento econômico e da natureza amazônica que tem vários biomas.
  3. Consolidação da base científica e tecnológica para formação desse conhecimento.
  4. Desenvolvimento dos potenciais de exploração renovável que beneficiam a indústria de cosméticos, farmacêutica, agro negócio e o potencial de desenvolvimento científico e tecnológico.
  5. Desenvolvimento de uma infraestrutura adequada às características da região que viabilize o aproveitamento sustentável dos recursos.
  6. Desenvolvimento de uma cultura de agregação de valor que vá além da mera extração dos recursos naturais renováveis.
  7. A manutenção dos recursos minerais como reserva estratégica para exploração depois de um período suficiente de formação de conhecimento para exploração de recursos não renováveis e com alto potencial de geração de resíduos na região. Lembremos que a bacia amazônica é a maior do mundo. O Projeto Hydra já mostrou o que acidentes com resíduos tóxicos podem fazer na região.

Vejam que a palavra mais citada é conhecimento e a partir dele será possível a inserção do ambiente amazônico, de forma responsável, na economia brasileira. O Brasil precisa de educação, ciência e tecnologia. Precisamos parar de extrair recursos e exportação em forma bruta. Reiterando o pensamento de uma das referências da climatologia no Brasil Carlos Nobre, pesquisador do INPA e do INPE, é fundamental o estabelecimento de uma indústria de beneficiamento que agregue valor na própria região, a partir da ciência até o ambiente social e de negócios.

A Natura já está na região, reforçada pela compra da Body Shop, uma empresa cuja CEO vinha com frequência à Amazônia e tinha uma relação muito forte com as comunidades locais. Um passeio à história do Brasil mostra de um lado uma exploração indiscriminada de suas florestas, mas revela, por outro lado, um grande interesse de pesquisadores estrangeiros pela diversidade brasileira.

A verdade é que temos de ser humildes e aprender sempre a trabalhar junto com a natureza e os nativos da região e não contra eles. Esse é o princípio básico da sustentabilidade. O sistema econômico no Brasil tem de seguir os passos da Natura para sobreviver e crescer na Amazônia.

Existe um caminho enorme passa ao largo do “El Dorado” que pode servir de base para a encubação de startups, micro e pequenas empresas até chegar à formação de uma economia robusta na região, com o desenvolvimento de novas empresas padrão Naturas no Brasil, que tem valores baseados em uma economia circular e não unicamente na busca de minérios.

Basta 137 mil Km2 para construirmos, metaforicamente falando, “um novo Japão de riquezas na Amazônia”, pelo menos um “São Paulo”. 

Eduardo Werneck
é vice presidente da Apimec Nacional e sênior advisor da Resultante.
Nota: Este artigo expressa a opinião do autor.
eduardo.werneck@apimec.com.br


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