Em Pauta

PROCURA-SE PROFISSIONAIS DE RI

Diante do novo boom de IPOs, aumenta a demanda por profissionais de Relações com Investidores (RIs) - a partir das crescentes atribuições e responsabilidades desses profissionais na linha de frente das companhias, tornando a área de RI cada vez mais estratégica.

Cadê os RIs? Onde estão? Basta fazer algumas pesquisas no Google, nos sites das companhias, no LinkedIn, além de conversar com headhunters e consultorias de recrutamento e seleção para ver que existe uma série de ofertas de vagas nas áreas de Relações com Investidores. Há posições abertas para - desde estagiários, analistas, passando por coordenadores, gerentes, chegando até diretores.

O fato é que de 2014 até o final de 2019, o segmento ficou praticamente parado, com baixíssima mobilidade de profissionais, por conta do período de recessão, de economia fraca e das altas taxas de juros – que vieram caindo mais recentemente. Assim, as empresas mantiveram seus departamentos de RI enxutos e houve um hiato na formação de novos profissionais.

Mas, desde o início de 2020 houve uma reviravolta e o mercado de trabalho dos RIs ficou bastante agitado. Apesar da crise causada pela pandemia do Coronavirus, veio uma onda de IPOs. A queda da Selic - chegando ao seu menor patamar histórico - estimulou um fluxo recorde de investidores pessoa física para a Bolsa, tornando o mercado mais atraente para empresas se capitalizarem. Somado a isso, os IPOs foram favorecidos pelo cenário de liquidez global, pelos investimentos estrangeiros, que retornaram com mais vigor à B3 no final do ano passado – e mesmo com o cenário atual de preocupações com ingerência política nas estatais, o saldo dos “gringos” seguia positivo no ano até o fim do mês passado.

Em 2020, 28 companhias estrearam na Bolsa, registrando uma captação total de mais de R$ 117 bilhões. Foi o maior número desde o boom de 2007, com 64 aberturas, que levantaram juntas mais de R$ 55 bilhões, sendo que dessa leva de 2007, apenas 36 permanecem listadas na Bolsa até hoje.

Somente nos primeiros dois meses deste ano, foram 15 IPOs - CSN Mineração, Eletromidia, Orizon, OceanPact, Cruzeiro do Sul Educacional, Westwing, Bemobi Tech, Focus Energia, Jalles Machado, Mobly, Mosaico, Intelbras, Espaçolaser, Vamos e HBR Realty, que captaram mais de R$ 25 bilhões. E a fila para novas aberturas é grande. Segundo dados do final de fevereiro, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) tinha sob análise 38 pedidos de IPOs protocolados.


IPOs de 2007 - companhias que continuam listadas até hoje

Companhia   Ticker   Data do
1o. dia de negociação  
 Valor de mercado R$ (000)
no dia da Oferta
 
