UMA JORNADA DE PROPÓSITO: TRAJETÓRIA, GESTÃO E VISÃO DE FUTURO
É uma honra encerrarmos o ano, nesta edição nº. 297 da Revista RI (Dez.2025), com a extraordinária entrevista com Jorge Gerdau, primeiro brasileiro, laureado em 2024, no Global Business Hall of Fame, da Junior Achievement Worldwide, nesta coluna Orquestra Societária. Tivemos a oportunidade de, em menos de duas horas “on-line”, percorrer sua brilhante jornada de propósito pessoal e profissional, suas realizações e seus insights recentes do 26º Congresso do IBGC, em São Paulo, onde tivemos a oportunidade de estar pessoalmente com ele. Agradecemos imensamente à Carlos Johannpeter e Eliane Guterres por terem viabilizado este encontro virtual em tempo recorde!
Jorge Gerdau Johannpeter, bisneto do fundador do Grupo Gerdau, membro do grupo de controle e um de seus acionistas controladores, exerceu os cargos de CEO e Presidente do Conselho do Grupo. Fundador do Programa Gaúcho da Qualidade e Produtividade e membro das Academias Internacional e Brasileira da Qualidade, tem forte atuação na busca pela eficiência e qualidade da gestão nos setores públicos e privados do Brasil.
Nas áreas de cultura, sociedade e educação, Jorge Gerdau preside o Conselho da Fundação Iberê Camargo, é Conselheiro da Fundação Bienal do Mercosul, participou do Conselho Consultivo da Junior Achievement Brasil. Integra os Conselhos da Parceiros Voluntários e dos Fundadores do movimento Todos pela Educação, que presidiu durante 10 anos. No esporte, foi campeão brasileiro de hipismo em 1973, entre outras medalhas. Autor do livro A Busca: Os aprendizados de uma jornada de inquietações e realizações, lançado em dezembro de 2024.
Extremamente cortês, Jorge Gerdau é um ser humano encantador, assim como seus pensamentos e as vinte e três palavras, que traduzem sua trajetória pessoal e profissional, suas realizações e, claro, sua disposição em continuar transformando o melhor país do mundo para se viver, o Brasil, em referência mundial! Para saber mais, leia a entrevista a seguir, e assista a íntegra em vídeo pelo link no final da matéria.
Nossa entrevista foi planejada em quatro blocos, que são: Trajetória Pessoal, Empresarial & Literária; Gestão, Competitividade, Qualidade & Inovação; Cultura, Contexto Político-Econômico & Visão de Futuro; e Insights do 26º Congresso do IBGC. Vamos, então, à visionária entrevista!
Trajetória Pessoal, Empresarial & Literária
RI: Para iniciar, quais foram os momentos mais desafiadores de sua trajetória pessoal e empresarial, até se tornar um dos principais líderes do Brasil e referência global? É possível traçar a linha do tempo destas duas dimensões – pessoal e empresarial?
Jorge Gerdau: Em primeiro lugar, eu agradeço a oportunidade de fazermos esta entrevista e de conversamos um pouco sobre o que eu acho importante relatar sobre minha trajetória pessoal e profissional. Fica difícil traçar a linha do tempo nestas duas dimensões, pois elas se confundem ao longo da minha vida. O desafio principal é a maior participação do empresariado na definição das estratégias políticas. O País se prejudica por não ter uma participação mais ativa, mais presente de seu empresariado. Falando um pouco sobre a minha vida empresarial, eu diria que um dos fatos mais importantes, que caracterizaram minha atividade, foi, em primeiro lugar, a conquista da Açominas, em Ouro Branco, Minas Gerais. Esta usina produz 4,5 milhões de toneladas de produtos planos e longos, com mais de 6.000 pessoas trabalhando. Em termos de conquista empresarial, talvez este tenha sido o fato mais importante na nossa carreira de vida empresarial da Gerdau. E o segundo, interessante, com uma visão mais política e social, é a minha liderança e trabalho no MBC – Movimento Brasil Competitivo, em que, com o Professor Vicente Falconi, e com minha equipe de engenheiros, aprofundamos nos conceitos de Total Quality Management – TQM. Depois partimos, fortemente, para projetos empresariais e apoio do MBC. Atualmente, concentramos nossos esforços do MBC na melhoria da gestão pública (link no final do artigo). Resumidamente, considero esses dois desafios enormes, que têm maior impacto na minha vida e estão diretamente relacionados à família, à vida empresarial, ao mercado de capitais, à visão política e social. O primeiro foi a conquista da Açominas, maior investimento da Gerdau, em Minas Gerais, que representa 70% de nossa produção. O segundo, minha atuação no MBC, projeto social extremamente importante, que tem uma dimensão mais ampla, de melhoria da gestão, no qual estamos trabalhando há mais de 20 anos e, atualmente, em um projeto grande no governo de Minas Gerais, para melhorar a tecnologia de gestão do setor público.
