Entrevista

PAULO PORTINHO, EXPERT EM FINANÇAS PESSOAIS

Os passos para um investidor consciente
Para ser um investidor no mercado de ações é preciso seguir alguns preceitos, pois agir somente com a emoção leva à decisões equivocadas. Com a marca de 1 milhão de investidores, sendo 200 mil recém-chegados nos primeiros quatro meses do ano, a Bolsa tem exibido forte volatilidade. O Ibovespa chegou a bater 100 mil pontos (18/03) e, apenas dois meses depois, estava abaixo de 90 mil pontos (17/05), uma queda de 10%. Até o fechamento desta matéria, o índice já se encontrava próximo aos 96 mil pontos.

Para não perder diante de tamanhos altos e baixos, a recomendação é investir regularmente pequenas quantias; reinvestir os ganhos no próprio mercado; comprar ações de empresas com perspectivas de crescimento e com preço relativo baixo; diversificar a carteira e prestigiar as empresas com boa governança corporativa.

Estes eram os princípios do extinto Instituto Nacional de Investidores (INI) e quem os relembra é o engenheiro com mestrado em administração de empresas, ambos pela PUC-Rio, Paulo Portinho. Como executivo da entidade, entre 2003 e 2012 - expert em mercado de ações - ministrou mais de 500 palestras e cursos sobre o mercado de ações, sendo responsável pelo desenvolvimento do curso sobre o “Método INI de Investimento em Ações”, conteúdo que havia chegado a mais de 15.000 investidores em todo o país, até o ano de 2012.

Recentemente, Paulo Portinho foi surpreendido quando um texto seu, postado em sua página no Facebook, que tratava sobre o cenário político, viralizou depois de ser compartilhado pelo presidente Jair Bolsonaro em suas redes sociais, provocando várias interpretações. O texto (reproduzido na íntegra no final dessa matéria), classificado como um simples desabafo de um cidadão, trouxe os holofotes para o professor, que agora simplesmente deseja conseguir “retomar as suas redes sociais”, sem ficar tão visado.

Em entrevista exclusiva para a Revista RI, o especialista em finanças pessoais e autor dos livros "O Mercado de Ações em 25 Episódios" e "Quanto Custa Ficar Rico?", pela editora Campus Elsevier, e "Investimentos para Não Especuladores - O Método SEMPRE", pela editora Saraiva, fala sobre o aumento do número de investidores na Bolsa e o momento atual do mercado.

RI: Como o senhor vê o crescimento do mercado de capitais, em especial do mercado de ações, e quais são as perspectivas futuras?

Paulo Portinho: Eu vejo que o crescimento do mercado de capitais e do mercado de ações como um processo natural, que ocorre em qualquer país que sai de um cenário de inflação, primeiramente, e de juros muito altos, para um cenário de inflação controlada e juros baixos como tem sido até agora. As taxas de juros brasileiras ainda não são tão reduzidas quando comparadas com o resto do mundo, mas estão muito menores em relação ao passado. Acredito que o brasileiro, que era acostumado a receber, ao menos 1% ao mês, e agora recebe 0,5% ou 0,35%, 0,33% na poupança, viu que isso é insuficiente para que ele acumule patrimônio - seja no curto, no médio ou no longo prazo. A poupança acabou virando só proteção. Então, acredito que a tendência, mantendo as condições que estão agora com juros baixos ou até menores, é de que as pessoas devam se interessar cada vez mais pelo mercado de capitais.

RI: Quais foram as causas que motivaram esse crescimento?

Portinho: Esse movimento de agora, em que a bolsa atingiu um milhão de pessoas físicas, é diferente o que aconteceu nos anos 2000. Naquela época, os juros ainda eram altíssimos, mas a bolsa começou a dar um retorno muito grande. Entre 2003 e 2007, ocorreu uma alta muito expressiva. Então as pessoas entraram na época com essa impressão de dinheiro muito fácil e muito rápido. No movimento atual, a lógica é outra. É a lógica de muitos anos já de juros bem mais baixos. Outro ponto que estimulou bastante esse crescimento foi o que aconteceu nos últimos cinco anos: a popularização de investimentos um pouco mais sofisticados. Além disso, a facilidade que se tem de entrar numa corretora hoje é muito maior do que se tinha há 15, 10, 5 ou 3 anos. As corretoras estão mais preparadas para receber e atender as pessoas físicas, os custos são muito menores e o acesso é mais fácil. As corretoras não são hoje somente um meio para as pessoas acessarem a bolsa em si, mas também uma forma de participarem de fundos de renda fixa, de ações ou de debêntures excelentes, de participar de grandes análises etc... Então, acho que isso fez com que esse público de classe média e até média baixa se sentisse bem recebido pelas corretoras. As décadas de 2000 até 2010, anos 90 e 80, era uma época em que as pessoas acreditavam que a Bolsa e as corretoras eram lugares para gente com muito dinheiro. Este cenário no finalzinho da década de 2000 mudou muito.