Valor de mercado
R$ (000) em 24/02/2021  
Prêmio Vs Ibovespa (da Oferta até 24/02/2021) em %
Eneva ENEV3 14/12/2007 4.840.975 21.674.316 -173,69
Banco Pan BPAN4 19/11/2007 1.813.056 17.123.847 -4,06
BR Brokers BBRK3 29/10/2007 1.509.967 153.137 -176,81
Helbor HBOR3 29/10/2007 559.192 1.190.265 -73,67
Lojas Marisa AMAR3 22/10/2007 1.339.032 1.443.469 -121,88
Trisul TRIS3 15/10/2007 550.077 1.871.331 94,53
Sul America SULA11 5/10/2007 2.769.437 14.454.439 631,61
Duratex DTEX3 21/9/2007 1.196.728 12.616.549 100,33
General Shopping GSHP3 30/7/2007 420.000 92.829 6.813,53
Yduqs YDUQ3 28/7/2007 1.768.163 9.472.646 375,55
Multiplan MULT3 27/7/2007 3.006.650 11.791.614 84,1
Springs SGPS3 27/7/2007 1.197.095 330.000 -205,64
Abc Brasil ABCB4 27/9/2007 1.231.797 3.507.478 85,12
MRV MRVE3 23/7/2007 2.444.884 8.448.636 185,9
Triunfo Part TPIS3 23/7/2007 1.112.737 327.928 -174,04
Minerva BEEF3 20/7/2007 1.017.500 5.332.677 -133,06
Tegma TGMA3 3/7/2007 1.492.062 1.538.326 -56,55
Marfrig MRFG3 29/6/2007 3.408.067 10.304.200 -122,44
Eztec EZTC3 22/6/2007 1.100.006 7.502.350 483,94
Log-In LOGN3 21/6/2007 863.557 1.683.967 -186,7
SLC Agrícola SLCE3 15/6/2007 945.000 7.702.743 638,47
Viver VIVR3 6/6/2007 905.660 108.673 -217,57
Wilson Sons WSON33 30/4/2007 1.691.093 3.185.306 70,13
CR2 CRDE3 23/4/2007 615.160 52.754 -79,4
Metalfrio FRIO3 13/4/2007 473.271 308.007 -85,51
Fertilizantes Heringer FHER3 12/4/2007 622.455 282.751 -214,83
JHSF JHSF3 12/4/2007 2.773.342 4.637.672 -123,99
BR Malls BRML3 5/4/2007 1.502.373 7.424.806 -38,25
Even EVEN3 2/4/2007 1.058.101 2.169.939 -128,03
Pine PINE4 2/4/2007 1.369.882 325.947 -216,58
JBS JBSS3 29/3/2007 5.600.000 68.916.026 107,54
Sao Martinho SMTO3 12/2/2007 2.205.277 11.610.492 356
Iguatemi IGTA3 7/2/2007 1.757.361 5.775.427 37,65
Tecnisa TCSA3 1/2/2007 1.300.000 578.645 -250,16
RNI RDNI3 31/1/2007 498.716 416.122 -191,78
PDG Realty PDGR3 26/1/2007 1.116.864 44.766 -258,47

Fonte: Economática


Série de IPOs 2020 e 2021*

Companhia Ticker Data do 1o. dia
de negociação
Valor de mercado R$ (000)
no dia da Oferta
 Valor de mercado R$ (000) em 24/02/2021 Prêmio Vs Ibovespa
(da Oferta até 24/02/2021) em %
CSN Mineração CMIN3 18/2/2021 47.525.592 51.159.902 11,54
Eletromidia ELMD3 17/2/2021 2.413.795 2.344.675 0,29
Orizon ORVR3 17/2/2021 1.572.999 1.560.844 2,38
OceanPact OPCT3 12/2/2021 2.183.017 2.169.312 2,42
Cruzeiro do Sul Ed. CSED3 11/2/2021 5.345.511 5.135.509 -1,59
Westwing WEST3 11/2/2021 1.423.198 1.333.427 -3,97
Bemobi Tech BMOB3 10/2/2021 2.000.000 2.419.091 24,14
Focus Energia POWE3 8/2/2021 1.615.580 1.282.961 -16,79
Jalles Machado JALL3 8/2/2021 2.406.463 2.490.544 7,3
Mobly MBLY3 5/2/2021 2.235.997 2.598.015 19,2
Mosaico MOSI3 5/2/2021 2.506.596 3.905.480 58,82
Intelbras INTB3 4/2/2021 5.159.875 6.218.059 23,9
Espaçolaser ESPA3 1/2/2021 4.350.967 4.856.554 11,1
Vamos VAMO3 29/1/2021 5.820.126 7.812.400 36,94
HBR Realty HBRE3 26/1/2021 1.970.910 1.836.764 -5,35
Neogrid NGRD3 17/12/2020 1.031.765 1.962.645 92,08
Alphaville AVLL3 11/12/2020 660.605 492.655 -25,89
Rede D'Or RDOR3 10/12/2020 112.501.867 141.279.952 23,46
3R Petroleum RRRP3 12/11/2020 2.299.591 4.321.041 77,54
Aeris AERI3 11/11/2020 4.143.619 8.512.631 90,09
Enjoei ENJU3 9/11/2020 2.003.547 3.401.143 55,15
Méliuz CASH3 5/11/2020 1.218.386 3.696.901 174,21
Track&Field TFCO4 26/10/2020 1.477.392 2.186.539 33,77
Grupo Mateus GMAT3 13/10/2020 19.760.699 18.505.002 -25,01
Sequoia Logística SEQL3 7/10/2020 1.573.787 3.864.663 124,59
Boa Vista BOAS3 30/9/2020 5.574.648 5.329.508 -32,62
Melnick MELK3 28/9/2020 1.767.739 1.295.649 -45,95
Hidrovias do Brasil HBSA3 25/9/2020 5.748.488 5.216.221 -28,49
Cury Constutora CURY3 21/9/2020 2.729.032 2.945.020 -9,77
Plano & Plano PLPL3 17/9/2020 1.920.006 1.225.536 -52,21
Petz PETZ3 11/9/2020 5.126.767 8.255.032 44,27
JSL JSLG3 10/9/2020 2.673.213 2.677.129 -13,42
Pague Menos PGMN3 2/9/2020 3.660.100 4.433.373 4,32
Lavvi LAVV3 2/9/2020 2.038.972 1.549.619 -37,21
Lojas Quero-Quero LJQQ3 10/8/2020 2.348.323 3.318.779 28,17
D1000 Varejo Farma DMVF3 10/8/2020 860.248 545.490 -49,13
Grupo Soma SOMA3 31/7/2020 4.684.097 6.652.364 31,87
Ambipar AMBP3 13/7/2020 2.653.973 2.665.280 -20,28
Estapar ALPK3 15/5/2020 1.994.318 1.598.611 -67,82
Priner PRNR3 17/2/2020 380.448 294.489 -25,13
Moura Dubeux MDNE3 13/2/2020 1.613.278 860.981 -45,77
Locaweb LWSA3 6/2/2020 1.579.712 18.662.402 641,03
Mitre MTRE3 5/2/2020 2.041.454 1.390.939 -31,96