RI: Para além dos resultados financeiros da Gerdau, qual legado o senhor mais se orgulha de ter construído? E por quê?
Jorge Gerdau: O principal legado vem dos valores da família, da herança do meu pai, que formou a estratégia dos quatro irmãos e dos principais executivos da Gerdau. Ele se originou de um conceito muito interessante de Harvard: “Business is people”. Na realidade, o sucesso das empresas e de qualquer atividade passa sempre pelo sucesso e a qualidade das equipes humanas. Eu diria que o maior fator que explica a nossa vida, nossa eficiência, a busca de produtividade, está na qualificação do investimento, dedicação e motivação dos recursos humanos. É essa mobilização e o conceito do objetivo empresarial que gera o sucesso ou não-sucesso! E o sucesso vem da condução da equipe humana que, para mim, é chave e explica qualquer tipo de êxito empresarial! É por meio da equipe que se realizam os resultados. Por trás de qualquer sucesso que exista nos setores público ou privado há a capacidade de mobilização da equipe. Isso é uma evidência absoluta! As pessoas da Gerdau, quando nos encontramos, toda vez, falam com emocionalidade, porque se realizaram profissionalmente.
RI: Com toda sabedoria adquirida, comemorando neste mês 89 anos, o que o senhor faria de forma diferente, se pudesse voltar no tempo, em sua jornada empresarial?
Jorge Gerdau: Em termos gerais e de realização pessoal e profissional, considerando as técnicas em gestão, eu estou razoavelmente satisfeito, apenas com angústias de colaborar mais! Eu trabalho muito para não ter tempo de envelhecer! Se eu tivesse que rediscutir algum tema, seria tentar aumentar ainda mais minha participação no processo político global. Não necessariamente entrar no processo político e, sim, colaborar com sua estruturação, com melhor representatividade dos setores econômicos. Uma de minhas maiores deficiências é a inquietação (nós, entrevistadoras, discordamos que seja deficiência. É uma virtude!). Neste ponto, a participação do empresariado no processo político brasileiro é uma das grandes falhas estruturais de nosso País, que vem de uma legislação histórica. A formação da representação empresarial está baseada em uma estrutura de ditadura, copiada de Mussolini e de Hitler, e implantada em 1939 por Getúlio Vargas. Nestas estruturas representativas no Brasil, as pequenas empresas têm o mesmo peso das grandes. Consequentemente, não há atitude e inteligência de líderes empresariais neste regime de votação, que não considera a proporcionalidade do peso econômico e que, consequentemente, se desdobra no tamanho de suas responsabilidades. Esta deficiência estrutural do Brasil se reflete nas representações empresariais, por decisões dos líderes, de forma diferente. No processo de condução política o peso da proporcionalidade, da importância dos setores e economia, é fundamental. As decisões, seja em nível individual, empresarial, comunitário, têm que ser analisadas em sua dimensão de impacto econômico e social. Como a estrutura burocrática não obedece a esse modelo? Existe, de certo modo, uma deficiência na estrutura de representação empresarial, que não existe somente do Brasil, e que requer uma estruturação.
