Comunicação

COMUNICAÇÃO FINANCEIRA NA ATUALIDADE: DESIGN, CULTURA DE DADOS & IA COMO DIFERENCIAIS COMPETITIVOS EM RELAÇÕES COM INVESTIDORES

Já percebeu como a forma de se comunicar mudou radicalmente?
Essas transformações impactam diretamente na maneira de comunicar e acessar os dados. Por mais que se saiba que a comunicação financeira desempenha um papel essencial na relação entre empresas e investidores, especialmente em um mercado de capitais diligente e competitivo, não basta apenas transmitir informações, é preciso envolver, engajar e tornar o conteúdo acessível. Desde a escolha das palavras até o apelo gráfico e editorial, tudo influencia na conexão entre a mensagem corporativa e os stakeholders.

Para ampliar o engajamento e fortalecer a confiança com investidores, os documentos administrativos, prospectos de ofertas públicas e relatórios financeiros integrados, não deveriam apenas ter um conteúdo textual transparente e compreensível, mas também serem visualmente atrativos, digitalmente interativos e, cada vez mais, inteligentes. Em um cenário em que redes sociais, plataformas digitais e inteligência artificial moldam a forma como consumimos informação, relatórios excessivamente formais e estáticos já não prendem a atenção. A aposta está no design editorial estratégico, na diversidade de mídias digitais e em uma linguagem acessível para garantir clareza e impacto.

Se antes os relatórios financeiros eram documentos longos, com jargões técnicos e densos, hoje eles precisam ser envolventes e digitais. Investidores e gestores lidam com uma enxurrada de dados diariamente e, para se destacar, é preciso ir além do básico. Estudos recentes da McKinsey & Company (2024) mostram que relatórios com estrutura visual e recursos interativos geram até 60% mais engajamento do que os modelos tradicionais.

Nesse contexto, conceitos como Visual Law e Legal Design, originalmente aplicados ao setor jurídico, tornaram-se práticas comuns em RI. Elementos visuais, organização intuitiva e uma linguagem amigável fazem toda a diferença na hora de apresentar dados complexos, pois reduzem barreiras de entendimento e ampliam a atratividade dos documentos administrativos e financeiros. Como destaca José Luiz de Moura Faleiros Júnior, em Legal Design - Teoria e Prática (2023), o design centrado no usuário é essencial para tornar processos mais eficientes e claros, assim como elementos visuais e a organização da informação são de grande importância para melhorar a experiência quando aplicados diretamente às comunicações financeiras.

No caso de ofertas públicas, por exemplo, a aplicação desses conceitos reduz barreiras de entendimento e atrai investidores institucionais e individuais com diferentes níveis de experiência. Infográficos, mapas de dados conectivos, destaques aos títulos e intertítulos, além do uso de “olhos”* e “ilhas”* editoriais, tornam os elementos-chave mais acessíveis, aumentando a visibilidade informativa e a confiança no emissor.

(*) “Olhos” e “ilhas” são elementos visuais usados na editoração para organizar e destacar o conteúdo. Olhos são pequenos títulos ou destaques dentro do texto, ajudando a chamar a atenção para pontos importantes. Já ilhas são blocos de conteúdo, como citações ou listas, que se destacam visualmente da página, trazendo informações complementares ao tema principal. Ambos elementos editoriais ajudam a tornar a leitura mais dinâmica e atraente.

Casos recentes comprovam a eficácia dessa abordagem. A emissão de debêntures da Águas do Rio pela concessionária da Aegea, em 2023, estruturada em uma oferta de R$ 5,5 bilhões, destacou-se não apenas pelo porte, mas pelo apelo visual e narrativo de seus documentos, que integraram dados de governança, impacto social e responsabilidade ambiental, se tornando a maior operação do setor de infraestrutura já realizada no Brasil.

Qual o segredo? Um dos diferenciais dessa operação esteve na integração entre dados de governança, impacto social e responsabilidade ambiental, consolidada pela obtenção do selo de debênture sustentável, um critério cada vez mais relevante para investidores focados em ESG (Environmental, Social and Governance). O projeto envolveu instituições financeiras e escritórios de advocacia renomados, como Mattos Filho e Stocche Forbes Advogados, Itaú BBA, Bradesco BBI, BTG Pactual, Banco ABC Brasil, JP Morgan e XP Investimentos. Além disso, para garantir a estrutura visual reforçasse a clareza e a transparência do conteúdo, a SUMAQ Comunicação Financeira atuou como Printer na elaboração dos documentos regulatórios. Esse caso demonstrou como um layout editorial bem planejado pode tornar a comunicação financeira mais fluida e eficaz, gerando resultados concretos através do impacto desses documentos e das demais ações de divulgação.