(*) até 24/02/2012
Fonte: Economática


Então, por conta desse rápido avanço no mercado acionário, está havendo uma “dança de cadeiras de RIs”, que vem sendo assediados com diversas propostas, e agora existe a necessidade de capacitação de novos profissionais para essas áreas.

Segundo especialistas, principalmente os profissionais seniores, aqueles com bastante know-how na linha de frente das companhias, são escassos.

“Nunca recebi tanta demanda para preencher cargos de Relações com Investidores, desde o nível de coordenação até de diretoria. Porém, hoje, tem mais oferta de vagas do que quantidade de profissionais disponíveis. Há muita dificuldade para acessar pessoas, que já estão alocadas”, diz Rui Furtado, managing partner da ForGood, consultoria especializada em soluções de recrutamento de executivos. Em menos de um ano e meio, ele preencheu sete vagas de RIs. Para se ter uma ideia do avanço, nos nove anos anteriores, ele atuou em cinco colocações. “Além dos IPOs, muitas empresas estão se estruturando para se atualizarem em procedimentos ESG (Environment, Social and Governance).

Frequentemente, as perguntas sobre ESG têm entrado pelos canais de RI das empresas. A Cosan, por exemplo, criou uma célula de ESG dentro da área de Relações com Investidores. “Nos preparamos para comunicar da melhor forma as nossas iniciativas ESG, não somente com os investidores, mas pensando em todos os stakeholders. Há um ano e meio, entrou na nossa área uma pessoa 100% dedicada e, há poucos meses, contratamos mais uma analista em questões ESG”, afirma Phillipe Casale, gerente executivo de RI e Comunicação da Cosan. A área também teve recentemente a contratação de mais um analista de RI. Portanto, o time passou a ser de sete pessoas – uma diretora, dois gerentes, dois analistas de RI e dois analistas com foco em comunicação de ESG. De acordo com Casale, nos últimos anos, a Cosan procurou desenvolver talentos internos. “Olhamos basicamente para dentro, buscando pessoas que tivessem skills necessários dentro da companhia para formar para a área de RI. Foi um caminho mais fácil para encontrar pessoas com conhecimento de base da empresa, do setor, da regulação e do ambiente competitivo”, diz.

“Vemos que a área de RIs está bastante aquecida no eixo São Paulo-Rio de Janeiro”, destaca Diego Godoy, headhunter e sócio da Recrutamento Fácil. De maneira geral, nas áreas de RI, governança e compliance as remunerações aumentaram em função da alta demanda. Atualmente ele vê dois desafios em relação ao setor de RI que são o déficit de qualificação de profissionais e o fato de alguns estarem migrando para outros segmentos, como planejamento estratégico, novos negócios e fusões e aquisições, que também estão aquecidos. Conforme Godoy, a função de RI exige muita flexibilidade e alta disponibilidade dos profissionais para prepararem e transmitirem as informações sobre a companhia, e quando eles não se adaptam a essa dinâmica e à tensão do dia a dia, acabam procurando outros trabalhos.