RI: Em seu livro “A Busca: Os aprendizados de uma jornada de inquietações e realizações”, lançado em dezembro de 2024, o senhor compartilhou uma frase que nos impactou profundamente: “A palavra amor abraça tudo”. A palavra amor também foi destacada no 26º Congresso do IBGC. Gostaríamos de saber: quais são os exemplos de amor genuíno que o senhor vivenciou no mundo dos negócios e como eles influenciaram sua trajetória empresarial?
Jorge Gerdau: Entender a essência do amor foi um processo natural, de análise comportamental das pessoas. É lógico que depois me aprofundei em literatura, estudos, debates profissionais, e isso se acentuou. No livro (referência no final do artigo), inicio a lista das 23 palavras com respeito e concluo com amor. Eu coloco a palavra amor, ao final desta lista, como fechamento desse pacote todo. Para mim é muito claro, se você praticar alguma atividade sem amor, vai trabalhar sem a sensibilidade. Para maximização de resultados e busca de eficiência, tem que ter paixão pelo que se faz. Se hoje você trabalhar em algo que não lhe dá paixão, eu digo: “Larga e inventa algo. Vai buscar o caminho onde você poderá ter paixão pelo que faz!” A paixão também se cria pela maturação dos objetivos. Na realidade, eu estou convicto, de verdade, que em qualquer campo de atividade, se desenvolvemos o objetivo de maximizar a eficiência, a emocionalidade tem que entrar. Sem ela, não se potencializa a capacidade, consequentemente, a emoção, o envolvimento global – no fim, o amor abraça isso tudo! Eu sempre digo assim: “Tem que ter amor”! E o interessante, quando isso realmente desperta, surgem os momentos de felicidade, porque surge a conquista! Para atingir seu objetivo de realização, tem que ter paixão, sem ela, não vai! Propósito é a palavra-chave. Se conseguir definir o propósito, fica fácil de fazer!
Gestão, Competitividade, Qualidade & Inovação
RI: O senhor é um defensor ativo da melhoria da gestão, como Presidente do Conselho Superior do MBC, além de comprometido com a Gestão da Qualidade Total, desde seus primórdios. Na sua opinião, o que faz a Gerdau ser diferenciada em competividade, qualidade e inovação?
Jorge Gerdau: Trata-se de um longo processo histórico de crescimento e de desenvolvimento da Gerdau. Iniciamos com a fábrica de pregos, que vendia para o Brasil todo. Nesta estrutura, meus bisavô e avô fundaram a Gerdau, que hoje tem, praticamente, 124 anos de existência. Estamos na gestão da quinta geração e, no fundo, são os conceitos filosóficos de qualidade que nos impulsionaram. Estamos entrando já na sexta geração da família. Importantíssimo citar que o Professor Falconi, nos anos 80, bebeu da fonte de William Edwards Deming. Com base na estrutura japonesa, ele fez a concepção de gestão de processo para o equipamento de guerra, ajustando as fábricas de automóveis nos Estados Unidos. Ele é o grande inventor de domínio do processo que, após a guerra, foi transferido para o Japão, para transmitir essa cultura, e os japoneses, até pela sua formação global, foram os que melhor souberam aproveitar esse conceito. Voltando ao Professor Falconi, nos anos 80, ele começou a fazer contato com o Japão. Nós enviamos na primeira viagem dele ao Japão nossos engenheiros. Constatou-se, então, que a qualidade se atinge com o domínio do processo. Você tem que desenhar todas as etapas do processo, desdobrá-los e, com isso, consegue atingir a qualidade total. Passamos a dirigir nossas empresas, cada vez mais, com essa filosofia de tecnologia de gestão da qualidade total. A gestão, historicamente, vinha do setor industrial, mas hoje em dia, está em todas as áreas, inclusive nas novas tecnologias. O domínio e a tecnologia de processos, com a inteligência artificial, são importantíssimos. Tudo passa por domínio e gestão dos processos. Isso é reconhecido. Você começa a dar importância à proporcionalidade de cada um dos processos. O importante é não desviar demais com os processos complementares e se concentrar no foco da empresa – produto, processos produtivos. Os demais são apoio, e a eficiência total tem que estar no processo da atividade-fim da empresa!