RI: Qual foi o papel do extinto INI – Instituto Nacional de Investidores nesse processo?

Portinho: O INI surgiu como uma iniciativa do Plano Diretor do Mercado de Capitais, em 2001. Ele tinha como objetivo ensinar as pessoas a investir em ações da mesma forma que investem em poupança, ou seja, regularmente fazendo aportes ao longo de 15 a 20 anos, acumulando patrimônio. Sempre colocando pouco dinheiro. Seguimos alguns princípios internacionais que, de certa forma, protegiam o investidor. O instituto chegou a se relacionar com aproximadamente 80 mil a 100 mil pessoas. Chegou a ter entre 15 e 20 mil associados, ou seja, pessoas que pagavam pelo material. Tais participantes levaram consigo um ensinamento importante. As pessoas entenderam que bolsa é um mercado de risco, mas o seu comportamento pode tanto amplificar demais esse risco, quanto pode diminuí-lo bastante. Quem seguia a metodologia do INI, aplicava pouco dinheiro e sempre, porque sabia que não iria acertar o momento de entrar o tempo todo. Os investidores eram orientados a reinvestir os dividendos recebidos no próprio mercado, além de buscar empresas com perspectivas de crescimento e que não estavam muito caras. A gente ensinava a pessoa a identificar estas tendências a partir dos balanços das companhias. Assim, eles diversificavam e privilegiavam companhias com boa governança corporativa. Então, as pessoas que seguiam isso e que seguiram nos últimos 15 anos, sem dúvida nenhuma, conseguiram montar uma carteira interessante. Acredito que, neste contexto, o INI deve ter conseguido plantar muitas sementes na lógica do investimento em Bolsa, que deve ser visto como de longo prazo.

RI: Por que o INI acabou encerrando as atividades? Há espaço para um novo INI hoje?

Portinho: Com o fim dos programas de fomento, em 2012 e com o fim de programas como o “Bovespa vai até Você”, o mercado ficou órfão destas iniciativas mais agressivas de educação financeira “bem financiadas”, digamos assim. Porque você precisa entender que o investimento do INI e da Bolsa na educação financeira eram coisas objetivas. Nós não dávamos palestras genéricas, mas sim ensinávamos as pessoas a se comportarem como investidores da Bolsa de Valores mesmo. Depois de uma aula do INI ou da Bolsa, a pessoa podia abrir conta em uma corretora para fazer sua primeira compra. A única forma de entender como é investir em bolsa é realmente investindo. Então o que aconteceu. No meu entendimento, foi que depois disso, um monte de iniciativas voluntárias e espontâneas começaram a surgir na Internet. Então hoje você consegue acessar conteúdos de boa qualidade de graça nas mídias sociais e as pessoas se sentem mais amparas. As pessoas conseguem encontrar outras em comunidades que têm as mesmas dificuldades ou facilidades. Isso é uma mudança grande recente, que vem de 2015 ou de 2016 para cá.

RI: Quais os conselhos para o investidor na conjuntura atual de volatilidade?

Portinho: A minha área de educação financeira é mais fundamentalista. Se as pessoas seguirem a metodologia e a filosofia que trouxemos para o Brasil e que utilizamos no INI, as quais levam o investidor a se comportar de forma a reduzir o risco em Bolsa, elas devem conseguir manter um relacionamento de longo prazo com o mercado acionário sim, sem necessariamente tomar aqueles sustos que são comuns. Os princípios do INI são: investir regularmente pequenas quantias; reinvestir os ganhos no próprio mercado; comprar empresas com perspectivas de crescimento e com preço relativo baixo; diversificar a carteira e prestigiar empresas com boa governança corporativa.

RI: Como engajar mais as pessoas a entenderem outras formas de investir além da poupança?

Portinho: Entendo que as Casas de Análise Independentes precisam ter uma integração muito profunda com o investidor através das redes sociais. Antigamente elas eram muito fechadas e era difícil acessar o analista e conversar. Acho que estas instituições vão prestar um serviço melhor quanto mais estejam acessíveis para que as pessoas tirem dúvidas a respeito do que estão falando. Isso pode ocorrer via comunidades em redes sociais.

RI: O número de investidores ainda é muito reduzido frente à quantidade investida na poupança e o número de brasileiros? Perdemos a chance de popularização do mercado com o abandono de programas como o do INI e o “Bovespa vai até Você”?