“Existem muitas oportunidades, mas é fundamental ajudar os candidatos a se prepararem para se encaixar. Os profissionais precisam entender se possuem, de fato, perfis aderentes às vagas. Não adianta só se prepararem tecnicamente e contarem com um bom networking, pois se não tiverem o tipo de comportamento adequado, a caminhada é frustrada”, avalia Ana Chauvet, proprietária do Instituto Ana Chauvet, empresa de recrutamento e recolocação profissional que atua no setor financeiro e de investimentos.

A atuação dos RIs antes e depois dos IPOs
No mercado, há empresas que antes do IPO mantêm somente um diretor de RI de forma protocolar, por exigência regulatória – o DRI estatutário, para depois montar a área de maneira mais efetiva, e outras companhias que, durante o processo de abertura, já contam com um setor de Relações com Investidores estruturado de forma robusta.

A Locaweb, empresa de serviços de hospedagem de websites e de soluções de comércio eletrônico, fez sua oferta de ações em fevereiro do ano passado, levantando R$ 1,4 bilhão. Cerca de três meses antes da abertura, Henrique Marquezi Filho, gerente executivo de RI havia sido contratado. “Eu entrei antes do primeiro protocolo na CVM, então, ajudei no processo de IPO e até corri o risco caso não desse certo. O mais importante é que o CEO e o CFO me deram tempo e liberdade para criar o programa de RI, preparar os materiais de divulgação e montar o site”, diz.

Ele destaca que foi muito positivo o período para imersão no negócio. “Ganhei familiaridade com a empresa. No dia seguinte ao IPO, eu estava muito preparado para responder às inúmeras demandas. Minha dica para outras empresas que vão abrir capital é que devem preparar os seus RIs com antecedência porque após o IPO começa uma vida nova e o telefone toca bastante”, comenta Marquezi Filho, que tem 11 anos de experiência em RI e, antes da Locaweb, trabalhou em empresas como a Raízen do Grupo Cosan e CVC.

Ele ressalta que quando entrou na Locaweb, todo o trabalho de estruturação da governança - a formação de um conselho de administração com membros independentes e de um comitê de auditoria, além dos roadshows, já tinham sido feitos. “O que me motiva na Locaweb é o fit cultural. Há um forte alinhamento de todo o time que se expõe ao mercado”, destaca.

A rotina de RI na Locaweb é intensa. Por exemplo, no dia 19 de fevereiro passado, quando ele deu essa entrevista para a Revista RI por volta das 11 horas da manhã, já havia participado de sete calls com investidores por conta de duas aquisições feitas pela Locaweb – da Credisfera, fintech de empréstimos, e da Dooca, plataforma de e-commerce. No final de janeiro, a companhia tinha comprado a ConnectPlug, uma plataforma de gestão para restaurantes e varejo.

A Priner, companhia de serviços e manutenções industriais, também estreou na Bolsa, em fevereiro de 2020, captando R$ 173,9 milhões, um “mini-IPO”. A empresa surgiu como um spin-off da Mills em 2013, sendo adquirida pelo fundo de private Equity da Leblon Equities. Desde então, estava claro que uma das possíveis saídas do fundo seria um IPO e a empresa passou a ser auditada anualmente. Depois, a Priner foi listada no Bovespa Mais em 2017, com balanços e resultados auditados trimestralmente e, no ano passado fez o IPO no Novo Mercado. ”Desse modo, nossa equipe de back-office foi se acostumando aos poucos com essa mudança de realidade, com as novas obrigações. Além de conduzir a área financeira, assumi como diretor de RI, mas não tínhamos na empresa um profissional exclusivo para essa área. Somente quando fizemos o IPO, em fevereiro do ano passado é que contratamos um gerente de RI”, explica Marcelo Gonçalves Costa, CFO e diretor de RI da Priner.

Segundo Costa, foi a primeira atuação dele em um IPO e como profissional de RI. “A vantagem é que a equipe da Leblon Equities apoiou todo esse processo e, como eu tenho mania de planejamento, fui ajustando a empresa e me preparando. Mapeei e me informei sobre as obrigações de RI”, afirma.