RI: De que forma a qualidade, a competitividade e a inovação podem contribuir para o desenvolvimento sustentável do Brasil?
Jorge Gerdau: A primeira definição que deve ser estabelecida é a do debate político em torno do propósito do Brasil!Em seguida, trabalhar para a geração de riquezas e atingir uma renda per capita de, no mínimo, em torno de US$ 20 a US$ 25 mil, no nível de Portugal, alinhado ao processo de educação para todo mundo, em níveis que permitam uma participação no crescimento social e econômico. O processo de educação, no meu entender, é o mais importante e complexo, que tem que ser estudado com metodologias modernas de gestão, estímulos, reconhecimentos, valorização do professor, e assim por diante. Por meio do processo de melhoria da educação temos condições de construir o propósito que queremos atingir na visão social global. O sucesso ou insucesso de um país, praticamente, passa pelo nível de educação de sua população. O maior problema que temos no Brasil, razão de estarmos estagnados, é a evolução da qualidade de educação, pelo menos na base primária. Nós continuamos com o índice de analfabetismo básico de 29%, que é inaceitável!
RI: Quais são os impactos da transformação digital e das novas tecnologias na competitividade, qualidade e inovação da indústria do aço, bem como no “custo Brasil”, de forma mais ampla?
Jorge Gerdau: Esse tema é extremamente complexo porque trata-se de um processo de natureza política. Na discussão estrutural global do país, ter clareza de propósito nas dimensões econômicas e, principalmente, sociais é fundamental. E o debate, no meu entender, não é feito com profundidade, porque se debate pouco o propósito, e junto com ele, tem que ser discutido qual será a tecnologia de gestão a ser utilizada. Para se atingir os resultados de forma mais ampla, tem que ter propósito, metodologia de evolução, que exige uma tecnologia de gestão e de processos. A Índia tem hoje um índice de poupança e de investimento entre 26 e 28% de recursos públicos. No Brasil temos um índice de investimento ao redor de 1% a 1,5%. Consequentemente, focamos a decisão em números e, cada vez, se buscam recursos e mais recursos. No fundo, estamos estagnados sobre o crescimento econômico, que é sempre mais ou menos igual ao crescimento da população e, consequentemente, não temos crescimento de renda per capita. E, para melhorar, precisamos ter uma filosofia de tecnologia de gestão global muito bem discutida e analisada, que o nosso atual modelo político e discussão não estabelece como uma prioridade. Tem também uma certa omissão, no meu entendimento, ou não participação do empresariado. Na vida pessoal, empresarial, tem que ter o domínio total desse tema, porque ou você segue esses conceitos de investimento e crescimento, ou desaparece. No setor Público, praticamente, não temos essa visão, e esse é, então, um grande desafio. Temos o impasse da participação empresarial ser muito pequena na definição dos processos políticos do Brasil. Sair do processo de votação atual para eleição distrital poderá trazer melhoria. Se olharmos esses últimos anos, não temos conseguido sair do patamar de renda per capita de US$ 10 mil em média, ficando entre US$ 9 mil e US$11 mil, e estamos vivendo um período bastante crítico, pelo cenário internacional.
É preciso criar uma consciência clara de que os processos têm que funcionar – educação, poupança e investimento, que são fundamentais às mudanças conceituais e gerenciais para que, imediatamente, o cenário se modifique. Mas no Brasil, não temos essa consciência. Nós estamos praticamente estagnados!
RI: A Gerdau superou um século de existência, sendo líder em seu setor. Qual foi a fórmula, o segredo?
