Orquestra Societária

O APRENDIZADO DE INVESTIDORES & PROFISSIONAIS DE INVESTIMENTO

A Orquestra Societária pode contribuir para o aprendizado de investidores e profissionais de investimento dos mercados financeiro e de capitais? Há 10 anos, uma de nós realizou uma pesquisa, com base em reuniões com empresas ocorridas no âmbito da APIMEC - Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais - em uma de suas Regionais, relativa aos eventos ocorridos de fevereiro a junho de 2006. As perguntas feitas pelos públicos presentes nos eventos foram anotadas e trabalhadas, de maneira que foi obtido um robusto conjunto de dúvidas, expressas sob a forma de perguntas, subdivididas em temas.

A pesquisa em questão, a 10 anos de sua realização, contém elementos atuais para fins de reflexão, à luz da Orquestra Societária, sendo feitos os seguintes comentários preliminares:

  1. Reuniões com empresas – companhias com ações na BM&FBovespa – têm sido realizadas tradicionalmente pelas APIMECs Regionais.
  2. A pesquisa abrangeu 24 empresas, de setores como infraestrutura, financeiro (bancos) e bens de consumo entre outros.
  3. As reuniões objeto da pesquisa tiveram duração de 1,5 a 2,0 horas.
  4. Entre os presentes, havia analistas, profissionais de investimento e investidores, sendo que parte dos investidores era pessoa física.
  5. Da pesquisa em questão, emergiram 266 perguntas, distribuídas entre os tópicos – informações sobre a economia e setor de atuação, informações sobre a empresa (gerais, sobre resultados, estratégia e outras) e governança corporativa.
  6. Em média, foram feitas 11 perguntas por reunião; se o número de perguntas em cada evento oscilou ao redor dessa média, nunca se obteve mais do que 20 perguntas por reunião. Nem todas as perguntas seriam aplicáveis a todas as empresas pesquisadas.

Note-se que alguns temas que hoje ocupam, em boa medida, a pauta dos mercados, como a sustentabilidade, ainda pareciam incipientes. Ao mesmo tempo, percebemos, na releitura da pesquisa, como as dúvidas expressas pelos públicos presentes, não exaustivas quando se considera o aprendizado que se busca sobre uma companhia com ações em bolsa de valores, têm elevada correlação com os principais elementos da Orquestra Societária, representada na figura 1, onde também se representam os agentes do mercado de capitais presentes às reuniões – analistas, profissionais de investimento e investidores.

Figura 1: A Orquestra Societária e o aprendizado de analistas, profissionais de investimento e investidores



Todas as dúvidas que emergiram da pesquisa original puderam ser integralmente enquadradas em relação aos elementos representados na Orquestra representada anteriormente, considerando os tópicos:

  1. Macroambiente e stakeholders, subdivididos nas categorias de stakeholders que emergiram na pesquisa.
  2. Ética, governança e sustentabilidade, detalhando cada um desses elementos. A Alta Administração é abordada no item governança.
  3. Arquitetura organizacional, abrangendo estratégia, estrutura, processos, pessoas e sistema de recompensas.

A seguir, apresentamos as perguntas reenquadradas (98), com base em critérios de concisão.







Para fins deste artigo, os principais critérios para maior concisão foram: 1. perguntas relativas a questões macroeconômicas não são aqui apresentadas; elas seriam enquadráveis no bloco Macroambiente e Stakeholders; 2. perguntas particularizando questões, transações e variáveis específicas de uma dada empresa não foram agregadas; 3. perguntas sobre resultados passados das empresas foram concentradas em processos. 4. perguntas sobre o futuro ficaram mais concentradas em governança, sustentabilidade e estratégia.

Parte das perguntas poderia ser enquadrada em mais de uma categoria, mas isso, além de não invalidar as constatações aqui apresentadas, sugere que um formato matricial poderia ser criado para fins de check-lists (o que, entretanto, não é feito neste artigo).

Quais considerações podem ser feitas sobre o novo esforço de enquadramento das perguntas? Vejamos:

  1. Os stakeholders receberam atenção, ainda que tenham faltado stakeholders primários como emprestadores de recursos financeiros e fornecedores de insumos, dos quais as operações organizacionais não podem prescindir para existirem; ao mesmo tempo, entre os stakeholders secundários, destacamos a ausência da mídia.
  2. A ética não recebeu qualquer tipo de questionamento, bem como o modelo de gestão. O mesmo não pode ser dito da governança corporativa e da sustentabilidade, sobre as quais boas perguntas emergiram.
  3. A estratégia recebeu grande atenção dos públicos presentes, o que parece surpreendente, haja vista queixas que temos ouvido quanto à preocupação de agentes do mercado sobre resultados de curto prazo, associados ao pagamento de dividendos e juros sobre o capital próprio. A estrutura pouca atenção recebeu; as perguntas indicadas na relação anterior foram as únicas feitas e de forma mais abrangente, em termos do grupo empresarial como um todo.
  4. Os processos tiveram especial foco em resultados, mas não somente, sendo que aspectos como riscos e produtividade emergiram na pesquisa entre outros. As pessoas, ou seja, o capital humano, foi contemplado, de forma restrita, em aspectos como segurança do trabalho e compromissos com o fundo de pensão. Quanto aos sistemas de recompensa, eles receberam incipiente atenção no momento de realização da pesquisa, com duas perguntas – sobre critérios de recompensa e regras de sucessão.

Conforme dito inicialmente, 10 anos se passaram. O que houve na última década? O mercado evoluiu em termos de exigência por ética, transparência, harmonização com normas internacionais de contabilidade, relatório integrado (em plena discussão), conectividade e outros temas de alto impacto. Assim, a mesma pesquisa feita com as mesmas empresas nos dias de hoje traria visões adicionais das companhias pesquisadas.

Ao mesmo tempo, notamos que a Orquestra Societária – tratada nesta coluna como uma ferramenta de governança organizacional - se apresenta como uma ferramenta que se presta à organização, por públicos externos, de informações e conhecimento sobre companhias, por meio do apoio das áreas de Relações com Investidores e da busca informacional em sites de RI, em reuniões com empresas e, por fim, via todas as oportunidades existentes de aprender sobre as companhias listadas na BM&FBovespa. Forçando, por construção, os agentes do mercado a refletirem com base em uma ampla varredura de temas, sem deixar de fora questões como ética, modelo de gestão, estrutura organizacional e administração do capital humano entre outros, essenciais para o alcance de resultados sustentáveis.


Cida Hess
é sócia diretora da KPMG, economista e contadora, especialista em finanças e estratégia e membro da Comissão de Comunicação do IBGC.
cidahess@kpmg.com.br

Mônica Brandão
é engenheira eletricista, foi gerente de análise e acompanhamento de projetos e planejamento corporativo da Cemig e tem atuado como conselheira de organizações e professora em cursos de pós-graduação.
mbran@terra.com.br


Continua...