O período de 30 dias pós-IPO foi uma “avalanche de perguntas sobre a empresa e o setor” - uma enorme quantidade de questionamentos dos investidores, e ainda não havia um RI exclusivo. Entretanto, depois foi contratado o Felipe Fontes como gerente, vindo do departamento de RI da Alpargatas. Porém, após cerca de um ano, Felipe Fontes já está deixando a Priner e este mês, ele irá para outra companhia. Agora, entrará para a área de RI da Priner a analista Aline Rodrigues dos Santos, que trabalhava na Mills. Mais adiante, um gerente também poderá ser contratado. “Realmente o mercado de RIs está aquecido”, avalia Costa.

A Track&Field, varejista de moda fitness e praia, fez sua oferta pública inicial de ações em outubro do ano passado. A operação movimentou R$ 522 milhões. Com 16 anos em RI e passagens por grandes companhias como CSU, Comgás e Unibanco, Renata Oliva Battiferro se tornou head de Relações com Investidores da Track&Field em fevereiro do ano passado. Ela conta que auxiliou nos protocolos junto à CVM e participou do roadshow. Daí, com o estopim da pandemia em março, o processo de IPO foi congelado por alguns meses até ser retomado a partir de julho. Foram realizadas diversas reuniões virtuais com os executivos, uma rotina intensa e produtiva, sem a necessidade de viagens e deslocamentos. “Entrar antes do IPO na empresa foi excelente para a criação de uma dinâmica de relacionamento com os gestores e alta liderança e para eu conhecer com profundidade a operação e o setor de moda. Facilitou o meu aprendizado para eu passar ao mercado as informações de forma ampla e abrangente”, afirma Renata, que também é conselheira de Administração do IBRI (Instituto Brasileiro de Relações com Investidores).

O IPO da Tack&Field foi o segundo que ela atuou na carreira – o primeiro foi da Smiles. Na visão dela, é preferível e recomendável ter a área estruturada antes do processo de abertura de capital.

Ela tem visto uma procura intensa por profissionais de RI experientes, com vasta trajetória em empresas. “Realmente, não existe uma fórmula mágica, a atividade do RI é muito baseada na prática, nas soluções encontradas diante dos problemas que surgem no dia a dia. Assim, os profissionais vão adquirindo bagagem ao longo da carreira. Mas na situação atual de escassez desses especialistas, as áreas de planejamento, controladoria e finanças podem ser fornecedoras naturais de RIs”, avalia. Conforme Renata, essas pessoas têm que ser multifuncionais, com conhecimento contábil e facilidade para navegar no marketing, na imprensa e nas áreas estratégicas e operacionais.

No caso da Ambipar, companhia de gestão ambiental e tratamento de resíduos, o seu CFO, Thiago Silva, assumiu a diretoria de RI antes do IPO e, junto com uma analista, cuidava do compliance, das divulgações e do atendimento aos investidores.

Por conta da pandemia, 100% do roadshow foi digital e a abertura de capital, que aconteceu em julho do ano passado, levantou R$ 1,08 bilhão. “Apresentamos com êxito um negócio diferente na Bolsa”, afirma Silva.

Recentemente, a área de RI da Ambipar ganhou o reforço de mais um analista e, no fim do mês passado, também houve uma transição, pois Thiago Silva já está exclusivamente por conta da área financeira e quem assumiu o cargo de diretor de Relações com Investidores foi Fábio da Costa Castro, com uma bagagem de seis anos como RI da JSL e três anos, na Movida. “Até agora, o setor de RI foi passivo, então o desafio é ser proativo na aproximação com potenciais investidores, fundos e analistas. Isso porque o número de empresas listadas tem crescido bastante e estão disputando a atenção”, ressalta.

Os investidores institucionais representam o maior volume aportado na companhia, porém a base de pessoas físicas na Ambipar surpreende. “O número de investidores pessoas físicas, 15 mil CPFs, me impressionou, principalmente porque a Ambipar não é uma marca de varejo, mas sim uma companhia que atua B2B no setor de gestão ambiental. Vejo que os jovens que estão indo para a Bolsa procuram investir em negócios comprometidos com as boas práticas ESG, querem fazer parte desse movimento”, diz Castro.

Carlos Lazar, que acaba de assumir como CSO da Wiser Educação, uma empresa de capital fechado, liderou as áreas e Relacionamento com Investidores de grandes companhias abertas: XP, a Kroton que hoje é Cogna e a CSU, e com sua base de conhecimento, defende a criação do departamento de RI de forma consistente antes das ofertas iniciais de ações. “As empresas ganham muito com isso porque os profissionais evoluem na estruturação do IPO, conhecem o business, o que vai ajudá-los a traduzir a companhia para o mercado.”