Jorge Gerdau: Reforço a primeira frase que eu falei, em referência a Harvard: “Business is people”! O tema mais importante para a longevidade empresarial é a capacitação de sua equipe nos patamares de conhecimento e profissionalização requeridos de qualidade total. Historicamente, trabalhamos na Gerdau com benchmarks do mundo. Olhamos quais são os melhores – empresas ou países. Como é que eles chegaram até ali? Como eles praticam o benchmark? O benchmark é importante pessoalmente, é importante empresarialmente ou familiarmente; é importante para o governo federal, do estado, municípios, para tudo. Então, isso vale em termos pessoais, empresariais e vale para o País. Com propósitos definidos, para atingir os patamares de qualidade requeridos, é preciso olhar o que o mundo faz melhor, copiar os melhores, acompanhar o padrão mundial. E o Brasil? Temos dezenas de empresas, mesmo agora! Um exemplo fantástico é a nossa agricultura, a conquista de seu nível de produtividade, que nos últimos 20 a 30 anos vem ampliando a capacidade do nosso agricultor nos estados do Sul, Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul – e outros. Ampliaram a capacidade produtiva agrícola com tecnologia desenvolvida pela Embrapa – com crescimento do setor, ultrapassando para regiões que antes não produziam. Esse é um exemplo, no meu entender, espetacular, para não termos dúvida da capacidade de nosso País, com o patamar atingido por este setor produtivo. Hoje somos macroexportadores de alimentos. Tudo feito com tecnologia local, brasileira, com a competência do nosso pessoal, do nosso produtor, do nosso trabalhador, do nosso gestor. Existem mais exemplos de eficiência – de empresas, inclusive as multinacionais brasileiras, que se potencializaram mundialmente a partir do Brasil. Então, na realidade, esse tema tem que ser levado à discussão política: como atingir essa mesma eficiência no setor público? O exemplo da agricultura brasileira, que nós conquistamos com nossa gente, nossa tecnologia, de atingirmos esse desenvolvimento nos últimos 20 a 30 anos, é muito importante. E exemplos, como acabei de dizer, de empresas nacionais, que têm posições internacionais, que atuam no Brasil com padrão de qualidade internacional. A fórmula está estabelecida, agora é necessário implementá-la e definir as diretrizes políticas para torná-la realidade.
Cultura, Contexto Político-Econômico & Visão de Futuro
RI: Qual é o papel da cultura organizacional e dos valores inegociáveis na consolidação da Gerdau como uma potência global?
Jorge Gerdau: Nossos valores estão estabelecidos por princípios culturais, que são palavras usadas, no cenário internacional, que definem a nossa filosofia comportamental, desde 1986: 1) Oferecer produtos e serviços de alta qualidade; 2) Lucro como medida de desempenho e eficácia e de preservação da livre iniciativa; 3) Seriedade com todos os públicos; 4) Eficiência nos negócios está nas pessoas; 5) Tecnologia atualizada objetivando alta qualidade e produtividade e baixo custo; e 6) Crescer com segurança e solidez. (Fonte: página 38 do Livro “A Busca”). Vai além da valorização da busca pelo resultado, pois a visão ética é extremamente forte. Pontos importantes para se trabalhar com valores éticos são: condições de trabalho, delegação, responsabilidade, dentre outros. São as 6 frases citadas acima que definem nossa filosofia comportamental, que não adianta serem penduradas em um quadro na parede: O importante é praticá-las! Além disso, é preciso praticar valores de poupança, investimento, de respeito ao cliente e ao colaborador, capacitação, e assim por diante – são peças-chave. Quanto à valorização de nossos profissionais, isso foi um dos pontos importantes que nós, muito cedo, fomos buscar benchmarks no cenário Internacional: as tecnologias de gestão de recursos humanos. Como promover? Como preparar? Como capacitar? Historicamente, a área de pessoal cuidava da folha de pagamento, sendo que o mais importante é a seleção, a educação, o treinamento, a remuneração variável, as carreiras – são frentes principais das áreas de gestão, responsáveis por valorização, investimento, crescimento das pessoas, e que definem a felicidade das pessoas!
RI: Qual é a sua visão sobre o atual cenário econômico global e como as tensões geopolíticas (como as tarifas dos EUA e as guerras) têm afetado os negócios da Gerdau e a indústria nacional?