Portinho: Eu não entendo que tenhamos perdido a chance. Ficamos, talvez, uns quatro ou cinco anos sem uma coordenação central como era feito antes. Mas isso acabou sendo resolvido ou melhorado até pela quantidade de conteúdos gratuitos espontâneos que surgem na Internet. É um risco, mas também o investidor deve começar a aprender no que ele realmente deve acreditar. Se é uma simples promessa de retorno fácil, ou se a pessoa vai realmente ensinar a investir em ações. A questão da Internet, principalmente dos fóruns e comunidades, é que você se sente próximo de um analista, de um profissional e é mais fácil fazer perguntas. Eu participo de algumas comunidades e redes sociais de analistas que considero muito boas, tiram dúvidas muito simples de pessoas que não tem quase nenhum entendimento. É fácil perceber isso pelas perguntas. Entendo que isso é uma coisa virtuosa e que precisa ser estimulada. Talvez, instituições como a própria Bolsa ou corretoras possam estimular mais que as pessoas façam cursos, disponibilizando mais materiais gratuitos, e o próprio mercado decide se eles são de qualidade ou não.

RI: Quanto ao seu texto compartilhado pelo presidente Jair Bolsonaro e divulgado nas redes sociais, como foi sua sensação?

Portinho: Com relação ao meu texto, foi uma grande surpresa e a única coisa que eu espero agora é que eu possa retomar as minhas redes sociais sem ficar tão visado. Eu ainda não publiquei nada e espero que, quando eu publicar alguma coisa para os meus amigos e para as pessoas que realmente participam do meu meio, fique naquele ambiente somente. Eu sei que é impossível conseguir garantir isso, mas espero recuperar a minha rede. Foi uma exposição um pouco exagerada e assustadora.

RI: Como as redes sociais podem ser usadas para engajar as pessoas a buscarem o mercado de capitais?

Portinho: Quanto às redes sociais, acredito que a principal questão que as elas trazem para as pessoas é o acolhimento. O INI foi realmente pioneiro nesse caso, um dos primeiros a construir um sistema para que as pessoas se sentissem acolhidas dentro de uma comunidade com os mesmos interesses. Eu entendo que a melhor coisa que pode ser feita para acolher o investidor e para ele se sentir mais seguro é realmente estimular e criar essas comunidades de casas de análise e corretoras para que as pessoas tenham mais acesso aos profissionais, consigam tirar dúvidas. Quando acontece uma coisa estranha que o investidor não entende, mas participa de uma comunidade de 10, 15 ou 20 pessoas que passaram pela mesma situação e já relataram sua experiência no YouTube ou em um blog, ele se sente melhor. Isso é muito acolhedor. Saber que não está sozinho. Acho que isso mudou para sempre a forma como as pessoas se relacionam com os investimentos.

RI: O caso Bettina, da Empiricus, foi bastante criticado pela mídia e redes sociais. Esse tipo de propaganda “agressiva” prejudica o mercado? Como especialista em finanças pessoais, como avalia esta questão? Qual o papel das Casas de Análise independentes neste sentido?

Portinho: O caso Bettina foi imediatamente tratado pelos órgãos de proteção do consumidor e de qualidade e ética na propaganda. Porque realmente, num primeiro momento, estes são os órgãos mais dinâmicos para resolver estes assuntos. Eu não acho que esse tipo de propaganda gere transtornos grandes no mercado. É preciso que sejam combatidos, mas as pessoas não têm mais esta inocência. Em Bolsa, elas não acreditam mais que as coisas ocorram desta maneira. Quando a pessoa quer um retorno muito rápido, ela vai ter que se preocupar mais com Forex, ou com os esquemas de pirâmide e promessas de retornos exorbitantes. Como estamos em um ambiente regulado, ficamos um pouco mais protegidos.

A seguir, a íntegra do “polêmico” texto de Paulo Portinho, postado no dia 11/05/2019 em sua página no Facebook - que, quando compartilhado pelo presidente Jair Bolsonaro em suas redes sociais, acabou viralizando, repercutindo no noticiário das primeiras páginas dos jornais e mídias em geral.

Temos muito para agradecer a Bolsonaro.
Bastaram 5 meses de um governo atípico, "sem jeito" com o congresso e de comunicação amadora para nos mostrar que o Brasil nunca foi, e talvez nunca será, governado de acordo com o interesse dos eleitores. Sejam eles de esquerda ou de direita.

Desde a tal compra de votos para a reeleição, os conchavos para a privatização, o mensalão, o petrolão e o tal "presidencialismo de coalizão", o Brasil é governado exclusivamente para atender aos interesses de corporações com acesso privilegiado ao orçamento público.