Outro ponto, de acordo com ele, é que os bancos de investimento têm foco na venda do projeto do IPO, porém o “day after”, isto é, as demandas e situações que costumam ocorrer depois não são muito comentadas. “Conversando com alguns DRIs estatutários de companhias que fizeram IPOs nos últimos meses, notei que muitos deles ainda tinham dúvidas sobre a dinâmica após abertura de capital”, comenta. Lazar acredita que o “day after” é tão ou mais complexo que o próprio processo de IPO. Segundo ele, todo o trâmite da operação é apoiado por advogados, pelos bancos e outros consultores, mas depois do IPO, comumente, as empresas se sentem “órfãs” diante de diferentes desafios – tem toda a parte regulatória, aculturamento da companhia sobre o que pode ou não ser divulgado, o compromisso de comunicar os resultados e fatos relevantes com transparência, assim como as reuniões de relacionamento com investidores. Ele destaca que caso as empresas tenham dificuldade para contratar e estruturar toda a equipe de RI em um primeiro momento, um caminho pode ser recorrer a consultorias especializadas para darem suporte nas atividades da área.

Em relação à XP, Lazar comenta que entrou para comandar o setor de RI em janeiro de 2020, um mês após a realização do IPO na bolsa americana Nasdaq, onde a companhia captou US$ 2,25 bilhões. Porém, todo o processo tinha sido acompanhado de perto por uma analista. “Fiquei um período curto, mas muito intenso na XP. Foi uma escola fantástica, pois trata-se de uma empresa com uma cultura diferenciada. Estruturar a área de RI de uma empresa listada na Nasdaq foi uma experiência nova para mim, defini as linhas de comunicação, o atendimento e procurei deixar os processos rodando como um relógio”, diz Lazar.

Melhores práticas e mais atribuições
Historicamente, os departamentos de RI focaram nos investidores institucionais nacionais e estrangeiros. No entanto, está havendo uma entrada gigantesca de pessoas físicas na Bolsa. Já são mais de 3,4 milhões de pessoas físicas investindo na B3, um aumento de 101% em relação ao final de 2019. E o fluxo continua.

Nesse contexto, o time de relacionamento com empresas listadas da B3 e o IBRI fizeram, em parceria com a MZ Group, a pesquisa “Perfil do relacionamento das áreas de RIs com Investidor Pessoa Física”. O levantamento envolveu 66 companhias de 20 setores em dezembro de 2020 e os resultados foram divulgados no final do mês passado, indicando uma série de desafios.

Conforme a pesquisa, as equipes de RIs são pequenas, sendo que 73% das empresas contam com até 3 pessoas na área. Apenas 35% das companhias possuem profissionais que atuam diretamente no atendimento aos investidores.

Além disso, 60% das empresas alegam conhecer - metade profundamente e outra metade de maneira superficial, o perfil de sua base de investidores pessoas físicas. No entanto, a maioria reconhece que se conhecesse melhor esses investidores poderia alterar a forma de relacionamento com esse público.

O que também chama a atenção é que somente 9% das empresas pesquisadas possuem contas em redes sociais dedicadas às atividades de RI - no LinkedIn, Twitter e Instagram.

Geraldo Soares, conselheiro de Administração do IBRI, enfatiza que é preciso conhecer melhor os investidores pessoas físicas. Segundo ele, a utilização de meios digitais para a comunicação com esse público é fundamental – redes sociais, lives, videoconferências, podcasts e até grupos de WhatsApp. “A pandemia está acelerando toda essa estrutura de comunicação digital”, avalia. Outro aspecto determinante é adequar a linha de comunicação. “De forma geral, a linguagem para as pessoas físicas tem que ser menos técnica e mais didática e acessível. As empresas passam a ter um papel importante de educação financeira”, destaca Soares.

Ricardo Rosanova Garcia, diretor técnico do IBRI ressalta que o avanço das coberturas dos analistas de bancos, corretoras e das casas de research independentes é positivo. Os RIs devem estar altamente preparados para dialogar com esse público especializado, que normalmente tem uma visão mais holística, incluindo os setores das empresas e o ambiente competitivo. “Esses analistas amplificam o alcance das informações que cada empresa divulga. Outra vantagem é que eles costumam trazer insights setoriais importantes para os profissionais de RI e para as companhias”, comenta. Para ele, sobretudo as casas independentes atuam em muitos canais, acessando a base do varejo, que vem ganhando força.