Jorge Gerdau: Eu diria que o maior problema do Brasil hoje é de natureza política. E para nós, no meu entender, os fatores de eficiência competitiva da atividade industrial no Brasil. É tremendamente prejudicada a produtividade brasileira por vários fatores globais, que inviabilizam a plena eficiência do País. Iniciemos pela legislação trabalhista, com alto custo de um operário que, ao final, recebe apenas de 35% a 40% do total de seu próprio custo. Em outros países e regiões, como Estados Unidos e Europa, os operários chegam a receber em torno de 70% de seu custo. Falemos sobre o sistema tributário. Em todos os países em que nós trabalhamos, praticamente nosso custo tributário vai para o cliente final reduzido. Hoje, o custo tributário no aço está próximo de 15%. Considerando os impostos sobre energia, folha de pagamento, lucros, a soma desses custos no mundo, com tecnologias modernas, é zero. Faço a seguinte pergunta: Quantos profissionais contábeis e fiscais são necessários nos Estados Unidos para atenderem à nossa produção de aço, que representa cerca de 70% do total do Brasil? E aqui, quantos são necessários para fazerem a gestão dos livros fiscais? Temos 66 estruturas de livros fiscais, cada uma delas com suas complexidades regionais de débitos e créditos. Tem que ser milagroso para fazer negócio e ser produtivo no Brasil! Quanto é o IVA – Imposto sobre valor agregado nos Estados Unidos? E no Brasil? Considerando os países mais caros, eles têm uma carga tributária em torno de 15%, no Brasil, de 26 a 27%, está bem difícil, aqui é um emaranhado. A visão internacional de plena competitividade é ampla, abrange qualquer tipo de atividade, o melhor modelo do mundo para se copiar e fazer igual. Isso vale para o pequeno negócio também que, no começo, tem que ser o melhor da quadra, e depois o melhor da cidade, o melhor do estado, o melhor nacional, para tentar ser o melhor Internacional. Esta escalada tem que ser construída em qualquer atividade.
RI: Então, temos no Brasil as nossas próprias guerras?
Jorge Gerdau: A maior guerra é a nossa guerra! Como vamos construir no Brasil o modelo de competitividade internacional? O exemplo da agricultura brasileira é referência para isso, com nossos agricultores do Sul, pelas conquistas alcançadas por Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná, e parte de São Paulo, como mencionei, com tecnologia desenvolvida no Brasil; são milhares de pessoas envolvidas, portanto, nós temos competência para construir esse modelo de competitividade internacional! E esse exemplo nos impulsiona a mobilizar a transformação. E a mobilização é política, que é o nosso maior dilema! Como a participação do empresariado é pequena no processo político, a pergunta é: Como vamos conseguir participar de forma efetiva do processo político? Consideramos que, reconhecidamente, estamos de 20 a 30 anos atrasados em relação à competitividade construída em outros países! É fundamental, realmente, que tenhamos um desenvolvimento social de proporções necessárias para alcançar os patamares de competitividade internacional, pois, como está, é uma vergonha! Esse tema é complexo, porque a construção não é só material e educativa, trata-se de um rompimento do modelo do processo político. E isso tem que ser desenhado e absorvido pelo Congresso, absorvido pela estrutura tributária, com propósitos definidos.
RI: Quais são os principais desafios e oportunidades para o Brasil na próxima década, especialmente em temas como sustentabilidade e responsabilidade corporativa (ESG)?
Jorge Gerdau: Entendo que durante nossa entrevista, já respondi, de certa forma, essa pergunta. Em síntese, na minha opinião, o voto distrital é peça-chave. E outra, transformar a estrutura empresarial, com a definição clara de quais são os processos para atingir os níveis de produtividade internacional, assim como temos atualmente na agricultura. Importante atingirmos esse nível no processo industrial, cuja falha está, essencialmente, na estrutura tributária que, praticamente, o inviabiliza. Trata-se de um conjunto de reformas, tributária, política, educacional, trabalhista, pois o custo do operário tem que direcionar os benefícios para ele e não alimentar a estrutura burocrática, que come a maior parte desse custo, como falei anteriormente.
RI: O que o senhor considera fundamental para atrair mais investimentos e garantir a liberdade econômica necessária ao desenvolvimento do nosso País?