Não só políticos, mas servidores-sindicalistas, sindicalistas de toga e grupos empresariais bem posicionados nas teias de poder. Os verdadeiros donos do orçamento. As lagostas do STF e os espumantes com quatro prêmios internacionais são só a face gourmet do nosso absolutismo orçamentário.

Todos nós sabíamos disso, mas queríamos acreditar que era só um efeito de determinado governo corrupto ou cooptado. Na próxima eleição, tudo poderia mudar. Infelizmente não era isso, não era pontual. Bolsonaro provou que o Brasil, fora desses conchavos, é ingovernável.

Descobrimos que não existe nenhum compromisso de campanha que pode ser cumprido sem que as corporações dêem suas bênçãos. Sempre a contragosto.

Nem uma simples redução do número de ministérios pode ser feita. Corremos o risco de uma MP caducar e o Brasil ser OBRIGADO a ter 29 ministérios e voltar para a estrutura do Temer.

Isso é do interesse de quem? Qual é o propósito de o congresso ter que aprovar a estrutura do executivo, que é exclusivamente do interesse operacional deste último, além de ser promessa de campanha?

Querem, na verdade, é manter nichos de controle sobre o orçamento para indicar os ministros que vão permitir sangrar estes recursos para objetivos não republicanos. Historinha com mais de 500 anos por aqui.

Que poder, de fato, tem o presidente do Brasil? Até o momento, como todas as suas ações foram ou serão questionadas no congresso e na justiça, apostaria que o presidente não serve para NADA, exceto para organizar o governo no interesse das corporações. Fora isso, não governa.

Se não negocia com o congresso, é amador e não sabe fazer política. Se negocia, sucumbiu à velha política. O que resta, se 100% dos caminhos estão errados na visão dos "ana(lfabe)listas políticos"?

A continuar tudo como está, as corporações vão comandar o governo Bolsonaro na marra e aprovar o mínimo para que o Brasil não quebre, apenas para continuarem mantendo seus privilégios.

O moribundo-Brasil será mantido vivo por aparelhos para que os privilegiados continuem mamando. É fato inegável. Está assim há 519 anos, morto, mas procriando. Foi assim, provavelmente continuará assim.

Antes de Bolsonaro vivíamos em um cativeiro, sequestrados pelas corporações, mas tínhamos a falsa impressão de que nossos representantes eleitos tinham efetivo poder de apresentar suas agendas.

Era falso, FHC foi reeleito prometendo segurar o dólar e soltou-o 2 meses depois, Lula foi eleito criticando a política de FHC e nomeou um presidente do Bank Boston, fez reforma da previdência e aumentou os juros, Dilma foi eleita criticando o neoliberalismo e indicou Joaquim Levy. Tudo para manter o cadáver procriando por múltiplos de 4 anos.

Agora, como a agenda de Bolsonaro não é do interesse de praticamente NENHUMA corporação (pelo jeito nem dos militares), o sequestro fica mais evidente e o cárcere começa a se mostrar sufocante.

Na hipótese mais provável, o governo será desidratado até morrer de inanição, com vitória para as corporações. Que sempre venceram. Daremos adeus Moro, Mansueto e Guedes. Estão atrapalhando as corporações, não terão lugar por muito tempo.

Na pior hipótese ficamos ingovernáveis e os agentes econômicos, internos e externos, desistem do Brasil. Teremos um orçamento destruído, aumentando o desemprego, a inflação e com calotes generalizados. Perfeitamente plausível. Claramente possível.

A hipótese nuclear é uma ruptura institucional irreversível, com desfecho imprevisível. É o Brasil sendo zerado, sem direito para ninguém e sem dinheiro para nada. Não se sabe como será reconstruído. Não é impossível, basta olhar para a Argentina e para a Venezuela. A economia destes países não é funcional. Podemos chegar lá, está longe de ser impossível.

Agradeçamos a Bolsonaro, pois em menos de 5 meses provou de forma inequívoca que o Brasil só é governável se atender o interesse das corporações. Nunca será governável para atender ao interesse dos eleitores. Quaisquer eleitores. Tenho certeza que esquerdistas não votaram em Dilma para Joaquim Levy ser indicado ministro. Foi o que aconteceu, pois precisavam manter o cadáver Brasil procriando. Sem controle do orçamento, as corporações morrem.

O Brasil está disfuncional. Como nunca antes. Bolsonaro não é culpado pela disfuncionalidade, pois não destruiu nada, aliás, até agora não fez nada de fato, não aprovou nada, só tentou e fracassou. Ele é só um óculos com grau certo, para vermos que o rei sempre esteve nu, e é horroroso.

Infelizmente o diagnóstico racional é claro: "Sell".


Continua...