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O PRIORITÁRIO PROTAGONISMO DAS EMPRESAS NA AGENDA DO CLIMA

O mundo enfrenta uma encruzilhada climática. Nesse cenário, as empresas têm papel expressivo na jornada contra o aquecimento global, cujas consequências são cada vez mais evidentes nos cataclismos crescentes que se observam no Brasil e no mundo. Enquanto governos oscilam em seus compromissos ambientais, cabe ao setor privado demonstrar resiliência e liderança na trilha da sustentabilidade.

O retrocesso nos Estados Unidos, segundo maior emissor de gases de efeito estufa, atrás apenas da China, pode até mesmo provocar posições semelhantes de outras nações, em especial as que concorrem de modo mais acentuado com a economia norte-americana. Assim, é temerária a decisão de Donald Trump, no primeiro dia de seu novo governo, de retirar o país do Acordo de Paris, agravada pelos seus atos de março, quando revogou regulamentações climáticas, fechou escritórios de Justiça Ambiental e reafirmou o estímulo aos hidrocarbonetos. São medidas na contramão da transição à economia verde.

Nesse contexto, é ainda mais determinante que as empresas assumam protagonismo, não apenas pelos compromissos ambientais e sociais que devem ser inerentes à sua atividade na civilização contemporânea, como pelo fato de que os consumidores, investidores, stakeholders e a sociedade em geral seguem exigindo comprometimento real com a agenda climática, independentemente da postura de governos. Assim, as estruturas de governança corporativa precisam responder de modo firme e competente a essas exigências, incorporando os riscos climáticos às estratégias dos negócios.

No entanto, há uma lacuna preocupante, pois os conselhos de administração ainda demonstram menor preparo para discutir mudanças climáticas e sustentabilidade, conforme aponta uma reveladora pesquisa do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC): “Perspectiva dos conselheiros e executivos – ambiente de negócios e governança corporativa (2ª edição - 2025)”. O levantamento mostra que os aspectos ambientais estão entre os principais temas que requerem maior conhecimento dos colegiados, tanto para as menores quanto para as maiores organizações.

Segundo os conselheiros e executivos das menores empresas, há muito despreparo para discutir mudanças climáticas (28,1%), desastres ambientais (27,6%) e sustentabilidade ambiental (20,7%). Nas maiores, há muito despreparo, na visão dos respondentes, para discutir desastres ambientais (24,2%), avanço da inteligência artificial (23,4) e mudanças climáticas (19,0%).

Consequentemente, os temas referentes a mudanças climáticas, redução de emissões e transição energética ainda não são discutidos pelos conselhos de 18,9% destas organizações.

Os dados alertam para a necessidade de um engajamento mais rápido e amplo das estruturas de governança corporativa das empresas de nosso país na agenda do clima. Não podemos ter como exemplo o abandono das metas ambientais e de combate ao aquecimento global verificado em algumas organizações privadas dos Estados Unidos, que aderiram de modo instantâneo à nova política de Trump para o setor.

Cabe ponderar que os atores da iniciativa privada não devem utilizar a agenda ambiental por mera conveniência de marketing ou para alinhamento ao poder político. A responsabilidade socioambiental é um preceito que deve estar cada vez mais arraigado à missão das empresas, sendo muito importante para sua perenidade e êxito em seus mercados. Simplesmente mudar estratégias para se alinhar a discursos hostis ao meio ambiente geram riscos para as próprias companhias e todos os stakeholders.

Trata-se de postura que ignora um fato fundamental: a sustentabilidade não é uma questão ideológica, mas um imperativo da boa governança. Os riscos climáticos impactam diretamente as finanças, comprometendo cadeias de suprimento, desvalorizando ativos e aumentando sanções regulatórias. Organizações que negligenciam esses aspectos falham na defesa dos interesses de longo prazo de seus investidores.

No Brasil, os desafios nesse campo tão significativo também são demonstrados em outra pesquisa do IBGC, intitulada "Board Scorecard: a atuação dos conselhos frente aos impactos climáticos e à estratégia net zero". O levantamento indica que apenas 55,1% dos conselheiros acreditam que seus pares entendem as implicações das mudanças climáticas. Poucas empresas incorporam metas climáticas à remuneração de executivos ou à avaliação de riscos. Mais preocupante é que 50,5% das organizações não estabeleceram metas de emissão net zero e 53,3% não consideram a questão climática em decisões de investimento.

Precisamos reagir. O ano de 2024 foi o mais quente da história com temperatura acima do limite de 1,5º C, meta estabelecida pelo Acordo de Paris, quando em 2015, mais de 190 países se reuniram e firmaram este acordo para limitar o aquecimento global. Passado dez anos, os desafios seguem firmes, mas as empresas têm oportunidades concretas de avançar na agenda climática, incorporando metas de sustentabilidade – como transição energética, redução do consumo de água, prática de reciclagem e economia circular e tratamento adequado de resíduos sólidos e efluentes – aos modelos de gestão. Trata-se de um compromisso ético e, sobretudo, um diferencial estratégico. Consumidores estão cada vez mais atentos à responsabilidade socioambiental das marcas que escolhem e muitos dos investidores seguem privilegiando corporações que demonstram resiliência frente às práticas inerentes à sustentabilidade ambiental e social. A transição para uma economia de baixo carbono é irreversível. Resistir a essa tendência significa correr o risco de obsolescência.

Assim, é necessário um compromisso firme das empresas para liderar um irreversível processo de transformação. Tal responsabilidade implica estabelecer metas claras de redução de emissões, adotar fontes de energia renováveis, incorporar critérios ambientais nas decisões de investimento e garantir que toda a cadeia produtiva esteja alinhada às melhores práticas sustentáveis. As organizações que assumirem esse protagonismo contribuirão para conter a crise climática, darão uma resposta assertiva ao poder público e garantirão sua relevância e perenidade em um planeta que pede socorro para viabilizar a vida.


Sandra Morales
é gerente de Impacto Socioambiental do IBGC.
comunicacao@ibgc.org.br


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