Quanto ao relacionamento com investidores institucionais, que também têm profundo conhecimento setorial, a tendência é de uma atuação mais proativa dos profissionais de RI. “A ideia é trabalhar com targets, procurar investidores com potencial de aumentar exposição no setor e agendar reuniões, apresentar ou atualizar o case da empresa”, afirma Eduardo Galvão, gerente de RI da Ultrapar e conselheiro do IBRI. Conforme ele, a transparência é cada vez mais requisitada e os RIs precisam aumentar o seu escopo e entender mais sobre o que as empresas fazem em termos de ESG, compliance e medidas para prevenir fraudes e corrupção.

Inclusive, segundo especialistas e agentes do mercado, cada vez mais os RIs estão participando das assembleias digitais de acionistas, sendo que essa atividade não está mais concentrada na área jurídica das empresas.

Diante da nova onda de IPOs, também vieram à tona melhores práticas de RI. Uma delas é a criação de um comitê de divulgação que serve para que as decisões sobre fatos relevantes e outras comunicações sejam compartilhadas. “Logicamente que para a CVM, a decisão final é do diretor de RI, mas o comitê de divulgação é uma forma de resguardá-lo”, explica Rodrigo Maia, conselheiro de Administração do IBRI. Segundo ele, muitas vezes o que determina se uma informação pode ou não influenciar os preços no mercado é “uma zona cinzenta”. No entanto, é fundamental saber a materialidade. Para isso, o comitê de divulgação, formado pelo presidente da companhia, o CFO, representantes da controladoria, do departamento jurídico e de gestão de pessoas, entre outros profissionais com diferentes formações, pode discutir cada tema, permitindo que o DRI aprofunde suas análises e tome decisões adequadas. No mercado, há empresas que só tem esse comitê no papel e outras que executam todo o rito.

Maia diz que alguns RIs de companhias novatas na Bolsa têm pecado pelo excesso de divulgações de fatos relevantes, com o intuito de se protegerem. O problema, segundo ele, é que esse documento não pode ser banalizado, pois é um instrumento de alerta, que precisa ser bem fundamentado. “Esse excesso de fatos relevantes é prejudicial. Além do mais, os conteúdos são analisados pela CVM e se houver desinformação ou dados incompletos, o RI pode até ser processado”, adverte Maia. Um comitê de divulgação auxilia em uma atuação mais assertiva dos RIs.

E em um cenário no qual as tecnologias e as mídias sociais aumentam a visibilidade das empresas e os riscos reputacionais, a formação de um comitê de gestão de crise ganha mais relevância. Atualmente até mesmo pequenos incidentes podem ganhar proporções graves rapidamente, destruindo marcas. “Esse comitê de gestão de crise deve ser formado por uma equipe multidisciplinar, pessoas chaves na empresa como principais gestores, profissionais das áreas de RI, recursos humanos, comunicação, jurídica e de operações, ou seja, um time pronto para lidar com situações adversas quando acionado”, explica Phillipe Casale, RI da Cosan e conselheiro do IBRI. A pandemia do Covid-19 tem sido catalisadora, levando à criação e ao fortalecimento desses comitês nas companhias.

Outra atividade essencial, que deve ter maior envolvimento do RI, é a elaboração de um relatório anual completo para contar a história da empresa e mostrar como ela gera valor ao longo do tempo, incluindo diversos indicadores. “O benefício que isso traz para a companhia é enorme, pois levantar informações e colocar os textos do Relato Integrado para discussão, clareia as estratégias, alinha conceitos e ajuda a definir prioridades”, diz Bruno Brasil, diretor presidente do IBRI.

Para apoiar o desenvolvimento do mercado de capitais e a entrada de novas companhias na Bolsa, o IBRI preparou uma websérie em conjunto com a B3 sobre a função dos RIs no atual contexto, detalhando suas atividades no dia a dia e as melhores práticas. O IBRI também tem promovido uma série de eventos online para troca de experiências e estuda retomar o MBA de Finanças, Comunicação e RI em parceria com a FIPECAFI.


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