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Fórum Abrasca

TRIBUTAÇÃO DE DIVIDENDOS: PODE DESESTIMULAR EMPRESAS A INVESTIR EM ATIVIDADES OPERACIONAIS

As companhias associadas à Abrasca têm grande preocupação com a possibilidade de uma reforma tributária que pretenda introduzir a tributação sobre dividendos, bem como os seus impactos na apuração do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (“IRPJ”) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (“CSLL”).

O regime de isenção na distribuição de dividendos foi introduzido em janeiro de 1996, trazendo diversas vantagens, como a maior simplicidade para o contribuinte e para o fisco, a flexibilização da alocação de investimentos para os investidores e a menor vulnerabilidade à evasão fiscal.

Em contraponto, a tributação dos dividendos poderia gerar desincentivos ao investimento em atividades operacionais (seja por portfólio ou investimento direto) e a sua consequente migração para investimentos e rendas passivas com menor ônus tributário. A tributação dos dividendos pode ter um efeito extrafiscal indesejado, que é afetar o equilíbrio entre capital próprio e de terceiros.

Empresas podem ser financiadas por capital de seus acionistas ou contraindo dívidas. Quanto maior é a parcela de capital próprio subscrito pelos acionistas como fonte de financiamento, mais sólida é a empresa; por outro lado, quanto mais endividada, mais frágil financeiramente. Acionistas são remunerados pela sua participação nos lucros, ou seja, no Brasil por meio de dividendos e juros remuneratórios do capital próprio (JCP). Já os credores são remunerados pelos juros incidentes sobre os valores que emprestam para as empresas.

Caso os JCP deixem de ser dedutíveis e a integração da tributação dos dividendos com o IRPJ resulte numa carga superior à atual, estar-se-ia incentivando a migração da estrutura de financiamento das empresas do capital próprio para o capital de terceiros.

Mesmo em um cenário em que fossem equivalentes as cargas fiscais sobre o recebimento de juros do capital e dos juros dos financiamentos, o investidor tende a preferir ser credor, na medida em que a despesa com sua remuneração seria dedutível na pessoa jurídica e porque correria menos riscos, inclusive em eventual cenário de falência, do que na posição de acionista. Esses elementos, aliados à escassez de crédito no mercado financeiro para atividades produtivas ou o seu alto custo, podem resultar em um desincentivo ao financiamento de atividades produtivas.

A carga tributária atribuída a cada situação deve ser de tal modo que não incentive o investidor a seguir um ou outro caminho, deixando que sua decisão seja balizada em parâmetros empresariais e de custo de oportunidade dos recursos financeiros, tal como se dá em mercados mais desenvolvidos.

 Além disso, não é possível afirmar que a substituição do regime de tributação atual pela tributação do lucro líquido com uma alíquota corporativa inferior e posterior tributação dos dividendos seja capaz de promover a busca da neutralidade, com relação à arrecadação.

Mesmo que fosse possível uma reforma que mantivesse a arrecadação tributária sobre as empresas e seus acionistas no mesmo patamar, reduzindo IRPJ e criando incidência sobre dividendos, ela não traria qualquer incentivo ao investimento em atividades produtivas no país. O custo tributário do investimento produtivo continuaria o mesmo, com efeito prático nulo para o investidor. Nos EUA, por exemplo, a reforma tributária trouxe efetiva redução na carga fiscal do investimento produtivo, gerando maior competitividade.

 Ainda, levanta-se a possibilidade de aumento de planejamentos tributários, distribuição de lucros sob forma de pagamento de rendimentos sobre títulos de renda fixa, entre outros, contribuindo para agravar o indesejado cenário de litígio tributário.

À luz das preocupações acima mencionadas e do atual estágio de discussão do modelo de reforma tributária corporativa, entendemos que é necessário discutir conjuntamente a implementação de um regime de tributação de dividendos que apresente pelo menos as seguintes características: (i) Redução da carga tributária global; (ii) Tributação única dos dividendos na cadeia de investimento; (iii) Segurança jurídica com a observância ao princípio da anterioridade e segregação dos lucros auferidos e não distribuídos em períodos anteriores à aprovação da reforma para assegurar a manutenção de seu regime tributário; e (iv) Manutenção do equilíbrio entre as cargas tributárias do financiamento das companhias por dívida e por capital próprio.

A redução da carga tributária global deve ser uma consequência da introdução da tributação dos dividendos concomitante à redução da tributação corporativa (alíquotas do IRPJ e da CSLL), de forma que o custo tributário global seja reduzido e haja incentivo ao investimento e reinvestimento em atividades produtivas.

Além disso, a tributação deve incidir de forma única e exclusiva sobre o lucro efetivamente distribuído para pessoas físicas ou investidores não residentes, de modo a não onerar diversas vezes a mesma riqueza na cadeia de sociedades que formam a estrutura de capital dos grupos nacionais. Em outras palavras, deve-se evitar a tributação dos dividendos em cadeia, o que afetaria as estruturas de empresas holding e investimentos.

Isso poderia ser atingido mediante:

(i) a manutenção da isenção tributária na distribuição entre pessoas jurídicas, com a imposição do imposto de renda na fonte apenas por ocasião da distribuição de lucros de uma pessoa jurídica para uma pessoa física ou um não residente; ou
(ii) da retenção de imposto de renda em cada distribuição de dividendos com a introdução de um mecanismo de crédito direto (a exemplo do que ocorre com os juros sobre o capital próprio).

Cabe lembrar um aspecto extremamente importante: o novo regime tributário só deverá ser aplicável aos lucros auferidos pelas pessoas jurídicas no exercício financeiro seguinte ao de sua aprovação, em atendimento ao princípio da anterioridade. De maneira análoga à introdução da regra de isenção em janeiro de 1996, os valores não distribuídos gerados até ao final do ano em que fosse aprovada a reforma deverão ser mantidos segregados para que o beneficiário dos dividendos faça jus à isenção do regime anterior.

Ainda, a implementação da tributação dos dividendos nos moldes acima descritos deve ser vista não só como uma oportunidade de criação de vantagens competitivas para atração de investimentos externos, como também de estímulo às empresas multinacionais brasileiras. Isso porque, a redução da alíquota corporativa (IRPJ e CSLL) facilita a internacionalização dessas empresas. No cenário atual, as empresas brasileiras holdings de grupos multinacionais sofrem tributação dos lucros auferidos em bases universais à alíquota corporativa de 34%, o que prejudica sua competitividade em termos globais (as alíquotas dos tributos corporativos dos países membros da OCDE equivalem a aproximadamente 23,69%. Os Estados Unidos têm alíquota de 21%).

Em um cenário com a alíquota corporativa de 15%, o Brasil se torna competitivo no mercado internacional, desestimulando inversões e redomiciliações de empresas brasileiras com pretensões internacionais, na medida em que torna o custo do investimento no exterior menos oneroso.

Nesse cenário, a tendência é que as contingências relacionadas à tributação dos lucros auferidos no exterior diminuam, o que é expressivo, já que esse tema representa um dos maiores contenciosos tributários do país, com valor estimado de R$ 40 bilhões em 2015.

Alfried Plöger
é presidente do Conselho Diretor da Associação Brasileira das Companhias Abertas (ABRASCA)
abrasca@abrasca.org.br


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