Nos debates contemporâneos sobre governança corporativa, é comum ouvirmos palavras como transformação, inovação, estratégia, disrupção. O discurso está afinado com os desafios do século XXI, e os conselhos de administração se mostram cada vez mais atentos a temas como sustentabilidade, diversidade, ética e geração de valor no longo prazo. No entanto, existe um risco silencioso que compromete a efetividade desses esforços: o excesso de ideias e iniciativas — sem a devida capacidade de execução.
Criar, propor, inovar e pensar grande são atitudes desejáveis. Mas, em muitas organizações, o que se observa é um ciclo recorrente de entusiasmo inicial seguido por estagnação. Projetos são lançados com pompa, mas não chegam à etapa de consolidação. Estratégias são aprovadas, mas carecem de continuidade. O problema não está na falta de visão, mas na ausência do que chamo aqui de “acabativa”: a habilidade de levar até o fim o que foi iniciado, com foco, disciplina e atenção aos detalhes.
Stephen Kanitz, em uma de suas reflexões mais provocativas, propõe que os profissionais se dividem entre iniciativos e acabativos. Os primeiros são entusiastas de novas ideias; os segundos, aqueles que sustentam a rotina, superam obstáculos e garantem que os compromissos assumidos virem realidade. Em governança, precisamos de ambos — mas é a presença dos acabativos que assegura que boas decisões estratégicas se traduzam em impactos reais e mensuráveis.
Na prática, o que vemos são conselhos impressionados com apresentações inspiradoras e grandes planos, mas que não acompanham de forma efetiva sua implementação. Falta cobrança, continuidade e senso de urgência. Isso enfraquece os mecanismos de accountability, compromete a cultura organizacional e gera frustração entre stakeholders.
Governança não é apenas sobre pensar os futuros — é, acima de tudo, garantir que o presente seja bem cuidado. Valer-se de indicadores, estruturas e processos é fundamental, mas nada substitui o valor de pessoas comprometidas com a execução. São elas que mantêm a operação funcionando, asseguram a entrega dos resultados, cuidam da reputação institucional e fazem a ponte entre o discurso e a prática.
Em tempos em que se valoriza tanto o novo, é preciso também valorizar o necessário: o que funciona, o que permanece, o que sustenta. Uma governança eficaz exige criatividade, sim — mas exige, sobretudo, “acabativa”.
Ricardo Lamenza
é vice-presidente do Conselho de Administração do IBGC.
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