Jorge Gerdau: Esses pontos já mencionei e é a grande pergunta: Como podemos fazer a revolução política para que essas coisas aconteçam? Com a Reforma Tributária, não tem cabimento que o imposto novo, com o conceito básico do IVA, já nasça com 27% a 28%, quando o mundo trabalha com 20% a 21%, com países com 15%. Isso é um pecado mortal, e já nasce torto! Alcançar padrões internacionais de competitividade, com qualidade e tecnologia de gestão: esta é a meta! Tem que fazer melhor e como os melhores. É isso que define o sucesso. Por que o mercado livre faz? É isso que define a tecnologia de gestão: se eu trabalhar bem, meus operários vão ganhar mais. Se eu trabalhar bem, eu vou exportar mais. Por isso, é tão importante a utilização plena das melhores tecnologias de gestão a qualquer tempo.
Insights do 26º Congresso do IBGC
RI: O senhor brilhou no painel do 26º Congresso do IBGC (link no final do artigo), ao lado da Presidente do Conselho de Administração, Deborah Wright. Assistimos ao vivo e on-line seu sucesso! Quais foram os seus principais insights sobre o tema do evento – “Governança em um mundo disruptivo”?
Jorge Gerdau: Em muitos aspectos, estamos bem, temos muitas riquezas naturais, a característica do nosso povo, de uma forma geral – a capacidade produtiva em nível internacional de nossos operários, com investimentos em capacitação, é indiscutível!
O nosso problema, então, se restringe, exclusivamente, em melhorar a nossa governança. Se conseguirmos melhorá-la, nosso País explode em termos de desenvolvimento!
RI: Então nós estamos preparados para irmos no caminho da instrumentalização das melhores práticas de um modelo de gestão sustentável?
Jorge Gerdau: Se eu puder resumir, eu já escrevi um pouco sobre isso, o Brasil já provou que tem potencialidades ilimitadas, fantásticas, das melhores do mundo! Então, onde está a nossa falha? A nossa falha está na inteligência construtiva e em governança, que abrange: índice de poupança, investimento e educação. Se esses temas forem trabalhados, o resto vai de carona!
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Caros leitores, concluímos com a certeza de que a íntegra dessa entrevista traduz, de forma magistral, o que é fundamental para as empresas e o Brasil se tornarem uma verdadeira Orquestra Societária: Da Governança à Sinfonia de Resultados Sustentáveis (link abaixo).
Desejamos um feliz aniversário à Jorge Gerdau, que completa 89 anos neste mês de dezembro, com muita vitalidade, longevidade e inquietação construtiva! Que seus exemplos nos inspirem a fazer melhor e transbordem também às futuras gerações! Gratidão pelo aceite ao nosso convite para essa fantástica entrevista e por sua disponibilidade para falar de temas fundamentais à sustentabilidade do Brasil.
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Nota: Links de referência citados na entrevista:
Cida Hess
é Assessora da Presidência da Prodesp em Negócios Estratégicos. Head do Comitê de Inovação e Tecnologia do 30% Club Brazil. Conselheira certificada pela Board Academy, palestrante, professora e mentora. Doutora em Sustentabilidade (UNIP/SP), Mestre em Ciências Contábeis (PUCSP), economista e contadora, com MBA em Finanças (IBMEC). Atua há mais de 30 anos em multinacionais europeias e grandes empresas nacionais, liderando projetos de transformação dos negócios, com estratégias de inovação e sustentabilidade. Coautora de diversos livros. Colunista (desde 2014) e Conselheira Editorial (desde 2023) da Revista RI.
cidahessparanhos@gmail.com
Mônica Brandão
é Assessora da André Mansur Advogados Associados (BH/MG). Tem atuado como conselheira administrativa, fiscal e consultiva em várias organizações, gerente de planejamento corporativo e engenheira de distribuição de energia (Grupo Cemig/MG), bem como professora. Certificada como CNPI-P pela Apimec. Editora do site espacogovernanca.com.br para universitários e demais interessados. Mestre em Administração pela PUC Minas e graduada em Engenharia Elétrica e Direito pela mesma Instituição, com cursos no Brasil e no exterior. Coautora de diversos livros. Colunista (desde 2008) e Conselheira Editorial (desde 2023) da Revista RI.
mbran2015@gmail.com