Outras operações recentes que seguiram essa abordagem incluem a Rio+ Saneamento BL 3 S.A. (2024) e a Giga Mais Fibra Telecomunicações S.A. (2024). Em ambas, o uso estratégico do planejamento gráfico editorial contribuiu para a captação bem‑sucedida de recursos. Elas consolidaram essa prática, mostrando que diagramas, dashboards e storytelling visual se tornaram ferramentas indispensáveis para atrair investidores institucionais e de varejo.

Transformação Digital, ESG e Inteligência Artificial: o novo eixo de RI
A transformação digital segue remodelando o mercado de capitais. Indo direto ao ponto: Ainda existem Relatórios em PDF? Sim, ainda existem e continuam sendo protocolados, mas até mesmo os relatórios em PDFs vêm alterando sua apresentação e estrutura. A digitalização de relatórios está em uma nova fase. No contexto atual, os PDFs incorporam links dinâmicos, botões de navegação e elementos multimídia, ampliando a interatividade. Hoje, já se discutem documentos regulatórios com recursos audiovisuais integrados, como vídeos explicativos e animações gráficas, para garantir acessibilidade e clareza.

Estamos na era pós-digital, conforme destaca Walter Longo em "Marketing e Comunicação na Era Pós‑Digital", onde a tecnologia se tornou uma parte da vida cotidiana. As pessoas não a percebem mais como algo distinto, mas como uma extensão natural das interações humanas. Essa integração entre identidade visual e conteúdo, alinhada a tecnologias que simplificam o acesso à informação, se torna crucial para o sucesso dos direcionamentos do agente de RI e das Companhias. Um exemplo claro dessa evolução está na SEC (Securities and Exchange Commission, EUA), que modernizou seus requisitos de reporte financeiro ao adotar o iXBRL (Inline XBRL). Esse formato combina a padronização técnica do XBRL, usado para leitura automatizada por softwares, com a acessibilidade do HTML, permitindo que investidores visualizem relatórios em navegadores com layout amigável enquanto máquinas extraem e analisam os mesmos dados. O resultado é uma comunicação financeira mais transparente, comparável e responsiva, inclusive em dispositivos móveis, acompanhando a realidade de um público cada vez mais conectado aos celulares.

No Brasil, a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) já acompanha essas tendências internacionais por meio do CRIA (Centro de Regulação e Inovação Aplicada) e de sua Agenda Regulatória, que exploram iniciativas de digitalização no regime informacional. Esse movimento abre espaço para futuras padronizações digitais, similares ao iXBRL, o que ampliaria a transparência, a eficiência regulatória e a competitividade internacional do mercado de capitais brasileiro.

Mais do que acompanhar uma tendência global, a adoção do iXBRL no Brasil seria um divisor de águas porque tornaria a comunicação financeira mais eficiente, transparente e acessível. As vantagens seriam percebidas em diversos componentes do mercado. Para reguladores e analistas, permitiria comparar dados de diferentes empresas de forma instantânea, facilitando auditorias e análises de risco. Para as companhias, reduziria custos de compliance ao eliminar a necessidade de produzir o mesmo relatório em múltiplos formatos, consolidando tudo em um único documento digital, legível tanto por pessoas quanto por máquinas. E para investidores, institucionais ou de varejo, apresentaria relatórios mais amigáveis e interativos, cuja sua própria estrutura facilitaria auditorias e análises comparativas entre empresas, além de democratizar o acesso à informação, colocando o investidor brasileiro no mesmo patamar de experiência já oferecido em mercados como EUA e Europa.

Enquanto a digitalização e o iXBRL elevam a padronização e a comparabilidade dos relatórios, a inteligência artificial generativa adiciona um novo patamar de personalização e análise preditiva. Ferramentas de RI já utilizam IA para gerar resumos executivos automáticos, adaptar relatórios ao perfil de cada investidor e identificar riscos em tempo real a partir da análise de grandes volumes de dados regulatórios. Estudo da EY (2025) aponta que 70% das companhias listadas nos EUA já testam IA generativa em seus processos de reporte e comunicação financeira.

Outro eixo complementar e indispensável nesse cenário para 2025/2026 é o ESG sob novos padrões regulatórios.

A primeira referência importante são as normas IFRS S1 e S2, publicadas pela International Financial Reporting Standards Foundation (IFRS) e implementadas pelo ISSB (International Sustainability Standards Board). A IFRS S1 define os requisitos gerais para a divulgação de informações de sustentabilidade relevantes para investidores. Já a IFRS S2 trata especificamente da divulgação de riscos e oportunidades relacionados ao clima. Esses padrões entraram em vigor internacionalmente em janeiro de 2024 e, no Brasil, a CVM anunciou que passarão a ser obrigatórios a partir de 2026 para companhias abertas, em linha com a estratégia de convergência regulatória. A CSRD (Corporate Sustainability Reporting Directive), em vigor na União Europeia desde 2024, ampliou as exigências de reporte de sustentabilidade, obrigando milhares de empresas, incluindo subsidiárias de multinacionais brasileiras com operações no bloco europeu, a apresentar informações detalhadas, auditáveis e comparáveis sobre suas práticas ambientais, sociais e de governança. Sendo importante citar, o ISSB (International Sustainability Standards Board) que atua como o órgão internacional responsável por desenvolver e harmonizar os padrões globais de reporte em sustentabilidade, justamente para reduzir divergências entre jurisdições e facilitar a comparabilidade entre empresas de diferentes países.

Esses marcos regulatórios reforçam a exigência dos mercados e stakeholders por dados auditáveis, comparáveis e digitalmente acessíveis, o que ressalta a relevância de tecnologias, como o formato iXBRL e inteligência artificial para assegurar a consistência de dados e fortalecer a credibilidade das companhias diante de investidores globais. Nesse contexto, o eixo das Relações com Investidores, sustentado pela Transformação Digital, pelo ESG e pela Inteligência Artificial, deixa de ser apenas uma tendência passageira ou um modismo e se consolida como base estratégica da comunicação financeira contemporânea, preparando o mercado brasileiro para competir em padrões internacionais cada vez mais exigentes.

O futuro imediato
Metodologias do passado ainda coexistem com as inovações, seria imprudente não mencionar isso. Contudo, o movimento é claro: dashboards interativos, relatórios digitais mobile-first* e uso estratégico de IA não são mais tendências, mas requisitos para competir no mercado de capitais.

(*) Mobile-first é uma abordagem de design e desenvolvimento em que o conteúdo, o layout e a usabilidade de um produto digital são pensados primeiro para dispositivos móveis (celulares e tablets) e só depois adaptados para telas maiores (como notebooks ou desktops). Essa lógica surgiu porque a maioria dos usuários hoje acessa informações pelo celular; então, em vez de “encaixar” o site ou relatório do desktop no celular, inverte-se a lógica: o celular é a prioridade.

Empresas que adotarem essas práticas não apenas ampliarão sua base de investidores, mas também construirão uma reputação de transparência e inovação perante reguladores, analistas e stakeholders. Aqueles que resistirem ao avanço tecnológico correm o risco de se tornarem invisíveis em um mercado cada vez mais competitivo e orientado por dados.

A aplicação de novas abordagens tecnológicas e comunicacionais será o fator decisivo para modernizar a comunicação financeira. A combinação entre Visual Law, Legal Design, IA generativae estratégias digitais não apenas melhoram a experiência do investidor, mas também amplia a eficácia de ofertas públicas e relatórios financeiros. Adotar essas práticas é fundamental para que empresas se destaquem, fortaleçam seu relacionamento com investidores e consolidem sua reputação no mercado. Percebam que no final do dia, todos os esforços corporativos são para melhorar a comunicação e com isso o relacionamento com o investidor. a boa comunicação é o que sustenta a confiança e sem confiança não há investimento de longo prazo. Transparência, clareza e acessibilidade são os pilares que transformam relatórios em instrumentos de credibilidade, práticas de ESG em compromissos verificáveis e dados técnicos em informação útil para todos os perfis de investidores. Quando a mensagem é bem construída, ela reduz custos, amplia a base de investidores, fortalece a liquidez e aproxima o Brasil das melhores práticas globais. Por isso, lembrem-se: sem uma boa comunicação, não há investimento sustentável.

Thiago Andrade Vaz
é sócio-fundador do Grupo SUMAQ Comunicação Financeira. Bacharel em Comunicação Social, com mais de 20 anos de experiência no Mercado de Capitais.
thiago.andrade@sumaq.com.br


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